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terça-feira, 22 de novembro de 2011

Músico com memória de 10s após infecção surpreende ciência

Cientistas creem ter explicação para fato de pessoas com amnésia continuarem com memória musical intacta.

Cientistas creem estar perto de descobrir por que uma pessoa que sofre de amnésia e perde a memória de quase tudo na sua vida consegue ainda reter conhecimentos musicais.

A resposta pode estar no fato de que as memórias musicais são armazenadas em partes diferentes do cérebro que a de outras memórias.

Quando o maestro britânico Clive Wearing contraiu uma infecção no cérebro em 1985 - uma encefalite por herpes - ficou com uma capacidade de recordar apenas os eventos ocorridos 10 segundos antes. A infecção danificou uma parte do seu cérebro conhecida como lobo temporal médio.

Embora apresentasse um dos casos mais graves de amnésia conhecido pelos cientistas, a habilidade musical do condutor permaneceu intacta. Hoje com 73 anos, Wearing consegue ler partitura e tocar música no piano, e chegou inclusive a reger seu antigo coral.

Em um congresso da Sociedade para a Neurociência realizado neste mês em Washington, um grupo de cientistas alemães descreveu o caso de um violoncelista profissional - identificado apenas como PM - que contraiu encefalite por herpes em 2005.

Incapaz de recordar as coisas mais simples - como a imagem de sua própria casa -, PM manteve intacta a sua memória musical.

Anatomia do cérebro
Segundo o médico que estudou o paciente, Carsten Finke, do Hospital Universitário de Charite, em Berlim, o lobo temporal médio do cérebro, severamente afetado em casos de encefalite por herpes, é "altamente relevante" para a memória de eventos e como, onde e quando eles ocorrem.

"Mas estes casos sugerem que a memória musical pode ser armazenada de forma independente do lobo temporal médio", afirma o dr. Finke.

A equipe de cientistas alemães também estudou o caso de um paciente canadense nos anos 1990 que perdeu toda a sua memória musical após uma cirurgia que danificou especificamente uma parte do cérebro chamada de giro temporal superior.

O caso levou a equipe a sugerir que as estruturas do cérebro usadas para armazenar memória musical "devem ser o giro temporal superior ou os lobos frontais".

Entretanto, o médico acredita que são necessárias novas pesquisas para confirmar a hipótese.

"O que é realmente novo nesses casos é que mesmo em casos de amnésia densa e grave ainda existem ilhas de memória intactas, a memória musical", afirmou.

"Esta memória pode ser usada como um ponto de acesso a esses pacientes. Podemos pensar, por exemplo, em relacionar música a atividades específicas, como tomar medicação, ou submetê-los a musicoterapia para recuperar qualidade de vida."

Velhos hábitos
A neuropsicóloga Clare Ramsden ressalta que a memória musical é diferente dos outros tipos de memória. "Não é apenas conhecimento, é algo que você faz", define.

A sua entidade, Brain Injures Rehabilitation, voltada para a reabilitação cerebral, estudou os casos de três músicos, incluindo Clive Wearing. As conclusões mostram que as atividades musicais envolvem diferentes partes do cérebro.

"Nossa pesquisa está começando a mostrar que as pessoas com dano nos lobos frontais têm suas habilidades musicais afetadas de forma diferente de pessoas como Clive, cujos lobos temporais médios foram danificados", disse Ramsden.

"Clive ainda consegue ler partituras e tocar música. As pessoas com danos nos lobos frontais podem ter dificuldades de ler uma partitura e tocar uma música pela primeira vez, mas são boas em músicas que elas já sabem."

Para o professor Alan Baddeley, autor de estudos sobre Wearing pela Universidade de York, todos os casos "mostram que a memória não é unitária" e que "há mais de um tipo de memória".

"A amnésia não destroi hábitos, mas os pacientes perdem a capacidade de adquirir e reter informação sobre novos eventos."

Handel
A esposa de Clive, Deborah, é autora de um livro, Forever Today ("Para sempre hoje", em tradução livre), que relata como a vida do casal mudou desde a amnésia do marido.

"Mesmo tendo um piano no quarto há 26 anos, ele não sabe disso até que o instrumento seja mostrado para ele", contou Deborah à BBC.

Entretanto, diz, "se você der para ele uma música nova, a visão dele percebe a partitura e ele toca a música no piano, mas sem aprendê-la".

"Clive não sabe que tocava piano, nem que ainda sabe como tocar."

A esposa diz que, mesmo sem saber, o ex-maestro melhora sua apresentação cada vez que toca uma determinada música, e que ele ainda é capaz de tocar, instintivamente, canções que sabia de cor no passado.

"Ele aprendeu "Messias" de Handel quando era criança e ainda sabe cantá-la."

Deborah diz que a música "é o único lugar onde podemos estar juntos, porque enquanto a música está tocando ele é completamente si mesmo".

"Quando a música para, ele volta a cair do abismo. Não sabe nada sobre sua vida. Não sabe nada do que aconteceu com ele em toda sua vida.

Fonte Estadão

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