Amamentar é um ato de amor. Você provavelmente já ouviu ou leu essa frase em algum lugar, e não costumam existir dúvidas a respeito do valor que o gesto tem. Porém, além de amor, o processo de amamentação envolve confiança, dedicação, apoio e muita informação
Muitas mães têm a sorte de viver o momento de forma tranquila desde o princípio. O leite desce no tempo previsto, o filho pega bem o peito e os meses de mamadas dão força à relação dos dois e saúde ao recém-nascido.
Para outras mães, contudo, um mundo de dificuldades se coloca no caminho, e o desafio é transpô-las sem perder a chance de viver uma fase única em afeto e aprendizado. “Tive muita dificuldade na amamentação. Meus seios ficaram muito feridos. Para mim, a melhor hora era quando ela estava dormindo. Pensar que teria que amamentar quando ela acordasse me deixava angustiada”. É o que relembra a jornalista Cristal Sá.
Morena, que hoje está no puro encantamento dos seus três aninhos, nem imagina o que sua mãe precisou fazer para garantir que ela tivesse amamentação exclusiva por cinco meses e meio. Os bicos dos seios racharam, fazer a retirada de leite pela ordenha era dolorido, e coisas muito inusitadas surgiram no caminho, como a recomendação de usar banana para ajudar a cicatrizar e minimizar a dor. “Não conseguia vestir nada. Andava sem blusa e pingando leite. Isso derruba qualquer autoestima. Todo dia eu pensava comigo mesma: só vou amamentar hoje. Amanhã eu desisto. Mas, no dia seguinte, recomeçava.”
A história de Cristal é uma dentre várias que acontecem todos os dias, fazendo com que muitas mães desistam de amamentar, apesar de todas as provas de que o leite materno é a melhor alimentação para o bebê.
As dificuldades biológicas podem vir do tipo de bico do seio que a mãe possui ou da quantidade de leite que ela consegue produzir. Mas também há aquelas do tipo cultural: as cobranças, palpites, enganos e publicidades muito bem produzidas de laticínios colocam a insegurança na rota das mulheres.
Os dois tipos de dificuldade impedem que o índice de amamentação exclusiva até os seis meses, recomendado pela Organização Mundial de Saúde, atinja o padrão desejado.
Uma pesquisa realizada em 2008 e sistematizada em 2010 pelo Ministério da Saúde e pela Fiocruz em 227 municípios brasileiros, com 120.125 crianças, apontou que 87% dos municípios (198) apresentam um índice apenas razoável de amamentação exclusiva, quando algo entre 12% e 49% dos entrevistados declararam realizar a prática.
Para a doula e educadora perinatal, coordenadora da Roda Bebedubem, e mãe de três crianças, Débora Regina Diniz, grande parte das dificuldades é cultural. Segundo ela, ante o desafio de amamentar, toda mãe se cobra, é cobrada e alvejada por centenas de interferências que a distanciam da sua condição natural de mamífera. “Temos todos os aparatos, mas frente ao bebê e com toda a nossa insegurança, fica difícil reconhecer o poder que toda mulher tem. Precisamos confiar em nosso instinto”.
No Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz), a enfermeira Nina Savoldi e a médica Marlene Assumpção, da Rede Brasileira de Bancos de Leite Humano, recebem diariamente um sem número de mães e pais aflitos com as dificuldades de amamentar.
Muitos dos pais já são desencorajados na maternidade de persistir nas tentativas, e recebem recomendações de fórmulas {em forma de pó, são misturadas em água}, acessórios e medicamentos que nem sempre resolvem os problemas, e muitas vezes causam outros. “A recomendação da fórmula {substância em pó, a ser diluída em água, fabricada para ser muito parecida com o leite materno} nos primeiros dias de vida, quando tanto mãe quanto bebê estão aprendendo a viver o processo de amamentação, muitas vezes ancorada numa perda de peso instantânea do recém-nascido, revela o desconhecimento de alguns profissionais de saúde, mesmo que estes tenham boa vontade.”, explica Marlene.
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