Estudo da Unesp trabalha com hipótese na qual feto se adapta a ambiente intrauterino adverso
Hábitos de restrição alimentar mantidos pela mãe durante a gravidez podem causar alterações no intestino do feto que podem durar até a vida adulta, indica uma pesquisa feita na Universidade Estadual Paulista (Unesp). Ainda de acordo com o estudo, tais alterações podem colaborar para o estabelecimento da obesidade observada em animais nascidos nessas condições, segundo informações da Agência Fapesp.
Os resultados do estudo, feito com ratos, vão ao encontro da chamada hipótese da programação fetal, já levantada por outros trabalhos. Segundo a teoria, o organismo do feto se adapta a um ambiente intrauterino adverso. Como esse metabolismo poupador se mantém após o nascimento, o indivíduo se torna mais propenso a engordar caso o padrão de ingestão calórica melhore.
Na pesquisa, coordenada pela professora Maria de Lourdes Mendes Vicentini Paulino, do Instituto de Biociências da Unesp de Botucatu, foram investigados os efeitos da baixa ingestão de proteína durante a gestação sobre a atividade e expressão gênica de enzimas intestinais e sobre a expressão gênica e imunolocalização de transportadores intestinais dos fetos, que são fundamentais para a absorção de nutrientes no intestino.
"Para um nutriente ser absorvido, ele primeiro precisa ser digerido por enzimas até alcançar um tamanho pequeno o suficiente para atravessar a membrana das células do intestino. E para que essa travessia ocorra, as moléculas precisam se ligar a proteínas que atuam como transportadores", explicou Maria de Lourdes.
Passo a passo
O experimento na Unesp foi iniciado com dois grupos de ratas-mãe. Durante o período de gestação, a rata do grupo controlado recebeu uma dieta com 17% de proteína. A outra recebia apenas 6% de proteína na ração.
Assim que os filhotes nasceram e teve início o período de amamentação, as fêmeas passaram a receber uma dieta idêntica, com 23% de proteína. As primeiras análises foram feitas quando os filhotes estavam com três semanas de idade, o que corresponde ao período de desmame.
"Das três enzimas estudadas, percebemos uma elevação estatisticamente significante na lactase, que é justamente a responsável pela digestão do açúcar do leite, no grupo que sofreu a restrição alimentar. Houve também aumento na expressão gênica dessa enzima", afirmou a pesquisadora.
Após o desmame, os filhotes dos dois grupos passaram a receber uma dieta idêntica. Na segunda análise feita com 16 semanas, considerada a fase adulta nos ratos, verificou-se maior atividade e maior expressão gênica da enzima sacarase no grupo cuja mãe havia sido privada de proteínas durante a gestação. "Não medimos a atividade da lactase na fase adulta porque nos mamíferos, normalmente, a síntese dessa enzima diminui após o desmame", explicou.
Nas duas análises - feitas com três e 16 semanas de idade - foi possível notar maior proliferação intestinal, maior expressão gênica e maior presença dos transportadores SGLT1, GLUT2 e PEPT1, que tem consequência direta na absorção dos nutrientes. Essas respostas foram encontradas principalmente no duodeno, parte inicial do intestino delgado.
"Os resultados nos mostram que alterações do intestino delgado observadas na idade adulta podem ser programadas durante a gestação e que esta resposta pode ser atribuída, pelo menos parcialmente, ao aumento na expressão gênica de enzimas e transportadores. Essas alterações, que possibilitam maior absorção de nutrientes, talvez possam contribuir para o acúmulo de gordura observado em outros estudos", avaliou Maria de Lourdes.
A equipe pretende agora investigar se a atividade enzimática e a expressão gênica das enzimas pancreáticas, responsáveis por iniciar a digestão dos nutrientes, são afetadas pela restrição alimentar. "Vamos estudar a fase anterior do processo digestivo. As enzimas pancreáticas são também ligadas ao fornecimento de energia para o organismo", concluiu.
Fonte Estadão
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