São Paulo - O estado paulista concentra 110,4 mil dos 338 mil médicos existentes
no país, representando 28,4% dos profissionais cadastrados no Conselho Federal
de Medicina (CFM). Em termos proporcionais, são 2,64 médicos para cada mil
habitantes. A taxa é similar à meta traçada pelo Ministério da Saúde para o
país, definida em 2,7. A má distribuição desses profissionais no território, no
entanto, que já é constatada em diversas regiões do país, também se reflete na
realidade estadual.
Quase 50% dos médicos que atuam em São Paulo, ou 50.740, estão na capital. Em
relação aos habitantes, a proporção é 4,48 profissionais por mil. Os dados
constam no estudo Demografia Médica Brasileira, do CFM, lançado em
fevereiro deste ano. Dentro do próprio município, entretanto, também são
observadas desigualdades na distribuição.
É o caso da Assistência Médica Ambulatorial (Ama) Tito Lopes, no bairro São
Miguel Paulista, extremo leste da capital. Segundo a organização social (OS)
Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (APDM), que administra a
Ama do Sistema Único de Saúde (SUS), existem 11 vagas para médicos. Entre as
razões apontadas para a falta de profissionais, está "a localização das unidades
de saúde, em grande parte periféricas", assinala a nota da entidade.
Embora nunca tenha deixado de ser atendida na Ama Tito Lopes, a agente de
pesquisa Jaqueline da Silva, 29 anos, reclama da demora por uma consulta.
"Quando resolvo esperar, sou atendida, mas isso pode levar quatro, cinco horas.
São poucos médicos no plantão", criticou. Na manhã do dia 6 de agosto, ela
buscou atendimento às 8h15 e conseguiu ser atendida por volta das 10h30. "Até
que foi rápido, mas não dá para dizer que foi bom. A médica não tocou em mim,
não pediu exame, já foi logo escrevendo a receita e não me explicou como usar o
remédio", relatou. Jaqueline foi à Ama com sintomas de dor no estômago.
Segundo a Secretaria Municipal de Saúde, o déficit total de médicos na rede
pública chega a 2.060, com a maioria das vagas disponíveis nas regiões leste e
sudeste da capital paulista. No último processo de seleção do órgão, 20% dos
médicos aprovados não compareceram, informou o órgão. Além da localização dos
bairros, a baixa remuneração e a impossibilidade de cumprir a jornada de
trabalho por causa de outros empregos estão entre as justificativas para a
recusa. O salário médio para uma carga horária de 20 horas semanais é R$ 4,2
mil. A remuneração média quando esses profissionais são contratados via OS sobe
para R$ 6,2 mil.
"Em São Paulo, na comparação com o Brasil, existe uma diferença marcante. Mas
ainda assim, especialmente na periferia da capital, existem áreas onde há
dificuldade [de fixar médicos] por causa dos riscos", comentou Otelo Chino,
diretor do Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp). Entre as dificuldades
enfrentadas pelos médicos, ele cita a questão da segurança pública e os grandes
deslocamentos. "São áreas de periferia, algumas a 40 quilômetros do centro. Se
exigem uma jornada diária, leva-se pelo menos três horas no deslocamento",
exemplificou.
Os usuários do SUS ouvidos pela Agência Brasil em São Paulo
relataram mais dificuldades na utilização dos serviços de pronto atendimento e
de assistência especializada. "A gente já chega aqui [Ama Tito Lopes] com dor,
faltando ao trabalho. O que a gente mais quer é sair logo e com uma medicação,
mas acaba esperando muito tempo e se pelo menos a dor passasse", relatou a
empregada doméstica Sandra Regina de Oliveira, 49 anos. A prefeitura orienta que
para sintomas como este, de menor gravidade, os usuários busquem uma das 139
Amas espalhadas pela capital.
A demora para conseguir uma consulta especializada também aparece entre as
reclamações. A aposentada Neusa Aparecida Pereira, 69 anos, conta que precisou
esperar cerca de três meses para ser atendida por um ortopedista. "Fiquei ruim
da perna. Passei na Ama para tomar uma injeção para dor e ele me deu uma guia
para passar no especialista. Demorou três meses para ser chamada, ele me pediu
para fazer exames e foram mais dois meses para o retorno. No dia que eu fui, [a
Ama] estava em reforma e acabei deixando por isso mesmo. Até a dor volta",
relatou. Ela conta que a burocracia nas marcações a faz desistir de uma saúde
preventiva.
É na Unidade Básica de Saúde (UBS), no entanto, que a expressão "saúde da
família" ganha vida no SUS. Pelo menos é assim que relata a cozinheira Zelmira
Buzinaro, 58 anos. Ela trata pelo nome o médico do posto mais próximo de sua
casa e recebe mensalmente uma visita das agentes de saúde na sua casa. "Elas
medem minha pressão, perguntam como está a saúde. Quando tinha convênio isso não
acontecia. Mas sei também que isso depende muito da equipe. Já minha cunhada
vive reclamando do posto perto da casa dela", apontou. Segundo a prefeitura, 440
unidades prestam esse atendimento na cidade.
Apesar de reclamar do atendimento que recebeu na Ama, Jaqueline também
acredita que o acompanhamento regular que recebe em na casa pela UBS é o que
mais se aproxima de um atendimento ideal na saúde pública. "Não tenho do que
reclamar. Se precisar, até a médica vai. Se tiver consulta marcada, eles avisam.
Pesam a criança. Agora que estou trabalhando é mais difícil receber a visita,
mas sei que funciona. Eles me conhecem e eu conheço eles. Bem diferente daqui
[Ama Tito Lopes]", comparou.
Agência Brasil
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