Pesquisas científicas começam a desafiar consensos médicos ao apostarem em duas estratégias para combater as reações alérgicas
Pesquisas publicadas nos últimos meses apontam a dessensibilização como a estratégia mais promissora para o tratamento de alergias alimentares. O objetivo é fazer com que o corpo se “acostume” à substância causadora da alergia. Além disso, cientistas também começam a desafiar consensos, como a conveniência de não se expor crianças até os dois anos a alimentos associados a reações alérgicas.
Pelo menos três trabalhos, divulgados em revistas científicas importantes, apontaram a eficácia da dessensibilização - também chamada imunoterapia oral. Pesquisa da Universidade de Cambridge mostrou que 22 crianças alérgicas a amendoim que comeram doses controladas e progressivamente maiores de farinha de amendoim durante 30 semanas tiveram um aumento de mil vezes na tolerância média ao alimento -o suficiente para evitar complicações de saúde mais graves em caso de ingestão acidental.
Um trabalho da Universidade Duke mostrou que, quando 16 crianças alérgicas submetidas previamente à imunoterapia oral comiam 20 amendoins, só uma apresentava reação. Uma pesquisa da Faculdade de Medicina Mount Sinai, em Nova York, conseguiu resultados parecidos para derivados de leite.
A Iniciativa para Alergia Alimentar (FAI, na sigla em inglês), uma organização não-governamental, reuniu 40 alergistas em Nova York para discutir qual é a melhor opção de tratamento.
Segundo Mary Jane Marchisotto, diretora-executiva da FAI, o consenso provisório favorece a imunoterapia oral. Mas, como faltam testes de larga escala, não há nenhum regime aprovado por agências reguladoras. Por isso, a FAI está levantando fundos para um teste clínico de fase 3 com centenas de pessoas. As primeiras alternativas devem chegar ao mercado em sete anos.
Ana Paula Moschione Castro, diretora da Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia (Asbai), afirma que a técnica está sendo estudada no País. “Muitas vezes, não se consegue curar completamente a alergia”, pondera Ana Paula. “Mas as reações tornam-se bem mais leves, o que é importantíssimo para evitar que o pacientes coloque sua vida em risco ao comer, sem saber, algum ingrediente perigoso.”
Restrições. A bancária Sandra Guerino recorda que seu filho Rafael teve a primeira reação alérgica com um mês de idade. Ele estava no hospital tratando-se de uma virose. Os médicos decidiram a alimentação com mamadeira. A reação alérgica foi fulminante. “Por sorte, já estava internado e conseguiram reverter o quadro”, lembra Sandra.
Hoje, Rafael, com 8 anos, já está acostumado a um cotidiano que proíbe os menores traços de leite de vaca na dieta. Mas, mesmo com todo o cuidado, já teve surpresas desagradáveis. Um macarrão - que teoricamente não tinha leite na sua formulação - e uma mortadela já surpreenderam Sandra. Rafael agora está participando de um processo de dessensibilização para prevenir novos sustos.
Antonio Carlos Pastorino, do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da USP, que conduz pesquisas sobre o tema, explica que a dessensibilização não será uma terapia universal para qualquer alergia alimentar, mas ajudará principalmente quem tem um risco mais elevado de reações graves.
Wesley Burks, diretor do grupo responsável pelo trabalho da Universidade Duke, sublinha que a dessensibilização só deve ser feita dentro da estrita supervisão de um teste clínico, pois há riscos de efeitos adversos. “É uma má ideia os pais tentarem fazer algo parecido sozinhos em casa”, alerta o pesquisador.
Fonte Estadão
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