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terça-feira, 2 de abril de 2013

Telemedicina e Telessaúde: avanços e dificuldades

Para Chao Wen, da FMUSP, é preciso tomar cuidado, pois as tecnologias por si só podem não ser atrativas. O importante é inseri-lás em serviços educacionais, assistenciais, diagnósticos ou de pesquisa que gerem benefícios
 
A revista FH entrevistou: Chao Lung Wen
 
Quem
Médico formado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, com doutorado em 2000 com a Tese Ambiente Computacional de Apoio à Prática Clínica, e a primeira Livre-Docência em Telemedicina na Faculdade de Medicina da USP, em setembro de 2003.

O que faz
- Chefe da Disciplina de Telemedicina da FMUSP;
- Presidente do Conselho Brasileiro de Telemedicina e Telessaúde (CBTms);
- Membro da Comissão Permanente de Telessaúde e do Comitê Executivo de Telessaúde do Ministério da Saúde;
- Coordenador do Núcleo de Telemedicina e Telessaúde do HC-FMUSP;
- Coordenador do Núcleo São Paulo do Projeto de Telemedicina e Telemática em Apoio à Atenção Primária do Ministério da Saúde.
- Orientador dos programas de pós-graduação da Patologia e Fisiopatologia da Faculdade de Medicina da USP;
- Coordenador da unidade HC-FMUSP da Rede Universitária de Telemedicina (RUTe/RNP/MCT);
- Autor de mais de 10 trabalhos publicados sobre Telemedicina, 20 trabalhos apresentados em congressos internacionais e 30 em congressos nacionais. Proferiu mais de 150 palestras e ministrou cursos de treinamento em Telemedicina e Telessaúde;
- Escritor de capítulos de livros sobre Telemedicina e um dos autores da coleção Clinica Médica, do HC-FMUSP, conjunto de livros sobre medicina interna, com mais de 6.000 páginas;
- Responsável pela criação do Projeto Homem Virtual em 2003.
 
Revista FH: As empresas de tecnologias veem no Brasil uma grande possibilidade para investimento em Telemedicina devido a grande extensão territorial e potencial de crescimento do acesso à saúde. Como você analisa o papel dessas empresas?
Chao Lung Wen:
As empresas estão certas, porém é preciso tomar cuidado, pois as tecnologias por si só podem não ser atrativas. O importante é inserir as tecnologias dentro de um contexto de serviços (educacionais, assistenciais, diagnósticos ou de pesquisa) que geram benefícios. Isto somente poderá ser feito por profissionais que entendem do assunto saúde, sua cadeia funcional e como se pode obter melhoria da eficiência na cadeia de trabalho, ou seja, na cadeia produtiva de saúde.
 
FH: Parcerias entre governo e essas empresas de tecnologia são fundamentais para viabilizar a telemedicina? Como se dão essas parcerias?
Wen: O governo brasileiro tem fomentado atividades de aplicação de tecnologias em saúde, como em atenção primária, emergências, doenças crônicas, saúde do idoso, saúde materna, entre outras. Por outro lado, a formação de núcleos de pesquisa contínua é importante para o aprimoramento das soluções e a formação de recursos humanos, digo, profissionais de saúde e tecnologia. Assim, o governo gera demandas e as empresas, por meio das universidades, podem gerar modelos e soluções efetivamente eficazes, que seriam aplicados a essas demandas do governo.

Considerando a expertise adquirida e a equipe formada, pode-se também gerar soluções para serem aplicadas aos segmentos de medicina de grupo e privado.
 
FH: Há iniciativas na área de telemedicina advindas de hospitais filantrópicos. Mas e os hospitais puramente privados, há oportunidades para eles? Eles estão inseridos dentro do desenvolvimento de telemedicina no País?
Wen: As pesquisas de soluções em telemedicina são aplicáveis tanto para a área privada como para a área pública. Existem centros de excelência que têm desenvolvido trabalhos importantes em teleducação e telessaúde para apoiar o SUS, mas que, por sua vez, os resultados obtidos podem ser facilmente aplicados no segmento privado.

Acredito que se houver uma integração de ações ainda maior entre estes hospitais filantrópicos com universidades, poderemos acelerar a formação de mais profissionais especializados. Inclusive, as atividades podem se transformar em publicações e pós-graduações, em nível de mestrado e doutorado, aumentando assim a massa crítica de profissionais no Brasil que trabalhariam nesta área.
 
