O colorido está por todos os lados. As paredes têm os tons da infância e abrigam personagens que, desenhados nelas, parecem saltar da imaginação. Os móveis, cheios de vida, até fazem esquecer, por alguns instantes, que se trata de um hospital que cuida de crianças e adolescentes com câncer. Atualmente, 2.131 pacientes estão em tratamento na Associação Peter Pan (APP), em Fortaleza.
O que mais chama atenção, no entanto, são os olhares curiosos que desejam desvendar o mundo e os sorrisos que inundam o ambiente com alegria e esperança. Entre os sonhos e as projeções de um futuro que começa a ser traçado, cada um dos meninos e meninas carrega consigo a força de vontade para superar a doença. Na caminhada rumo à cura, a detecção precoce, a atenção humanizada e o pronto início do tratamento são vitais para alcançar os melhores índices de recuperação.
Novembro Dourado
Por lei, 23 de novembro, próximo sábado, é o Dia Nacional de Combate ao Câncer Infantojuvenil. Este ano, contudo, o mês todo ganhou uma campanha para divulgar a enfermidade à população como um problema de saúde pública, salientando que se trata de uma doença curável: o Novembro Dourado.
"Nós nos inspiramos no Outubro Rosa. É voltada para que possamos ter, em âmbito nacional, uma campanha para o diagnóstico precoce. Há muitas ações de combate ao câncer em adultos no País, mas o Novembro Dourado é importante para que as crianças possam contar com um apoio maior", explica Olga Maia, presidente da APP.
De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), o câncer é a primeira causa de morte por doença na faixa etária de 5 a 19 anos - excluindo-se as causas externas. Entretanto, se há 30 anos a chance de cura era de 15%, hoje passa de 65%, podendo chegar a 85% em alguns casos.
"No Ceará, temos porcentagens semelhantes aos índices nacionais e, atualmente, as crianças são encaminhadas ao hospital em tempos mais curtos, tornando possível um melhor tratamento. Porém, o trabalho de esclarecimento para que isso aconteça deve ser contínuo, pois ainda há muito por fazer", destaca a oncologista pediátrica Nádia Trompieri, coordenadora científica do programa de diagnóstico precoce do núcleo Mais Vida, da Associação Peter Pan.
Como é feito o diagnóstico
O câncer na criança tem apresentação clínica com sinais e sintomas comuns a outras doenças frequentes na infância, o que pode dificultar o diagnóstico. Assim, além dos exames laboratoriais, o estudo de imagem também é determinante para ajudar na detecção precoce da doença.
"A suspeita clínica feita pelo pediatra, o encaminhamento para um Centro de Oncologia e o diagnóstico precoce são essenciais para que a cura seja alcançada", aponta Nádia Trompieri.
Exemplos de vida
A notícia de que a filha Micaeli Lemos, de 13 anos, estava com um Sarcoma de Ewing (tipo de tumor ósseo) representou uma reviravolta na rotina da agricultora Maria Elisângela Lemos. Elas moram em Quixadá, mas, desde fevereiro, quando Micaeli recebeu o diagnóstico precoce, estão em Fortaleza para o tratamento na APP.
"Quando soube, me desesperei. Eu não chorava, gritava em frente ao (Hospital Infantil) Albert Sabin. Ela já fez nove sessões de quimioterapia e faltam outras nove. O médico disse que é um dos tipos de tumores mais agressivos, tanto é que ela fez 28 sessões de radioterapia também", conta.
Desde março, a estudante toma os medicamentos quimioterápicos a cada 21 dias. "No começo, a Micaeli não acreditava. Quando a médica deu o diagnóstico, ela dizia: ´eu não tenho câncer, não me leva para tomar esse remédio, eu não sinto nada´. Realmente, até os efeitos da ´quimio´ aparecerem, ela não tinha sintomas. Hoje ela entende tudo, mas é muito calada. Se estiver sentindo alguma coisa não se queixa de nada. Como mãe, eu que percebo e converso com ela", relata.
Depois de oito meses de tratamento, Elisângela reconhece a importância da detecção do câncer na fase inicial. "Se minha filha não tomasse os medicamentos, com certeza não estaria bem", considera.
