Método proposto por grupo internacional de cientistas identifica se o medicamento funciona a partir da ação em proteína que regula os circuitos cerebrais. A técnica permitirá que pacientes recebam um tratamento mais personalizado
Saber se um paciente vai responder de forma positiva a determinado medicamento intriga médicos e cientistas. Por isso, há muitas pesquisas focadas em desenvolver métodos mais personalizados de tratamento. Nessa linha, cientistas suecos e alemães resolveram investigar como os antidepressivos agem no cérebro.
O grupo realizou experimentos em ratos e em humanos com uma droga muito utilizada no combate à depressão, a paroxetina. Conseguiram determinar uma proteína importante para a eficácia do remédio. E o melhor: esse biomarcador pode ser detectado em um exame de sangue. Detalhes do achado foram publicados recentemente na revista Science Sginaling.
A equipe utilizou como base informações já conhecidas na área psiquiátrica, como a ligação da depressão e de outros transtornos mentais com desequilíbrios na metilação do DNA — responsável pela ativação ou pela desativação de genes — que podem afetar o fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF, pela sigla em inglês).
O BDNF é uma molécula que regula os circuitos cerebrais envolvidos na aprendizagem, na memória e em formas de como lidar com o estresse. Desajustado, pode provocar as enfermidades.
Gustavo Guida, geneticista do Laboratório Exame de Brasília, explica que os distúrbios psiquiátricos estão ligados aos neurotransmissores e o que mais interfere no funcionamento deles são os padrões de metilação. “Por causa disso, a necessidade de saber o mecanismo exato envolvido nisso para encontrar um remédio que possa transferir a função de um gene”, diz.
Ao analisar a ação da paroxetina, os cientistas observaram que o medicamento estimula um par de proteínas chamadas FKBP51, conhecidas por influenciar a resposta ao estresse, diminuindo a atividade da DNMT1, uma enzima responsável pela metilação do DNA. Dessa forma, aumenta-se a expressão do BNDF, desregulando os circuitos cerebrais. “O nosso trabalho mostrou que os antidepressivos diminuíram a atividade de DNMT1, e que os efeitos do antidepressivo dependem de como age a proteína FKBP51”, destacou ao Correio Theo Rein, um dos autores do estudo e pesquisador do Instituto de Psiquiatria Max Planck, na Alemanha.
Com as novas informações, os cientistas acreditam que seria mais fácil observar a proteína reguladora de DNMT1 de cada paciente a fim de saber se o remédio provocará o efeito esperado. “A mudança de BDNF e de DNMT1 poderia ser monitorada diretamente nas células em cultura do paciente; e, paralelamente, alterações podem ser feitas de acordo com a classificação da depressão”, cogita o autor.
Segundo Guida, a nova pesquisa trata de um tema que tem sido bastante explorado na área médica. “Os estudos têm se voltado a descobrir qual o caminho celular gerado por esses remédios, já que, com ele, pode-se identificar se é possível reagir pior ou melhor”, explica. “Eles observaram que, de acordo com o aumento ou a diminuição da expressão das proteínas, dá para ter atividades distintas de DNMTI e, consequentemente, de BNDF, que está associado ao aumento de eficácia do remédio”, completa.
O geneticista reforça ainda que novos testes como o descrito na Science Sginaling podem ajudar a otimizar o tratamento de pacientes com problemas psiquiátricos. “Existem algumas dificuldades de ajustar tratamentos para uma parcela de pacientes. Pode-se levar de três a quatro meses para mudar um remédio que não responde de forma esperada ou para ajustar a dose. Em doenças como a depressão, essa demora se torna um fator muito prejudicial”, destaca.
Casos específicos
Frederico Duarte Garcia, professor do Departamento de Saúde Mental da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), destaca que a busca por exames que avaliem o desempenho de remédios psiquiátricos tem sido útil para uma parcela diferenciada de pacientes. “Temos pessoas que sofrem com o que chamados de depressão resistente ou refratária. Ao usar dois até três tipos de remédios, não respondem da maneira esperada. E isso se deve a vários fatores, como a ausência de receptores que reconheçam o medicamento, porque o fígado elimina rápido as substâncias ou até por complicações com outras drogas usadas no mesmo período.”
O especialista, porém, observa que, apesar de os testes de sangue serem de grande ajuda, a ferramenta tem um custo alto. “É um avanço muito bem-vindo, mas que ainda não foi muito explorado devido ao preço expressivo. Testes semelhantes a esse, que avaliam o sangue ou a saliva dos pacientes, custam cerca de R$ 6 mil e nem todos os pacientes precisariam desse exame”, opina.
Os pesquisadores acreditam que também será possível desenvolver testes mais personalizados que englobem outros tipos de antidepressivos. “Pretendemos ampliar a amostra de pacientes, se houver recursos disponíveis, para, desse modo, conseguir diferenciar entre os diferentes tratamentos medicamentosos. Além disso, os inibidores DNMT1 devem ser testados”, adiantou Rein.
Foto: Reprodução
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Correio Braziliense
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