FH: O Incor recebeu R$ 20 milhões em investimento para o seu novo centro de telemedicina, que tem participação da FMUSP. Qual a importância do projeto do ponto de vista do ineditismo que o centro propõe com a discussão de casos clínicos pela web?
Wen: A disciplina de Telemedicina da Faculdade de Medicina da USP é integrante do grupo executivo que está projetando a ação de Tele-Emergência cardiológica, sob a liderança do InCor. O grande ponto de destaque é a estruturação de uma rede que consegue prover uma infraestrutura de serviço de apoio para situações que precisam de orientação especializada cardiológica nos locais de pronto-socorro ou pronto-atendimento. Esta estratégia é muito importante para a redução de agravos, e possibilita oferecer uma ação ágil de qualidade.
 
FH: No caso do Incor será disseminado alto conhecimento na área cardiológica.
Qual o principal foco da telemedicina do ponto de vista de especialidades médicas? Ela é uma aliada à prevenção?
Wen: Ressalto que no caso do InCor, o projeto é focado na Tele-Emergência e envolve inclusive a orientação e qualificação dos profissionais em serviço.

O InCor, por meio do serviço de TeleECG, também desenvolve atividades de educação sobre ECG através de Teleducação Interativa, e participa do Programa Telessaúde Brasil Redes, Núcleo São Paulo, do Ministério da Saúde, disponibilizando laudos de ECGs enviados pelas unidades participantes do projeto. Assim, pode sim ser aliada à prevenção.
 
FH: O Ministério pretende chegar a 158 núcleos da rede RUTE em 2014, hoje são 73. Quais são as estratégias de expansão para alcançar essa meta?
Wen: A RUTE é fundamentalmente a estruturação de um backbone (uma espécie de rede de transporte) de alto desempenho para integração dos hospitais universitários e para incentivar a interação entre eles por meio da organização e realização de programas e atividades educacionais e assistenciais. A estratégia é justamente manter essa integração e interação entre as partes.
 
FH: Do ponto de vista da tecnologia da informação, quais as principais dificuldades de infraestrutura para implantar a telemedicina em lugares remotos?
Wen: O ponto principal atualmente é a conectividade. Muitas localidades distantes e regiões periféricas de grandes metrópoles possuem importantes limitações de conectividade à internet. O segundo ponto é uma distribuição que ofereça a facilidade de acessibilidade móvel. Neste caso, tablets e notebooks/ultrabooks para saúde ajudariam o processo. O terceiro fator, que não está envolvido com tecnologia, é a capacitação dos profissionais de saúde e a criação de uma rotina na qual a utilização da telemedicina e telessaúde possa agilizar o processo de cuidados à saúde da população.
 
FH: Como são definidos os municípios que serão contemplados com a telemedicina? Como isso se dá dentro da estratégia do Programa Saúde da Família?
Wen: O Ministério da Saúde publicou portarias no Diário Oficial da União, em 2011 e 2012, que caracterizam a telessaúde e os critérios de inclusão. Estão muito focados em áreas com cobertura de PSF, priorizando locais em que se precisa aumentar o IDH [Índice de Desenvolvimento Humano].
 
FH: A expansão do número de grupos de pesquisa nas instituições universitárias e a estruturação da telemedicina como uma disciplina podem ser consideradas pontos relevantes em relação à consolidação do uso no País? Como as instituições de Saúde enxergam a disciplina de telemedicina?
Wen: Sim. A organização de atividades de telemedicina em forma de disciplinas é importante para garantir a formação contínua desde a graduação, expandindo para a residência médica e pós-graduação. Além da disciplina de Telemedicina da Faculdade de Medicina da USP, outras universidades brasileiras estão neste processo de organização, como a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Universidade do Estado do Amazonas (UEA).
 
FH: Comparando com outros países emergentes de grande extensão territorial como China, Rússia e Índia, como está o Brasil no contexto da telemedicina?
Wen: O Brasil está avançando com um bom incentivo governamental. Porém, precisa integrar melhor as ações, tanto dentro do próprio Ministério da Saúde como a integração entre os ministérios e atividades em conjunto com estados e municípios. Sem esta ação conjunta, teremos ações pontuais, limitadas a projetos. Com isto, será mais difícil transformar em programa contínuo. A Índia investiu em lançar um satélite exclusivo destinado à saúde. O Brasil também poderia pensar em alocar pelo menos uma parte das capacidades funcionais de um satélite de comunicação para fins de educação e pesquisa.
 
FH: Dentro da estratégia do Ministério da Saúde há algum modelo de telemedicina de outro país que é usado? Em sua opinião, há algum modelo no exterior que podemos usar exemplos e copiar iniciativas? Qual e por quê?
Wen: As soluções de telemedicina são intercambiáveis. Assim, as experiências de um país podem ser aplicadas no Brasil, desde que estejam adequadamente adaptadas para a nossa realidade. Assim, é fundamental a formação de uma massa crítica de pesquisadores na área para que o país possa progredir mais rapidamente.
 
