Em uma iniciativa ainda incipiente no Brasil mas comum no exterior, pilotos
de avião (e um comissário de bordo) vão treinar profissionais de saúde para
ajudá-los a diminuir a possibilidade de erro humano em UTIs (Unidades de Terapia
Intensiva).
Uma sessão de treinamento desse tipo acontece em dezembro com 20 médicos,
enfermeiros, fisioterapeutas e outros profissionais no Hospital Brasil, em Santo
André, da Rede D'Or São Luiz.
Coordenado pela Amib (Associação de Medicina Intensiva Brasileira) em
parceria com a Gol, o programa prevê que os intensivistas aprendam conceitos de
CRM (sigla em inglês para Gerenciamento de Recursos da Tripulação), convertido
em padrão na indústria de aviação.
Não é a única experiência: há duas semanas, profissionais do hospital Albert
Einstein foram treinados por um piloto da portuguesa TAP. A intenção é usar o
conteúdo da aula em UTIs e cirurgias.
O CRM foi concebido pela Nasa no final dos anos 1970, para evitar os erros
humanos que, constatou-se, estavam por trás da maior parte dos acidentes aéreos
na época.
Desde então, o CRM vem sendo aperfeiçoado e é reconhecido como determinante
para melhorar a segurança na aviação comercial nas últimas três décadas.
Ele ensina, por exemplo, a reconhecer as limitações humanas e a ser assertivo
ao comunicar problemas.
Outro processo hoje comum em hospitais foi inspirado na aviação: em 2009, a
Organização Mundial da Saúde recomendou a adoção de um "checklist" antes das
cirurgias, que inclui perguntar o nome do paciente e qual órgão será operado.
Tal qual na aviação, diz o intensivista Haggéas da Silveira Fernandes,
coordenador do projeto pela Amib, o ambiente da UTI pode levar profissionais de
saúde a cometer erros que, se identificados em situações de treinamento, podem
ser evitados.
Ele cita um estudo que se tornou referência ("Errar é Humano"), elaborado em
1999 pelo Instituto de Medicina dos EUA, que estimou em 98 mil por ano as mortes
nos hospitais americanos por erros médicos evitáveis.
"É uma ferramenta que trabalha a competência não técnica do profissional --e
uma bela oportunidade de melhorar a qualidade de atendimento ao paciente."
Distância de poder
O CRM atua, por exemplo, na relação entre médicos e enfermeiros. Mesmo quem
está subordinado na hierarquia tem que se sentir encorajado a apontar ações que
causem erros do seu superior.
No cockpit de um avião, essa relação é conhecida como "distância de poder"
--quanto maior ela for, pior.
"Como os profissionais de UTI --e da aviação-- lidam com processos complexos
e são especialistas, tendem a se sentir invulneráveis. O treinamento
conscientiza de que somos falíveis", diz Sérgio Quito, diretor de segurança
operacional da Gol.
Fernandes chegou até o CRM ao pesquisar a sua aplicação em unidades de saúde
no exterior --a adaptação para o ambiente hospitalar já ocorre há alguns anos
nos EUA e na Europa.
Decidiu, então, escrever para o presidente da Gol, Paulo Kakinoff --e a
empresa cedeu seu estafe de segurança operacional para realizar o treinamento.
O projeto foi apresentado ontem no Congresso Brasileiro de Medicina Intensiva da Amib, no Rio. A partir do primeiro curso em Santo André, a entidade quer replicar a iniciativa em outros hospitais.
O projeto foi apresentado ontem no Congresso Brasileiro de Medicina Intensiva da Amib, no Rio. A partir do primeiro curso em Santo André, a entidade quer replicar a iniciativa em outros hospitais.
Folhaonline
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