Testes iniciados na Bélgica em 2012 já levaram ao nascimento de 17 bebês saudáveis |
Pode um kit de fertilização in vitro - técnica para gerar
os chamados bebês de proveta - caber em uma caixa de sapatos? E será que
alguns produtos básicos encontrados na cozinha podem proporcionar
esperança para quem quer ter filhos?
Um sistema simples, que
responde 'sim' a estas perguntas, promete reduzir os custos dos
tratamentos de fertilização e atacar o estigma causado em alguns lugares
pela falta de filhos.
A
sul-africana Nosiphiwo tentou engravidar por anos quando a família de
seu marido pediu seu lobola de volta - o dote pago pela noiva por ocasão
do casamento. Ela foi desprezada por seus sogros por não ter filhos, e
se sentiu excluída do resto da comunidade. Nosiphiwo diz que as mulheres
em sua situação às vezes optam pelo suicído.
"Eu pensei nessa possibilidade. Porque você não tem outra opção."
Laboratórios sofisticados
Os
altos custos do tratamento de fertilização são inalcançáveis para
muitos casais ao redor do mundo. Muitos esgotam seus recursos
financeiros, vendem bens ou contraem dívidas.
Um dos maiores obstáculos é o custo dos laboratórios, complexos e sofisticados, onde os bebês de proveta são fertilizados.
O
obstetra belga Willem Ombelet trabalhou na África do Sul nos anos 1980 e
viu muitos casos como o de Nosiphiwo. Quem não podia pagar pelo
tratamento de fertilização ia ao hospital sob outros pretextos, mas com o
real intuito de buscar soluções para sua infertilidade.
"Eles esperavam de forma tímida no hospital e perguntavam se havia algo que podíamos fazer por eles", conta o obstetra.
Naquela
época, a resposta desoladora era não. Mas desde então, Ombelet fez
campanha para melhorar o acesso global aos tratamentos de infertilidade,
e cofundou a organização sem fins lucrativos The Walking Egg para
aumentar a conscientização sobre fertilidade em países em
desenvolvimento.
Simples meio de transporte
A
missão central da Walking Egg é popularizar um sistema simples de
fertilização do óvulo. As melhores condições para um esperma fertilizar
um óvulo fora do corpo são um ambiente ligeiramente alcalino e uma
temperatura de 37ºC.
Normalmente
essas condições são reproduzidas em laboratórios sofisticados,
equipados com grandes ventiladores, incubadoras complexas, e um estoque
de caros gases.
Mas quando Ombelet conheceu o embriologista
Jonathan Van Blerkon, em 2008, ambos tiveram a ideia de criar um
laboratório barato e portátil. Van Blerkom reviveu a técnica que usou
nos anos 1980, quando transportava embriões de vacas pelo estado
americanos do Nebrasca.
Ao misturar bicarbonato de sódio e ácido
cítrico, ele criou o seu próprio CO2, adicionando-o periodicamente à
solução que continha os embriões para manter níveis ideais de
concentração de CO2 e de alcalinidade.
Caixa de sapatos
Para
ser aplicada em humanos, a técnica precisou ser redefinida a fim de
criar um sistema fechado e assim minimizar qualquer risco de
contaminação.
Quantidades precisas de ácido cítrico e bicarbonato
de sódio são misturadas e um tubo de ensaio. As bolhas de CO2 que a
mistura cria são colocadas através de um tubo em um segundo tubo de
ensaio contendo um meio de cultura para o embrião.
Para manter a
temperatura perfeita para a fertilização do óvulo e o desenvolvimento do
embrião, Van Blerkom testou várias métodos de baixa tecnologia.
"Eu
coloquei os tubos de ensaio em uma garrafa térmica a uma temperatura
alta, e funcionou. Eu os coloquei em um bloco de alumínio para
aquecimento, e também funcionou. Os embriões não se importam se eles
estão em uma incubadora cara ou em uma garrafa térmica."
O óvulo e
o esperma são injetados no tubo de ensaio contendo a cultura média, e
no dia seguinte, busca-se com ajuda do microscópio a presença de um
embrião. Se houver embrião, ele é transferido para o útero da mulher
após seis dias.
O sistema simplificado substitui o laboratório por
um bloco aquecido de alumínio contendo um par de tubos de ensaio para
cada embrião - tudo dentro de um recipiente do tamanho de uma caixa de
sapatos.
Por segurança, os testes humanos do sistema foram
conduzidos dentro de um laboratório estéril. Os cientistas estão
desenvolvendo uma unidade auto-suficiente para guardar o sistema em
hospitais ou centros de saúde que não têm laboratórios avançados.
"Qualidade do embrião"
Os testes que começaram
em Genk, na Bélgica, em 2012, já levaram ao nascimento de 17 bebês
saudáveis. Ombelet diz que a fertilização e as taxas de gravidez são
semelhantes aos métodos caros de fertilização in vitro.
"Provamos que com o nosso sistema a qualidade do embrião é pelo menos tão boa quanto a da fertilização in vitro comum."
Geoffrey
Trew, consultor em medicina reprodutiva e cirurgias no Hospital de
Hammersmith, em Londres, que está envolvido com a pesquisa, concorda.
Mas ele observa que o sistema funcionou em um país desenvolvido. "Agora
precisamos ver se funcionará tão bem em países em desenvolvimento, onde
as condições são mais instáveis."
Testes estão previstos para
acontecer na África do Sul e na Grã-Bretanha no final deste ano. A
equipe acredita que até o início do ano que vem o sistema poderá ser
testado em lugares com menos recursos.
Baixo custo
Cada
ciclo de fertilização in vitro usando o sistema custa menos de 200
euros (cerca de R$ 600), sem incluir pessoal e custos com medicamentos,
que variam de país para país. Mas Ombelet diz que eles podem diminuir o
preço normal da fertilização em qualquer país em 70-80%.
"Com
doses de baixas de medicamentos, esperamos levar a fertilização para
países em desenvolvimento por menos de 500 euros (cerca de R$1,500)."
Thinus
Kruger e Matseseng são especialistas em fertilização do Hospital
Tygerberg, na Cidade do Cabo. São responsáveis por um programa especial
de fertilização que reduz custos com medicamentos e pessoal.
Nosiphiwo
foi uma das muitas mulheres que receberam ajuda desse programa para
engravidar. Agora eles querem ver como o sistema da Walking Egg pode ser
comparada ao procedimento em seu laboratório.
"É realmente
teoricamente incrível", diz Kruger. "Mas precisamos ver como paciente e
cientista se comportam com esse sistema. É um pequeno laboratório, por
isso você precisa do conhecimento para tratar com pequenos embriões."
Van
Blerkom acredita que os esforços para diminuir os custos com o
tratamento de fertilidade agradariam o pioneiro em fertilização in vitro
Robert Edwards, cujo trabalho resultou no nascimento do primeiro bebê
de proveta, Louise Brown.
"Bob Edwards acreditava que a
fertilização in vitro deveria ser universal, porque ele sabia do
sofrimento que a infertilidade causa."
BBC Brasil
Nenhum comentário:
Postar um comentário