No Brasil, dor nas costas é a terceira causa de aposentadoria. Terapia criada em Fortaleza beneficia pacientes
Belo Horizonte — Já sentiu dor na coluna? É bem provável que a maioria dos leitores responda que sim. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 80% da população terão pelo menos um episódio durante a vida, o que faz com que essa seja a queixa mais frequente ouvida pelos ortopedistas. Má postura, sedentarismo e histórico familiar estão entre os principais fatores de risco, além do aumento da expectativa de vida, já que a chance é três vezes maior com a idade avançada.
A dor na coluna pode estar associada a doenças degenerativas, como a hérnia de disco, a mais comum, que acomete 5,5 milhões de brasileiros, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Por algum motivo, a parte central do disco que fica entre as vértebras desloca-se e provoca a compressão da raiz nervosa, levando à dor. Outros exemplos são a espondilolise, que é uma falha na vértebra; a artrose, provocada por um processo de envelhecimento da cartilagem; e a estenose, caracterizada pelo estreitamento do canal vertebral. Quando surge com febre, dor noturna, perda de peso e histórico de câncer, a dor na coluna pode indicar a existência de tumor ou infecção.
Uma causa comum é a distensão muscular, que atinge principalmente a região lombar, por ela ter mais mobilidade e estar ligada à sustentação do corpo. Apesar de ser corriqueira, em 85% dos casos a dor na coluna não tem um motivo específico. É o que diz o médico do Instituto Mineiro de Ortopedia e Traumatologia (Imot) Rodrigo D’Alessandro de Macedo. “O bom é que a maioria dos pacientes, mesmo sem diagnóstico, tem melhora com medidas simples, como atividade física e fisioterapia, e deixa de sentir os sintomas em três meses”, afirma.
Sorrateira
A altura não ajuda, muito menos a profissão. Com 1,98m, o piloto comercial Paulo Augusto Ferreira Sampaio, 37 anos, luta há dois com uma dor na coluna. Como trabalha sentado o dia todo, em ambiente pressurizado, carrega mala de um lado para o outro, cada noite dorme em um colchão diferente e não tem tempo para praticar exercício regularmente, achava normal sentir o incômodo. Até que um dia não conseguiu levantar da cama e descobriu que tinha três protusões discais na coluna vertebral, estágio anterior à hérnia de disco.
O piloto se livrou da dor com a reconstrução musculoarticular, tratamento que já beneficiou três mil pacientes em todo o país. Vindo de Fortaleza (CE), o programa de reabilitação baseado em técnicas de fisioterapia também é aplicado em outras capitais, como Belo Horizonte, Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador. “O objetivo é ganhar mobilidade das articulações e melhorar a flexibilidade muscular, levando ao alívio da dor”, explica o fisioterapeuta Felipe Augusto Pimenta Moraes, do Centro de Reabilitação FortaleSer, unidade do Instituto de Tratamento da Coluna Vertebral em Belo Horizonte (ITC).
Tratamento
Dividido em cinco etapas, o tratamento dura, em média, dois meses. Para começar, a fisioterapia manual, utilizada para manipular as articulações, seguida pela mesa de tração eletrônica, na qual o paciente permanece deitado de barriga para cima e é puxado por uma corda em direção ao aparelho. “O pinçamento da raiz nervosa gera um processo inflamatório, que é a neuropatia. A mesa é usada para aumentar o espaço entre as vértebras, que fica diminuído com a degeneração ou o desgaste articular, para que o disco pare de encostar na raiz nervosa, aumentando o metabolismo no local e estimulando a cicatrização”, esclarece Moraes.
Na sequência, o paciente deita de barriga para baixo na mesa de flexão-descompressão, cujo objetivo é realinhar a coluna vertebral com o movimento das pernas. A estabilização vertebral, pensada para trabalhar a musculatura interna que envolve a coluna, é a base da próxima etapa. Com uma bolsa inflável, a pessoa que sofre com a dor aprende a controlar a contração muscular.
“Fortalecer a musculatura que envolve o tronco, tanto abdominal quanto de quadril e pelve, é necessário para a proteção da coluna e, consequentemente, ganho de estabilidade. A estrutura estável sustenta melhor a articulação”, diz o fisioterapeuta do ITC Vertebral. O treino é fundamental para o último passo, em que o paciente é inserido em programa de atividade física.
A prática regular de exercício é considerada a etapa mais importante, segundo Felipe Moraes, pois é o que vai manter os benefícios do tratamento. “Quem tem problema de coluna deve se preocupar o resto da vida com seu fortalecimento, fazendo programa de atividade física. As mais indicadas são musculação e pilates”, pontua o fisioterapeuta.
Até pacientes graves costumam alcançar resultado satisfatório e deixam de passar por cirurgia — que deve ser a última opção. De acordo com o ortopedista Rodrigo D’Alessandro de Macedo, estudos europeus apontam que a operação não dá resultado melhor que a fisioterapia no caso de lombalgia inespecífica, em que a causa não é identificada. O médico acredita que o tratamento é como uma escada: deve-se subir aos poucos os degraus. Primeiro, tenta-se aliviar a dor com remédios; depois, com fisioterapia; e, se for preciso, passa-se para o bloqueio — injeção de anestésico no ponto doloroso. Para Macedo, cirurgia, só em caso extremo. “Você consegue ter melhora se tiver motivação para mudar o estilo de vida com a atividade física.”
Mesmo sem rotina fixa de trabalho, o piloto Paulo Sampaio encontra tempo para se dedicar à coluna. Pelo menos duas vezes por semana, dá continuidade ao tratamento. “Isso mostra que até um piloto de avião com a escala mais apertada do mundo consegue fazer”, conclui. Como recompensa, ele ganhou mais disposição e bom humor. E menos dor.
Fonte Correio Braziliense
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