FH: Qual a principal diferença entre telemedicina e telessaúde?
Wen:
Não existe apenas uma definição. Alguns indicam que a telemedicina é a aplicação da tecnologia interativa na área médica, enquanto que a telessaúde refere-se às outras áreas de saúde excluindo a medicina. Outros preferem pensar que a telemedicina é uma área da telessaúde. Não importa exatamente a definição, o que importa é a meta de aplicar a tecnologia para otimizar o processo de saúde das pessoas. Tenho um pensamento para reflexão sobre telemedicina e telessaúde: telemedicina é processo de otimização da recuperação de uma pessoa do estado de doença para estado de saúde com reforço no processo humanizado.

Telessaúde é o processo de valorização de saúde (eCare/ eHealth), redução de riscos e redução de agravos.
 
FH: A rápida evolução tecnológica dos últimos anos nas áreas de eletrônica, telecomunicação e computação tornou acessíveis tecnologias que, outrora, tinham custos proibitivos. Em sua visão, este fato pode ser considerado um facilitador do surgimento da telessaúde no Brasil?
Wen: Sim. O acesso a equipamentos com capacidades de processamento cada vez maior e custo cada vez menor, aliado à maior oferta de conectividade, facilitaram o surgimento e expansão da telessaúde no Brasil.
 
FH: Existe um atual projeto de Telemática e Telemedicina em apoio à Atenção Primária à Saúde no Brasil coordenado pelo Ministério da Saúde. Qual é a participação da Faculdade de Medicina da USP neste desenho?
Wen: A Faculdade de Medicina da USP participou da elaboração do primeiro projeto de Telemática e Telemedicina em Apoio à Atenção Primaria, em dezembro de 2005, para o Departamento de Gestão da Educação na Saúde (DEGES/SGTES) do Ministério da Saúde e, desde então, vem trabalhando juntamente com o SGTES, ininterruptamente, como Núcleo Técnico Científico do Estado de São Paulo do Programa Telessaúde Brasil Redes.
 
FH: É possível, por meio deste projeto, aprimorar os conhecimentos das equipes do Programa de Saúde da Família (PSF)?
Wen: Claro que sim. Entre diversas ações que o Núcleo São Paulo desenvolve, temos a Educação Interativa à distância, a Segunda Opinião Formativa, a Biblioteca de Vídeos de Educação Aplicada e o Acervo do Projeto Homem Virtual, onde se faz uso de computação gráfica 3D para explicar temas relevantes e complexos, de forma objetiva e dinâmica.
 
FH: Ao longo desses anos estudando e conhecendo os projetos de telemedicina, o que mais te emocionou?
Wen: O que mais me emociona nas atividades de telemedicina é a possibilidade de promover o desenvolvimento da saúde das comunidades, integrando as ações de saúde em atenção primária com o Projeto Jovem doutor, que conta com o envolvimento estudantil, para o desenvolvimento das comunidades de forma sustentada e contínua.
 
FH: Suas linhas de pesquisa incluem também educação mediada por tecnologia e teleeducação interativa. O seu objetivo final vai além da aprendizagem colaborativa?
Wen: As minhas linhas de trabalhos são em Educação Interativa e Tecnologias Educacionais Interativas para potencialização da Educação em Saúde.

A Educação Interativa fundamentalmente estimula a educação adaptativa e é baseada em multimeios. Promove o aprendizado flexibilizado, colaborativo, com mensagens significativas, interativo, com compartilhamento de experiências, educação comportamental, atitude e a construção de valores.
 
FH: Em sua opinião, a telemedicina evoluiu nos últimos cinco anos? Quais são os obstáculos que a impedem de ir mais longe?
Wen: A telemedicina evoluiu muito. Os nossos principais obstáculos estão relacionados com a cultura dos profissionais de saúde no uso de tecnologia e nas conectividades.
 
FH: Como pensador, como disseminar conhecimento?
Wen: Existem vários pontos importantes para difundir conhecimento. Entre eles posso citar a criação de marcos de referência de informações para quem está aprendendo.

Assim, a pessoa pode se orientar mais facilmente; oferecer visões de como abordar situações práticas, oferecendo ao aluno uma segurança de como lidar com situações do dia a dia; educar quando ele deve rapidamente pedir apoio, pois a formação permite criar um senso que visa a reduzir agravos; desenvolver uma disciplina e o gosto pela atualização continuada; e sobretudo desenvolver o valor comportamental, da paixão de cuidar das pessoas que precisam dele.
 
Fonte Saudeweb

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