Vítimas de trauma que chegarem ao Centro Médico da Universidade
de Pittsburgh, nos Estados Unidos, com ferimentos graves de bala ou faca
poderão fazer parte de um novo experimento médico
Os cirurgiões vão retirar o sangue delas e substituir por uma solução
salina gelada. Sem batidas do coração ou atividade cerebral, os
pacientes estarão clinicamente mortos. Então os cirurgiões tentarão
salvar suas vidas.
O objetivo é ganhar tempo para tratar o ferido. claro que uma
experiência como essa tem seus críticos, e eles dizem que a pesquisa
contraria a ética médica.
Entre os defensores da técnica está Hasam B. Alam, professor da
Escola Médica de Harvard, que contribuiu para aperfeiçoá-la e a aplicou
em porcos. ” preocupante quando você pensa em todos os senões, mas você
tem que pesar os riscos e compará-los com os benefícios.”
“Isso é ‘Guerra nas Estrelas’”, acrescenta Thomas M. Scalea,
especialista em trauma da Universidade de Maryland. “Se, algum tempo
atrás, você dissesse a alguém que faria isso, pediriam a você que
parasse de fumar o que estivesse fumando porque você perdera o juízo.”
Como esse tipo de paciente chega ao centro médico sem condições de
concordar ou não com a experiência, a Universidade de Pittsburgh está
distribuindo braceletes para quem não quiser ser submetido à terapia,
caso chegue emergência. Até o início de junho, 14 pessoas já os haviam
pedido.
A proposta dos médicos é só fazer a Preparação Emergencial de
Ressurreição, como chamam o procedimento, em pacientes com trauma
catastrófico que tenham perdido muito sangue e sofrido uma parada
cardíaca.
Nas condições normais de temperatura –36,4 C–, os médicos têm menos
de cinco minutos para recuperar a lesão e restabelecer o fluxo de sangue
antes que ocorram danos cerebrais. Usando a nova técnica, eles
reduziriam a temperatura corporal para 10°C e aumentariam esse tempo
para uma hora.
“Queremos dar mais oportunidades aos pacientes”, diz Samuel A.
Tisherman, pesquisador-chefe da equipe. “Nos moldes atuais, menos de um
em dez sobrevive.”
Exceção
A experiência em humanos será coordenada pela equipe de emergência,
por cirurgiões de trauma, cirurgiões cardíacos e enfermeiros.
A equipe quer testar a técnica em dez pacientes para depois comparar
os resultados com os de outros que não tiveram o mesmo tratamento. A FDA
(agência que regula esse tipo de procedimento nos EUA) deu sua
aprovação, considerando a técnica uma intervenção urgente em situação de
risco.
“A decisão tem de ser tomada de imediato”, afirma Tisherman,
explicando que há três cirurgiões treinados para reconhecer os
potenciais candidatos. “Se ao menos um deles estiver no hospital e o
paciente certo chegar, então iremos em frente.”
Mas é preciso lembrar dos dois senões a que se refere o professor
Hassam: isso nunca foi feito em pacientes nos quais lesões desse tipo já
ocorreram, e nunca tentou-se substituir o sangue por solução salina
gelada.
Coração
A hipotermia já tem seu uso consagrado na cardiologia e deve ser
usada, segundo consenso internacional lançado há poucos anos, após
reanimação de paciente que teve parada cardíaca e apresenta indícios de
sequelas neurológicas. Nesses casos, a temperatura corporal reduzida
para um valor entre 32°C e 34°C, que deve ser mantido durante 24 horas, e
o coração continua batendo.
Segundo Sérgio Timerman, diretor do comitê de emergências
cardiovasculares da Sociedade Brasileira de Cardiologia, o resfriamento
do corpo (que pode ser feito com bolsas de gelo ou soro) diminui o
“trabalho” do organismo e o consumo de oxigênio pelo cérebro.
Por isso, afirma, a hipotermia aumenta em 34% a chance de o paciente
sobreviver à parada sem sequelas neurológicas. No procedimento, porém, a
temperatura precisa ser muito bem controlada.
O Incor (Instituto do Coração) deve testar em breve a hipotermia
durante o infarto. Há também protocolos internacionais para AVC
(acidente vascular cerebral).
“A terapia que ser testada nos EUA inicial e experimental, mas há boa
chance de dar certo”, afirma Guilherme Schettino, gerente médico de
pacientes graves do hospital Albert Einstein.
Folha de São Paulo
Nenhum comentário:
Postar um comentário