Todos os anos, milhares de pessoas de fora do Estado de São Paulo buscam tratamento nas unidades paulistas fazendo com que, a cada 30 segundos, um paciente seja atendido na rede hospitalar. É o que mostra um levantamento realizado em 2010 pela Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. A capital paulista, Campinas e a região de Barretos são os destinos mais procurados pelos estados para tratar seus pacientes. Uma das principais razões é a falta de acesso dos pacientes a tratamentos adequados nas cidades onde moram.
Percebendo o aumento desta demanda e a constante exposição da situação em que se encontravam os sistemas de saúde dos outros estados, o Hospital de Câncer de Barretos buscou uma solução para ajudar esta população carente e reduzir o número de pacientes que vêm em busca de tratamento em suas unidades de saúde, localizadas em Barretos e Jales, interior paulista.
“Percebemos que 40% de todo o serviço prestado pelo Hospital de Câncer de Barretos é destinado a pacientes de alta complexidade de outros estados, principalmente Rondônia, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul”, afirma o diretor geral do Hospital de Câncer de Barretos, Henrique Prata.
Segundo Prata, expandir as instalações das atuais unidades do Hospital não seria suficiente para sanar a procura por tratamentos destes pacientes. “Abrir qualquer serviço dentro do Estado de São Paulo não resultaria na redução da demanda que vem para Barretos. A partir dessa premissa, chegamos a conclusão que deveríamos agir diretamente na origem do problema e intervir”.
A primeira iniciativa para ajudar a população veio em 2010, com a criação de um serviço de diagnóstico precoce no Estado do Mato Grosso. Um conjunto de parcerias entre o Hospital de Câncer de Barretos, governo estadual, o projeto e Avon, Fachini, Instituto Ronald Mcdonald na área de pediatria e Rede TV permitiu que, antes de serem encaminhados ao hospital paulista, os pacientes tivessem todo um serviço de diagnóstico, diminuindo a incidência de casos de câncer em estágio avançado.
Em 2011, o mesmo conceito foi levado até Porto Velho, capital de Rondônia, onde, segundo Prata, a saúde encontrava-se em estado de calamidade pública. “Eu considero que a situação neste estado esteja pior que no Haiti e que a população está órfã de saúde. Então resolvemos encampar um projeto e assumir a gestão do Hospital de Base de Rondônia”, ressalta Prata.
O executivo explica que ao fazer o diagnóstico da instituição em Porto Velho foram encontradas graves falhas na gestão no hospital e deficiências no atendimento ao paciente. “Para mudar isso teremos que fazer um choque de gestão lá. A gestão deles é uma medicina realizada da pior forma possível, por exemplo, um paciente é operado no Hospital de Base, após o procedimento é levado para uma instalação não apropriada, precária e sem nenhum conceito de Oncologia, lá ele faz a radioterapia em um local, a quimioterapia em outro. Então o paciente tem que passar por quatro serviços diferentes para conseguir o tratamento e nenhum deles está dentro do conceito adequado, não estando de acordo nem com as portarias do Ministério da Saúde”.
Com um serviço de Oncologia fragmentado e deteriorado, sem condições de atender toda a demanda da região, cerca de 95% dos mil casos de câncer que surgem todos os anos em Rondônia migram diretamente para Barretos para fazer tratamento, o custo dessa operação chega a R$18 milhões ao ano para os cofres públicos. De acordo com o executivo do hospital em Barretos, outro grande problema é que, devido a falta de um serviço de diagnóstico precoce, os casos de câncer vêm em estado avançado onde até um estudante de medicina do primeiro ano consegue identificar a doença.
No entanto, antes de realizar qualquer tipo de intervenção administrativa no hospital ou investir em equipamentos e tecnologia era necessário arrumar a casa. Por esse motivo, Prata, decidiu fazer um choque de gestão. “A única coisa que eu aprendi em meus 24 anos como gestor em saúde oncológica é que a gestão de câncer deve ser obrigatoriamente multidisciplinar. Você não pode oferecer um serviço de forma isolada, tem que haver integração entre as áreas para que o paciente não tenha que passar por cada uma delas separadamente aumentando seu sofrimento”.
Uma das mudanças acordadas com o governo de Rondônia, após assumir o hospital em abril de 2011, será reformular a gestão e disponibilizar os médicos em período integral, totalmente dedicados ao hospital, ao atendimento SUS e com caixa único, da mesma forma que ocorre em Barretos. Segundo Prata, dessa forma o médico terá tempo para pesquisar, discutir e tomar atitudes multidisciplinares na conduta que for adotar, e não de forma individual. “Essa medicina do médico decidindo tudo de forma única não existe sob minha gestão. Creio que ocorrerá um grande choque de culturas entre a atual realidade do hospital e a nova gestão a cargo do Hospital de Câncer de Barretos”.
De acordo com Prata, a mudança efetiva da gestão do Hospital de Base de Rondônia só ocorrerá após a reforma de parte do complexo, que está prevista para começar dia 20 de abril, e contará com a melhoria das instalações e novos equipamentos diagnósticos. A nova administração pretende oferecer um conceito de medicina diferente para os médicos que atenderão em período integral. “A ideia é que o médico tenha o atendimento clínico, cirúrgico e ambiente e horário para estudo e pesquisa, troca de opiniões com colegas por meio de videoconferência com o Hospital de Câncer de Barretos, vamos criar um ambiente propício para o desenvolvimento do profissional”.
Ainda não há um orçamento definido para as reformas, mas grande parte da verba será destinada por meio de ações sociais e parcerias do hospital. “A saúde de Rondônia está muito fragilizada e a falta de dinheiro é um dos grandes problemas”.
Além de levar qualidade ao tratamento oncológico ao estado, outro grande objetivo da nova gestão é oferecer um tratamento humanizado. “Precisamos levar atendimento para perto da casa do paciente, o povo não é bobo, ninguém vai se cuidar em um lugar onde não se é bem tratado. A diferença de atendimento entre Rondônia e São Paulo é tão grande que os pacientes viajam três mil quilômetros só para se tratar aqui. Precisamos mudar isso e lavar a saúde para perto deles. Se eles nunca viram um milagre, então verão pela primeira vez”.
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