Britânico Aurelien Hayman é tema de documentário por recordar detalhes
precisos de sua biografia, síndrome que cientistas chamam de 'memória
autobiográfica superdesenvolvida'
Pense em uma data, e o britânico Aurelien Hayman será capaz de lhe dizer o
que ele fez, o que comeu, o que vestiu, que canções ouviu e outras memórias
daquele dia.
Detalhes que acabariam esquecidos pela maioria das pessoas permanecem
guardados na memória do jovem de 20 anos, portador de uma síndrome rara
conhecida como memória autobiográfica superdesenvolvida, ou hipertimesia.
Aurelien, tema do documentário The Boy who Can't Forget(O garoto que não
consegue esquecer, em tradução livre), a ser exibido nesta semana na emissora
britânica Channel 4, explica que na adolescência ele percebeu que era capaz de
se lembrar de coisas específicas de datas igualmente específicas.
Em 1º de outubro de 2006, por exemplo, Aurelien diz lembrar que o tempo
estava nublado, que escutou a canção When You Were Young, da banda The Killers,
que ele usou uma camiseta azul e que sua casa ficou sem luz durante algumas
horas.
"É como se eu estivesse acessando rapidamente uma pasta arquivada (no meu
cérebro)", disse ele, segundo o jornal The Daily Mail. "Todas as datas têm
fotos. É um processo visual, vejo uma sequência de imagens."
Ele ressalva, porém, que não tem "nenhum método ou técnica" para se lembrar -
é algo que acontece naturalmente.
Estudos científicos
A síndrome de Aurelien foi documentada
há pouco tempo, em um artigo científico de 2006 no periódico Neurocase. Nele, os
médicos descreviam o caso da americana AJ (posteriormente identificada como Jill
Price), uma mulher que dizia ter uma memória "incessante, incontrolável e
automática".
"Penso no passado o tempo todo. É como um filme que nunca acaba", disse ela
aos cientistas. "Enquanto falo com vocês estou pensando no que aconteceu comigo
em 17 de dezembro de 1982, uma sexta-feira, quando eu comecei a trabalhar em uma
loja. É uma questão de datas. Ouço uma data e sou capaz de vê-la; vejo o mês, o
ano."
Há apenas cerca de 20 pessoas diagnosticadas com a hipertimesia no mundo. A
condição tem semelhanças com o autismo e se caracteriza pelo uso de mais partes
do cérebro para a memória de longo prazo.
Segundo o artigo da Neurocase, as principais características da hipertimesia
são a capacidade de "passar uma quantidade anormal de tempo pensando no passado"
e "de lembrar eventos específicos do próprio passado".
Memória boa, memória ruim
O curioso é que, apesar da habilidade
incomum de lembrar detalhes da própria vida, os portadores da síndrome não são
bons em recordar outras coisas mundanas e gerais.
"Em contraste com a forte memória autobiográfica de AJ e de sua habilidade em
lembrar datas e eventos, ela não é uma boa memorizadora", prosseguem os
cientistas. "Ela contou que tem cinco chaves em seu chaveiro e nunca lembra para
que elas servem. Tem que fazer listas para se lembrar de suas tarefas. E disse
que sofria para se lembrar de poemas ou datas históricas."
Num determinado dia, após passarem horas juntos, os cientistas pediram para
que AJ fechasse os olhos e descrevesse que roupas os médicos estavam usando. Ela
não conseguiu lembrar.
O jovem britânico Aurelien tem experiência semelhante: contou ao Daily Mail
que sua supermemória para detalhes autobiográficos não lhe oferece nenhuma
vantagem na universidade, onde cursa literatura inglesa.
"Tenho uma boa memória em geral. Mas por ser uma memória autobiográfica, ela
não me ajuda com um trabalho acadêmico universitário", conta.
Os cientistas explicam que, em compensação à memória autobiográfica superior,
os portadores da síndrome podem apresentar deficit em funções de organização e
controle mental, por exemplo, além de tendências obsessivo-compulsivas.
Fonte Estadão
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