Apesar dos esforços da Anvisa e do Ministério da Saúde para diminuir o preço dos medicamentos, especialistas dizem que a confiança virá com o tempo
Segundo pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisas e Pós-Graduação para Farmacêuticos (ICTQ), em parceria com o Datafolha, a medida de redução de custos dos medicamentos similares em até 35%, proposta pelo Governo Federal, tem pouco impacto na percepção do mercado consumidor de medicamentos. Para a população, somente 41% consideram a redução dos custos de medicamentos uma prioridade dentre outras ações catalogadas que o governo brasileiro poderia fazer para melhorar a área da saúde.
A medida citada é uma iniciativa do Ministério da Saúde que deseja que similares custem no máximo 65% do preço do medicamento de referência, um princípio que já é utilizado para os genéricos. No entanto, essa mudança não interfere apenas na política de preços. Ela amplia a penetração dos similares à medida que permite que essa classe de medicamentos passe a ter condição semelhante a de genéricos. Com isso, o farmacêutico poderá indicar o produto como substituto ao medicamento de marca para o consumidor, uma prerrogativa atualmente restrita aos genéricos.
Os similares passarão a ter uma nova embalagem. A exemplo do que ocorre com genéricos (cujas caixas estampam a letra G em destaque), os similares passarão a ser comercializados em embalagens com as letras EQ, que fazem referência à palavra Equivalente.
A política deverá ser regulada por uma resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), cujo texto foi colocado em consulta pública até o dia 16 de fevereiro e, até o fechamento desta edição (em 18 de fevereiro), não foram apuradas novas propostas ou modificações.
De acordo com a pesquisa do ICTQ, embora a média nacional seja de 41% que consideram essa redução dos custos relevante, as demais localidades têm comportamentos diferentes. Na região Sul, a expectativa com a redução de preço dos similares está acima da média nacional, demonstrando 47%; nas regiões Norte e Centro-Oeste, o índice cai para 37%. Já no Sudeste, o percentual é de 42% e, no Nordeste, de 38%.
Em todo o País, os brasileiros das classes C e D são os mais interessados na redução dos custos com medicamentos. Dos indivíduos dessas classes sociais, 78% esperam pela aprovação da medida, enquanto somente 28% dos participantes da classe A veem como necessária a redução dos custos desses itens.
“O estudo do ICTQ mostra que é elevado o hábito de compra de medicamentos genéricos entre os entrevistados (67%). Do total, 25% declarou consumir medicamento de referência, percentual que sobe na classe A para 42%. Já o consumo consciente e declarado de medicamentos similares como opção de escolha cai para 2%”, complementa o diretor de pesquisa, comunicação e marketing do ICTQ, Marcus Vinícius de Andrade.
Confiança em xeque
O estudo mostrou ainda que atualmente apenas 35% da população brasileira confia em medicamentos similares. Outros 33% confiam mais ou menos e 32% não confiam de forma alguma nesse tipo de medicamento. Andrade comenta que o Ministério da Saúde e a Anvisa colocaram o tema em consulta pública justamente com a intenção de mudar esse quadro. “A aprovação dessas novas regras fará do similar um produto bem próximo do que é o genérico, cujo índice de confiança da população atinge 70%”, ressalta Andrade. Ele acredita ainda que, caso aprovadas as medidas propostas em consulta pública, principalmente a redução do custo do medicamento, elas devem impactar diretamente em 54% da população que faz em uso regular de medicamentos, ou seja, 73,8 milhões de brasileiros, com base no último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Para a professora do ICTQ e especialista em assuntos regulatórios da indústria farmacêutica, Claudia Fadiga, a confiança virá com o tempo. “Todos os medicamentos similares que foram registrados desde 2007 já possuem comprovação de segurança, eficácia e qualidade perante a Anvisa. Porém, os que já possuíam registro ainda estão em período de adequação. Como não há atualmente uma forma de identificar quais possuem a comprovação e quais estão em fase de adequação, não há como o farmacêutico ou o consumidor distingui-los.” Ela acredita que, com as alterações nas embalagens e a inserção dos dizeres EQ Medicamento Equivalente –, isso estará evidente, e, então, eles poderão ser dispensados com a mesma confiança que ocorre com os genéricos.
Claudia diz que os similares possuem uma parcela significativa no mercado brasileiro – existem quase quatro mil registros desses medicamentos ativos no Brasil: “Entendo que as medidas gerarão mais estímulo ao desenvolvimento do setor farmacêutico nacional, ampliando, assim, a concorrência no mercado”.
Já o professor do ICTQ e ex-presidente da Anvisa, Dirceu Raposo, ressalta que a maioria quase absoluta dos usuários, pacientes e consumidores de medicamentos é incapaz de comparar e avaliar a qualidade dos produtos pela complexidade que os envolve. “Em saúde, dizemos que o usuário toma o medicamento, mas quem realmente o consome, sob a perspectiva econômica de mercado, é o médico ou o farmacêutico que determinam o que o usuário vai utilizar. Assim, essa percepção de qualidade é essencialmente construída por opiniões de terceiros ou pela propaganda, e que são absorvidas pelo cidadão comum”, polemiza ele.
Sobre a pesquisa
O estudo do ICTQ/Datafolha foi realizado em 135 municípios brasileiros distribuídos em todas as regiões. Foram entrevistadas 2.061 pessoas em pontos de fluxo populacionais. A margem de erro é de apenas 2 pontos percentuais.
Os índices apresentados são recortes de dois estudos: O Primeiro Levantamento Acerca do Perfil do Consumidor de Medicamentos, realizado no final de 2012 e que terá uma segunda edição no fim de 2014, e o trabalho sobre Saúde, Medicalização e Qualidade de Vida.
Os dois estudos visaram compreender o comportamento do paciente consumidor de medicamentos. As pesquisas foram quantitativas, com abordagem pessoal e individual dos entrevistados, em pontos de fluxo populacionais, mediante aplicação de questionários com, em média, 20 minutos de duração. Foram pesquisados homens e mulheres com idade a partir dos 16 anos, que têm o hábito de consumir medicamentos.
SaudeWeb
Nenhum comentário:
Postar um comentário