Dispositivo ajuda a salvar bebês presos no canal de parto |
O argentino Odón, que tem 59 anos e é mecânico de automóveis, construiu o primeiro protótipo de seu dispositivo na cozinha de sua casa, usando um vidro como modelo do útero, a boneca de sua filha no lugar do bebê preso no canal e uma bolsa e manga de tecido costuradas por sua mulher como instrumento que salvaria a vida do bebê. Por mais improvável que possa parecer, a ideia ganhou o endosso da Organização Mundial de Saúde, e uma empresa americana de tecnologia médica acaba de obter a licença para produzir o dispositivo.
Com o Instrumento Odón, um assistente desliza um saco plástico dentro de uma manga plástica lubrificada, posicionando-o em volta da cabeça do bebê, infla o saco, para que agarre a cabeça, e puxa o saco até o bebê emergir do canal. Médicos dizem que o instrumento tem potencial enorme para salvar bebês em países pobres e, possivelmente, reduzir os partos por cesárea em países ricos.
De acordo com o médico Mario Merialdi, da OMS, complicações potencialmente graves ocorrem em 10% dos 137 milhões de partos realizados anualmente em todo o mundo. Mais ou menos 5,6 milhões de bebês nascem mortos ou morrem pouco depois de nascer, e 260 mil mulheres morrem ao dar à luz. A obstrução do trabalho de parto, que pode ocorrer quando a cabeça do bebê é grande demais ou quando a mãe está exausta e para de ter contrações, é um fator importante nessas mortes.
Nos países ricos, o sofrimento fetal resulta numa corrida para a sala de cirurgia. Mas em clínicas médicas pobres em áreas rurais, disse Merialdi, "se o bebê não sai, a mulher não tem a quem recorrer". As opções usadas hoje em casos desse tipo são o fórceps -uma espécie de tenaz grande e arredondada- ou a extração por vácuo, com ventosas colocadas sobre o couro cabeludo da criança. Quando usados por pessoas não treinadas, esses métodos podem provocar hemorragias, esmagar a cabeça do bebê ou torcer a espinha dele.
O dispositivo de Odón será manufaturado pela Beckton, Dickinson and Company, ou BD, de Nova Jersey. "Minha primeira reação, assim que vi o dispositivo, foi positiva", contou Gary M. Cohen, vice-presidente-executivo do setor de saúde global da BD. Foi no Fórum Econômico Mundial, em Davos, Suíça, onde Merialdi lhe pediu que estudasse a possibilidade de produzir o instrumento.
O dispositivo já foi testado em 30 mulheres argentinas. Todas estavam em hospitais, já tinham dado à luz antes e apresentavam trabalho de parto normal. Agora a OMS vai supervisionar ensaios com outras mulheres.
Odón contou que, sete anos atrás, funcionários dele estavam imitando um vídeo mostrando que é possível recuperar uma rolha empurrada para dentro de uma garrafa vazia, inserindo na garrafa um saco plástico de supermercado, soprando o saco até ele envolver a rolha e então puxando-o para fora.
Às 4h da manhã ele acordou sua mulher e lhe contou a ideia que tinha acabado de ter. Odón recorda: "Ela disse que eu estava maluco e voltou a dormir". Na manhã seguinte, um amigo o apresentou a um obstetra.
O médico o incentivou, e ele continuou a trabalhar sobre a ideia. O saco costurado por sua mulher deu lugar a um saco de polietileno, e um útero de plástico tomou o lugar do vidro.
Com a ajuda de um primo, Odón foi apresentado ao diretor de obstetrícia de um grande hospital de Buenos Aires. O diretor tinha um amigo na OMS que conhecia o Dr. Merialdi. Numa conferência médica realizada na Argentina em 2008, Merialdi reservou dez minutos para falar com Odón durante uma pausa para um café. O encontro acabou durando duas horas.
Desde então, Odón continuou a aperfeiçoar o dispositivo, patenteando cada modificação para que possa receber royalties em algum momento. Cohen disse que ainda é cedo para saber quanto a BD cobrará pelo instrumento, mas cada um deve custar menos de US$ 50 para ser fabricado.
Merialdi disse ser a favor da ideia ter fins levemente lucrativos, porque já viu outras ideias com potencial de salvar vidas ter dificuldade em ser concretizadas por falta desse elemento, como as injeções de sulfato de magnésio, que previnem a eclampsia fatal, e os corticosteróides, que aceleram o desenvolvimento dos pulmões de bebês prematuros.
Folhaonline
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