A queda dos cabelos, por sua vez, é apenas um detalhe em frente aos muitos sonhos que a adolescente alimenta. "Ela está careca, mas cabelo nasce. O importante é a saúde. A Micaeli tinha um cabelo muito bonito, mas hoje não tem vergonha de andar sem lenço. Ela tenta ser feliz do jeito que Deus quer. É muito estudiosa, uma das melhores alunas da turma, e quer se formar logo", diz a mãe.
O diagnóstico precoce associado ao tratamento especializado também foi significativo para a cura de Charles de Oliveira Bezerra, de 8 anos. Quanto tinha apenas um ano e seis meses, sua mãe, a dona-de-casa Marlene Oliveira, percebeu manchas roxas pelo corpo do filho e a febre, que apareceu em seguida, tornou-se diária. Pouco tempo depois, os exames acusaram leucemia.
"Hoje ele está curado, fez o transplante há dois anos. O doador foi o meu outro filho, de 5 anos, que fez os exames e era compatível. O Charles está bem, é uma criança saudável. Só vai ao hospital da Associação Peter Pan uma vez por mês para fazer exame de sangue e saber como está", conta Marlene.
Quando é negativo
Fazer os exames o quanto antes é o primeiro passo. Faltava uma semana para o grande dia. A ansiedade tomava conta da Miss Ceará Mirim, Yarice Aksa, de 12 anos, que planejava a ida a Salvador para a disputa do título nacional. Às vésperas da viagem, no entanto, ela começou a sentir uma forte dor de cabeça e, após quatro dias com o mesmo quadro, acordou com sangramento no nariz.
A supervisora acadêmica Ana Karine Silva, mãe de Yarice, entrou em alerta e levou a menina ao hospital. "No hemograma deu que a taxa de hemoglobinas estava muito alta, o que poderia sugerir várias doenças do sangue, entre elas o câncer", afirma. A primeira dificuldade foi encontrar um hematologista pediátrico que fizesse o diagnóstico prontamente, já que, segundo Ana Karine, o número de especialistas na área não chega a 10 em Fortaleza.
"A Yarice não entendia direito o que estava acontecendo. Ela via as crianças em tratamento, muitas já sem cabelo, e eu dizia que ela estava ali porque o tipo de especialista do qual precisava só existia naquele local. Como ela tem o cabelo longo, todo cacheado e é uma das coisas que mais se destacam, as crianças e os pais perguntavam se era a primeira vez dela e eu, cheia de dúvidas, tentava segurar a onda e não chorar", lembra.
Só um dia antes do concurso Yarice foi liberada pela médica e pôde viajar. Na Bahia, ela ficou em segundo lugar geral e conquistou a faixa de Miss Brasil Mirim Beleza Internacional. "Quando voltamos, em setembro, descobrimos que o diagnóstico de câncer havia sido negativo. Em três exames os resultados estavam normais, e ela repetia só para confirmar", diz Ana Karine.
Depois da alta, Yarice Aksa visitou as crianças da APP e já planeja outro encontro, desta vez perto do Natal. "O diagnóstico precoce foi importante para descartar a doença e trazer o alerta para a alimentação, os hábitos em geral. Antes ela se preocupava só com a beleza, agora tem mais consciência de que precisa cuidar da saúde", garante a mãe.
FIQUE POR DENTRO
O que caracteriza os diferentes tipos de câncer
De acordo com o Inca, o câncer corresponde a um conjunto de mais de 100 doenças que têm em comum o crescimento desordenado (maligno) de células que invadem os tecidos e os órgãos e podem se estender para outras regiões do corpo.
Ao dividirem-se rapidamente, essas células tendem a ser muito agressivas e incontroláveis, o que acaba por determinar a formação de tumores (acúmulo de células cancerosas) ou neoplasias (proliferações celulares anormais) malignas. Já um tumor benigno é apenas uma massa localizada de células que se multiplicam vagarosamente e se assemelham ao seu tecido original, raramente constituindo um risco de vida.
