Ze Carlos Barretta/Folhapress Wilker Vilela, 12, encena peça musical no teatro Dias Gomes, em SP |
Wilker é um dos 21 jovens do projeto Aut, que busca, por meio do teatro,
ajudar crianças com autismo a melhorar suas habilidades sociais e a superar
dificuldades de comunicação.
"Para ser um ator é necessário se expor ao público, esperar a vez de entrar,
interagir, passar um certo charme. Tudo o que uma criança com autismo não tem",
diz a neuropsicóloga Tatiane Ribeiro, que montou o projeto com a ajuda da também
especialista em neuropsicologia Liège Felício, da fonoaudióloga Lais Mazzega e
do diretor Deto Montenegro.
Depois de um ano de ensaios semanais, a estreia do musical teatral aconteceu
no mês passado, no teatro Dias Gomes, em São Paulo.
No início, conta Ribeiro, os jovens não olhavam uns para os outros, apenas
para baixo. O som alto, o ambiente apertado da coxia e a expressão das emoções
em cada fala foram dificuldades superadas pelos agora atores.
Apesar de o objetivo inicial não ter sido uma terapia formal, as aulas de
teatro acabaram dando resultados. A melhora na empatia dos jovens será medida
por testes.
Esse tipo de atividade em grupo tem sido cada vez mais procurada pelos pais
das crianças com autismo, segundo a psicóloga Roberta Marcello, diretora do
instituto Priorit, no Rio.
"O foco é estimular a troca social das crianças", diz ela. Entre as
atividades oferecidas na Priorit, especializada no tratamento de crianças com
autismo e deficit de atenção, estão a capoeira, o judô, o canto e o desenho,
indicadas a partir dos quatro anos de idade e realizadas com terapeutas que as
adaptam à realidade do transtorno.
Segundo a psicóloga, muitos pais buscavam essas atividades em escolas
normais, mas as crianças não conseguiam se adequar.
"É importante não só contornar as dificuldades da criança mas estimular suas
habilidades", diz Marcello.
Segundo a psicóloga Caia Pacífico, colaboradora no Ambulatório de Autismo do
IPq (Instituto de Psiquiatria) da USP, essas atividades não podem ser
consideradas terapias, pois carecem de evidências científicas, "mas podem ter
caráter terapêutico, na medida em que favorecem uma interação com o outro".
Terapias
Entre os tratamentos individuais do autismo, destacam-se as terapias
comportamentais e a psicanálise, sendo que a última tem sido alvo de críticas
pela alegada falta de estudos científicos que comprovem seus resultados.
O método ABA (análise aplicada do comportamento, em inglês), usado desde a
década de 1960, baseia-se em programas estruturados sob a ideia de um comando,
um comportamento resultante (reação ou falta de reação) e uma consequência, como
a recompensa por um comportamento desejado, explica a psicóloga comportamental
Cláudia Romano, diretora do grupo Gradual.
"Há programas para desenvolver a sociabilidade, treinar o uso do banheiro,
para alfabetização, linguagem etc.", completa Pacífico.
Já o Teacch (Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Deficits
relacionados com a Comunicação), desenvolvido no início dos anos 1970, usa
estímulos visuais, como figuras, e corporais, como gestos, para a comunicação.
A psicanálise, por outro lado, não se concentra nos sintomas. Segundo Vera
Regina Fonseca, diretora científica da Sociedade Brasileira de Psicanálise, o
método busca a superação das dificuldades de relacionamento da criança por meio
de jogos e da participação ativa do analista, como objeto de desenvolvimento da
criança.
O objetivo é que ela consiga compartilhar emoções e compreender o que outras
pessoas estão sentindo.
"Buscamos identificar quem a criança é, e não como gostaríamos que ela fosse.
As outras terapias têm uma ideia de como a criança deve ser."
O Centro de Educação Terapêutica Lugar de Vida, em São Paulo, usa uma
abordagem que mescla a psicanálise com a educação e também as atividades em
grupo.
"Partimos da ideia de que a educação constrói a subjetividade e molda um modo
de ser e como a criança se relaciona com os outros", diz Maria Cristina Kupfer,
uma das fundadoras da instituição.
Uma característica do local são os grupos de educação terapêutica. "Formamos
minigrupos com crianças com diferentes dificuldades, formando uma pequena
experiência do que seria uma socialização de fato", diz Cristina Keiko, do
conselho administrativo da instituição. Entre as atividades propostas estão
oficinas de música, de cozinha e de escrita.
Maria Eugênia Pesaro, também da Lugar de Vida, diz que há uma busca por dar
voz à criança autista: "Isso não significa que ela tenha de falar, o objetivo é
que o que quer que a criança produza, seja fala, seja outro meio de expressão,
tenha a ver com querer estar com o outro."
Editoria de Arte/Folhapress
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Fonte Folhaonline
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