Tanto na indústria de planos de saúde como na de serviços hospitalares, a tendência é a mesma, dizem especialistas
O exercício de futurologia é ingrato, frequentemente presenciamos gafes monumentais cometidas por formadores de opinião bem intencionados, esquecidos de “combinar com os russos” os destinos do amanhã. Não obstante, a história econômica nos permite apontar possibilidades a partir da identificação de eventos em curso, comparando-as com experiências anteriores.
A indústria da saúde, ou complexo industrial da saúde, é uma definição recente entre nós; ainda há torcer de narizes quando se compara a saúde a uma atividade industrial. Não há, porém, como vê-la de outra forma em tempos de produção em massa para atingir a totalidade da população, o que não significa abrir mão da qualidade, da ética, do respeito ao consumidor e da humanização; ao contrário, essa é uma tendência verificada em outras indústrias já maduras, a se acentuar no âmbito da saúde com mais transparência, mais conformidade (compliance) relativamente às regras, políticas e códigos de ética das empresas.
E isso se dará mais por pressão dos consumidores e seus órgãos de defesa do que necessariamente por conscientização dos ofertantes, pois há que se superar a ideia de que, para atender em grandes volumes, há que se reduzir o custo e atender mal; significará também saltar do modelo fordista para a produção flexível.
Sim, atender em grandes volumes, pois atenção à saúde será crescentemente desejo de consumo. A emergente classe C, resultado do aumento da massa salarial dos últimos oito anos, se em um primeiro momento de acesso ao consumo aceitou produtos/serviços de menor qualidade, rapidamente aprendeu a distinguir qualidade de quantidade. Resulta da ampliação da cidadania, a se acentuar nas próximas décadas, como consequência da consolidação da nossa jovem democracia.
No plano privado, é previsível a concentração, tanto na indústria de planos de saúde como na de serviços hospitalares; o número de partícipes seguirá diminuindo até atingir o limite máximo admissível pelos órgãos de defesa da concorrência; é a lógica do capital, visando diminuir riscos e adquirir peso político para enfrentar a regulamentação.
Adicionalmente, pressões para admitir a participação do capital internacional na prestação direta de serviços de saúde devem aumentar; hoje ela já se faz presente de forma dissimulada ou indireta em várias redes de hospitais e em administradoras de planos de saúde, conhecida pelo mercado e tolerada pelo governo, apesar da lei.
O amadurecimento da indústria exigirá melhor educação da força de trabalho, em especial no plano da gestão; hoje há poucos mestres e doutores em cargos diretivos na saúde em comparação a outras indústrias consolidadas. Da mesma forma, a fé inabalável em gurus e práticas que não deram certo em outros países, com ruinosos efeitos em suas economias, mas ainda alardeados em congressos e feiras, deverá dar lugar a práticas econômicas e de gestão baseadas em evidências e conhecimentos locais.
Enfim, um futuro de muito trabalho — falta muito chão a percorrer para a construção de uma Nação, mas vamos na direção certa, o “complexo de vira-lata” citado por Nelson Rodrigues: “..a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo”. Dando lugar a um sentimento de orgulho, de que podemos fazer bem feito.
*Maria Cristina Amorim
Economista, professora
titular da PUC-SP
*Eduardo Perillo
Médico, mestre em administração, doutor em história econômica
Fonte SaudeWeb
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