O que mais chama atenção, no entanto, são os olhares curiosos que desejam desvendar o mundo e os sorrisos que inundam o ambiente com alegria e esperança. Entre os sonhos e as projeções de um futuro que começa a ser traçado, cada um dos meninos e meninas carrega consigo a força de vontade para superar a doença. Na caminhada rumo à cura, a detecção precoce, a atenção humanizada e o pronto início do tratamento são vitais para alcançar os melhores índices de recuperação.
Novembro Dourado
Por lei, 23 de novembro, próximo sábado, é o Dia Nacional de Combate ao Câncer Infantojuvenil. Este ano, contudo, o mês todo ganhou uma campanha para divulgar a enfermidade à população como um problema de saúde pública, salientando que se trata de uma doença curável: o Novembro Dourado.
"Nós nos inspiramos no Outubro Rosa. É voltada para que possamos ter, em âmbito nacional, uma campanha para o diagnóstico precoce. Há muitas ações de combate ao câncer em adultos no País, mas o Novembro Dourado é importante para que as crianças possam contar com um apoio maior", explica Olga Maia, presidente da APP.
De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), o câncer é a primeira causa de morte por doença na faixa etária de 5 a 19 anos - excluindo-se as causas externas. Entretanto, se há 30 anos a chance de cura era de 15%, hoje passa de 65%, podendo chegar a 85% em alguns casos.
"No Ceará, temos porcentagens semelhantes aos índices nacionais e, atualmente, as crianças são encaminhadas ao hospital em tempos mais curtos, tornando possível um melhor tratamento. Porém, o trabalho de esclarecimento para que isso aconteça deve ser contínuo, pois ainda há muito por fazer", destaca a oncologista pediátrica Nádia Trompieri, coordenadora científica do programa de diagnóstico precoce do núcleo Mais Vida, da Associação Peter Pan.
Como é feito o diagnóstico
O câncer na criança tem apresentação clínica com sinais e sintomas comuns a outras doenças frequentes na infância, o que pode dificultar o diagnóstico. Assim, além dos exames laboratoriais, o estudo de imagem também é determinante para ajudar na detecção precoce da doença.
"A suspeita clínica feita pelo pediatra, o encaminhamento para um Centro de Oncologia e o diagnóstico precoce são essenciais para que a cura seja alcançada", aponta Nádia Trompieri.
Exemplos de vida
A notícia de que a filha Micaeli Lemos, de 13 anos, estava com um Sarcoma de Ewing (tipo de tumor ósseo) representou uma reviravolta na rotina da agricultora Maria Elisângela Lemos. Elas moram em Quixadá, mas, desde fevereiro, quando Micaeli recebeu o diagnóstico precoce, estão em Fortaleza para o tratamento na APP.
"Quando soube, me desesperei. Eu não chorava, gritava em frente ao (Hospital Infantil) Albert Sabin. Ela já fez nove sessões de quimioterapia e faltam outras nove. O médico disse que é um dos tipos de tumores mais agressivos, tanto é que ela fez 28 sessões de radioterapia também", conta.
Desde março, a estudante toma os medicamentos quimioterápicos a cada 21 dias. "No começo, a Micaeli não acreditava. Quando a médica deu o diagnóstico, ela dizia: ´eu não tenho câncer, não me leva para tomar esse remédio, eu não sinto nada´. Realmente, até os efeitos da ´quimio´ aparecerem, ela não tinha sintomas. Hoje ela entende tudo, mas é muito calada. Se estiver sentindo alguma coisa não se queixa de nada. Como mãe, eu que percebo e converso com ela", relata.
Depois de oito meses de tratamento, Elisângela reconhece a importância da detecção do câncer na fase inicial. "Se minha filha não tomasse os medicamentos, com certeza não estaria bem", considera.
A queda dos cabelos, por sua vez, é apenas um detalhe em frente aos muitos sonhos que a adolescente alimenta. "Ela está careca, mas cabelo nasce. O importante é a saúde. A Micaeli tinha um cabelo muito bonito, mas hoje não tem vergonha de andar sem lenço. Ela tenta ser feliz do jeito que Deus quer. É muito estudiosa, uma das melhores alunas da turma, e quer se formar logo", diz a mãe.
