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quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Embaixador da OMS lamenta que Brasil ainda não tenha eliminado hanseníase e pede esforços

Brasília – O embaixador especial da Organização Mundial da Saúde (OMS) para Eliminação da Hanseníase, Yohei Sasakawa, lamentou ontem (18) o fato de o Brasil ainda não ter atingido o patamar estabelecido pelo organismo para erradicação da doença, que é menos de um caso da doença a cada 10 mil habitantes. Ao lembrar os avanços da ciência, que garantiram tratamento e cura, ele enfatizou que é preciso intensificar os esforços para atacar a doença, marcada pela discriminação e pelo estigma.
 
"O Brasil é um país capacitado para sediar a Copa do Mundo e as Olimpíadas, mas é o único que não conseguiu eliminar a doença. É uma questão muito estranha", disse o embaixador, durante solenidade, na Câmara dos Deputados, da qual também participaram integrantes da Frente Parlamentar de Erradicação da Hanseníase e Doenças Elimináveis.
 
Sasakawa destacou, por outro lado, o empenho do Brasil para garantir o pagamento de indenização a pacientes que foram segregados em razão da doença. "Neste aspecto, o Brasil é o país mais adiantado e deve servir de modelo para o mundo", acrescentou.
 
De acordo com o Ministério da Saúde, a meta é eliminar a hanseníase - menos de um caso para cada 10 mil habitantes - até 2015. "Para a eliminação da hanseníase é necessário a execução de ações programáticas, como diagnóstico, tratamento, vigilância dos contatos, prevenção de incapacidades e reabilitação física, além da educação em saúde. Atualmente, essa endemia atinge cerca de 29,3 mil pessoas em tratamento no país. A doença tem cura e o tratamento é gratuito pelo SUS", informou a pasta.
 
Conforme o ministério, país registrou cerca de 33 mil casos novos em 2012, queda de 32,6% em comparação a 2002, quando foram identificados 49 mil novos casos. "De acordo com a Organização Mundial da Saúde, Sudão do Sul e Libéria também são países que buscam eliminar a carga dessa endemia", diz, acrescentando que, neste mês, foram repassados R$ 15,6 milhões a 40 municípios para o combate da doença – essas cidades respondem por cerca de 24% dos casos novos de hanseníase. Em março, uma campanha foi lançada para diagnosticar casos suspeitos de hanseníase em escolas públicas, quando 9,3 milhões de estudantes em cerca de 750 municípios foram examinados.
 
Para o deputado Nilmário Miranda (PT-MG), coordenador da frente parlamentar, ainda que o Brasil seja referência na reparação às violações de direitos humanos, é já pague indenizações a ex-pacientes, é preciso avançar mais e estender essa reparação aos filhos que foram separados dos pais que tinham hanseníase até a década de 1980. O isolamento de pessoas com a doença, imposto oficialmente pelo governo, durou pelo menos 40 anos.
 
No fim da década de 1940, uma lei federal determinou o afastamento compulsório de recém-nascidos filhos de vítimas da doença, o que provocou a separação de milhares de famílias. Muitos dos filhos desses pacientes, nascidos nos chamados leprosários, foram abandonados à própria sorte ou levados para unidades conhecidas como preventórios.
 
"Temos que trabalhar em duas frentes: na erradicação da doença e pela reparação dos direitos humanos também dos filhos, na medida em que se retirou dessas crianças o direito do convívio familiar, tendo sido internados em condições de alta violação [de direitos]. Isso tem que ser reparado", disse.
 
A Comissão Nacional dos Filhos Separados pelo Isolamento Compulsório calcula que o número de brasileiros nessa situação possa chegar a 40 mil. Em agosto, o governo anunciou que pretende indenizar os filhos separados dos pais em decorrência da doença.
 
Após a solenidade na Câmara, representantes do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan) e filhos que viveram a separação compulsória foram recebidos pela ministra Maria do Rosário, na sede da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Ela assinou o Apelo Global contra a Hanseníase, movimento que reúne diversas entidades internacionais e manifesta o compromisso de luta contra a discriminação global das pessoas atingidas pela hanseníase.
 
O coordenador do Morhan, Arthur Custódio, que também participou do ato na secretaria, defendeu a intensificação das campanhas ligadas à doença no Brasil, para garantir que a população saiba identificar os sintomas e procure atendimento médico para identificar precocemente os sintomas. Ele lembrou que são registrados cerca de 33 mil novos casos a cada ano no Brasil, o que faz com que o país, em números absolutos, fique atrás apenas da Índia que, com uma população cinco vezes maior, tem 127 mil novos casos por ano.
 
"Além disso, a distribuição dos casos pelo território brasileiro é irregular e acompanha o mapa da pobreza, com maior incidência nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. O problema é que temos percebido que as pessoas estão tendo diagnóstico mais tardio e, em decorrência, ficando com mais sequelas. Por isso, é fundamental fazer mais campanhas que alertem a população sobre a importância de buscar atendimento médico assim que surgirem os sintomas ", disse. Estudos indicam que, se a doença for logo diagnosticada, a cura pode chegar a mais de 80% dos casos.
 
A goiana Marísia da Silva, de 47 anos, foi levada a um preventório, junto com suas três irmãs, aos 5 anos de idade, quando seu pai foi diagnosticado com a doença. Ela permaneceu no local, sem qualquer contato com outros parentes, até a adolescência. Hoje, ainda precisa de tratamento psicológico para superar o trauma.
 
"Foram anos de muito sofrimento, uma verdadeira tortura, porque a gente não entendia direito o que estava acontecendo e não podia chorar, abraçar, dar um beijo no nosso pai. Coisas simples que a maioria dos filhos faz, nos foi negado", contou Marísia, que há cerca de três anos foi diagnosticada com a doença. "Eu passei pelo tratamento, já estou na fase final, mas não preciso ficar longe das minhas filhas. Isso não tem preço", acrescentou.
 
A hanseníase é uma doença infectocontagiosa crônica que atinge, principalmente, a pele e os nervos dos braços, mãos, pernas, pés, rosto, orelhas, olhos e nariz. O tempo entre o contágio e o aparecimento dos sintomas varia de dois a cinco anos. Se for logo diagnosticada, a cura pode chegar a mais de 80% dos casos. Os sintomas mais comuns são manchas brancas, vermelhas ou marrons em qualquer parte do corpo, com alteração da sensibilidade, caroços, algumas vezes avermelhados e doloridos, perda de sensibilidade ao calor, à dor e ao tato, febre, edemas e dores nas juntas. O tratamento pode durar de seis meses a um ano e é oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Agência Brasil

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