O diagnóstico precoce associado ao tratamento especializado também foi significativo para a cura de Charles de Oliveira Bezerra, de 8 anos. Quanto tinha apenas um ano e seis meses, sua mãe, a dona-de-casa Marlene Oliveira, percebeu manchas roxas pelo corpo do filho e a febre, que apareceu em seguida, tornou-se diária. Pouco tempo depois, os exames acusaram leucemia.
"Hoje ele está curado, fez o transplante há dois anos. O doador foi o meu outro filho, de 5 anos, que fez os exames e era compatível. O Charles está bem, é uma criança saudável. Só vai ao hospital da Associação Peter Pan uma vez por mês para fazer exame de sangue e saber como está", conta Marlene.
Quando é negativo
Fazer os exames o quanto antes é o primeiro passo. Faltava uma semana para o grande dia. A ansiedade tomava conta da Miss Ceará Mirim, Yarice Aksa, de 12 anos, que planejava a ida a Salvador para a disputa do título nacional. Às vésperas da viagem, no entanto, ela começou a sentir uma forte dor de cabeça e, após quatro dias com o mesmo quadro, acordou com sangramento no nariz.
A supervisora acadêmica Ana Karine Silva, mãe de Yarice, entrou em alerta e levou a menina ao hospital. "No hemograma deu que a taxa de hemoglobinas estava muito alta, o que poderia sugerir várias doenças do sangue, entre elas o câncer", afirma. A primeira dificuldade foi encontrar um hematologista pediátrico que fizesse o diagnóstico prontamente, já que, segundo Ana Karine, o número de especialistas na área não chega a 10 em Fortaleza.
"A Yarice não entendia direito o que estava acontecendo. Ela via as crianças em tratamento, muitas já sem cabelo, e eu dizia que ela estava ali porque o tipo de especialista do qual precisava só existia naquele local. Como ela tem o cabelo longo, todo cacheado e é uma das coisas que mais se destacam, as crianças e os pais perguntavam se era a primeira vez dela e eu, cheia de dúvidas, tentava segurar a onda e não chorar", lembra.
Só um dia antes do concurso Yarice foi liberada pela médica e pôde viajar. Na Bahia, ela ficou em segundo lugar geral e conquistou a faixa de Miss Brasil Mirim Beleza Internacional. "Quando voltamos, em setembro, descobrimos que o diagnóstico de câncer havia sido negativo. Em três exames os resultados estavam normais, e ela repetia só para confirmar", diz Ana Karine.
Depois da alta, Yarice Aksa visitou as crianças da APP e já planeja outro encontro, desta vez perto do Natal. "O diagnóstico precoce foi importante para descartar a doença e trazer o alerta para a alimentação, os hábitos em geral. Antes ela se preocupava só com a beleza, agora tem mais consciência de que precisa cuidar da saúde", garante a mãe.
FIQUE POR DENTRO
O que caracteriza os diferentes tipos de câncer
De acordo com o Inca, o câncer corresponde a um conjunto de mais de 100 doenças que têm em comum o crescimento desordenado (maligno) de células que invadem os tecidos e os órgãos e podem se estender para outras regiões do corpo.
Ao dividirem-se rapidamente, essas células tendem a ser muito agressivas e incontroláveis, o que acaba por determinar a formação de tumores (acúmulo de células cancerosas) ou neoplasias (proliferações celulares anormais) malignas. Já um tumor benigno é apenas uma massa localizada de células que se multiplicam vagarosamente e se assemelham ao seu tecido original, raramente constituindo um risco de vida.
Os diferentes tipos de câncer correspondem aos vários tipos de células do organismo. Em crianças e adolescentes, os mais comuns são a leucemia (nas células que formam o sangue), o tumor de Wilms (nos rins), o linfoma (nos linfonodos), o neuroblastoma (nas células do sistema nervoso ao longo da coluna vertebral), o rabdomiossarcoma (nas células musculares), os tumores ósseos (como o osteossarcoma e o sarcoma de Ewing) e os tumores germinativos (que podem ser benignos ou malignos).
Diário do Nordeste
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