
Por mais bem intencionada que uma organização possa ser ao implementar políticas de gestão da saúde, há uma barreira muito difícil de vencer: a resistência dos próprios funcionários. Uma vez que não se trata de impor obrigações – e fazê-lo pode ser justamente o caminho mais curto para o fracasso -, convencer os colaboradores a efetivamente adotarem hábitos mais saudáveis, reduzindo por consequência as despesas corporativas com saúde, pode ser um desafio gigantesco.
É preciso antes de tudo entender que um programa deste tipo precisa considerar, entre os indivíduos, diferentes estágios de propensão à mudança. Se em uma ponta estão aqueles resistentes à ideia de abandonar o cigarro, se alimentar melhor ou praticar exercícios, na outra estão os doentes crônicos buscando formas de aliviar a dor, ou então atletas amadores que precisam apenas manter os bons hábitos já adotados.
Lidar com essa multiplicidade de perfis é justamente o objetivo do modelo transteórico de mudança de comportamento, idealizado pelo norte-americano James Prochaska. Professor de psicologia comportamental e diretor do Centro de Pesquisa em Prevenção do Câncer da Universidade de Rhode Island, nos EUA, o especialista esteve no Brasil em setembro* para uma palestra sobre o TTM (sigla em inglês para o Transtheoretical Model of Behavior Change).
“Se realmente queremos mudar o sistema de saúde temos que tirar a doença do centro, não só em termos de prevenção, mas também de gestão”, explicou o psicólogo a uma plateia formada principalmente por profissionais de recursos humanos. Nos EUA, segundo ele, cerca de 60% do montante gasto pelas empresas com a saúde de seus colaboradores é consequência direta de comportamentos de risco.
Evitar o agravamento deste quadro é justamente o objetivo do TTM, consagrado no livro Mudar para Melhor (no original, Changing for Good), obra mais conhecida de Prochaska – autor e coautor de mais de 250 publicações defendendo o método, que vem sendo aprimorado desde o fim da década de 1970. O modelo busca fazer uma leitura da propensão que cada indivíduo tem para adotar um comportamento mais saudável, provendo assim estratégias para fazê-lo migrar entre os chamados “estágios de mudança” .
E não se trata apenas de tabaco, gordura ou sedentarismo. Segundo Prochaska, os maiores índices de sucesso do método são observáveis na prevenção da depressão e no gerenciamento do estresse. Os resultados também são positivos para pessoas com doenças crônicas. “Os números [obtidos por meio do estudo] podem ser trabalhados para prevenção e gestão de condições clínicas. Queremos que os gestores sejam capazes de fazer benchmarking”, afirmou o autor.
Combater estes males ganha particular importância em nossos tempos. Desde a Grande Depressão de 1929 as pessoas nunca sofreram tanto nos EUA, apontou Prochaska. A crise econômica, aliada ao impulso de satisfação por meio do consumo, levou a um quadro de depressão endêmica no país.
Observações feitas em um grupo de adultos americanos no estágio conhecido como Preparação, após 18 meses de intervenção seguindo o modelo TTM, mostraram que 62% deles foram capazes de gerenciar seus níveis de estresse. Pacientes com depressão grave ou moderada (classificados no estágio de Contemplação ou Pré-contemplação) inseridos no programa responderam melhor ao tratamento. Aqueles com a doença em estágio inicial evitaram a evolução da doença.
Apesar dos números positivos, não são poucos as controvérsias sobre o método criado por Prochaska. Estudiosos questionam a metodologia para medição dos resultados, e alegam que os mecanismos de intervenção para mudança comportamental podem não produzir os resultados esperados. Para o psicólogo, no entanto, os resultados são corretos e contrariam interesses poderosos. “A indústria farmacêutica raramente investe em mudanças. Se eles tem um medicamento para tratar o problema, vão lançá-lo”, salientou.
Papel das empresas
“Como a maioria das pessoas não está pronta para tomar uma atitude, elas precisam ser empurradas”, sentenciou o psicólogo aos gestores que acompanharam sua palestra. A posição é compartilhada pela endocrinologista e líder da área de clientes da AxisMed, Ana Cláudia Rocha Pinto. A empresa do grupo Telefônica utiliza o modelo de Prochaska na prestação de serviços de saúde preventiva.
“Como a maioria das pessoas não está pronta para tomar uma atitude, elas precisam ser empurradas”, sentenciou o psicólogo aos gestores que acompanharam sua palestra. A posição é compartilhada pela endocrinologista e líder da área de clientes da AxisMed, Ana Cláudia Rocha Pinto. A empresa do grupo Telefônica utiliza o modelo de Prochaska na prestação de serviços de saúde preventiva.
Para a médica, trata-se de um desafio antigo, porém urgente. “Pessoas ainda morrem por questão de comportamento, e os custos estão galopantes. As empresas não estão atingindo os resultados que gostariam”, refletiu a gestora, chamando atenção para a necessidade de novas abordagens diante do alto índice de doenças crônicas e da baixa aderência dos pacientes às recomendações médicas.
Os impactos estratégicos deste cenário sobre as empresas é um desafio. Como controlar os custos se boa parte deles é indireto e difícil de calcular? O emprego massivo da tecnologia pode ser a resposta.
“Há evidências de que a telemedicina e as tecnologias associadas podem trazer resultados positivos. Já existem uma série de aplicativos móveis que as pessoas usam para melhorar suas vidas. É um novo paciente, que se responsabiliza e tem independência, e que certamente vai precisar de um novo sistema de saúde”, ponderou Ana Cláudia.
O que se sabe sobre esse sistema, reiterou o presidente da Axismed, Fábio de Souza Abreu, parafraseando Prochaska, é que “o paciente estará no centro, e não as doenças”. As empresas, neste contexto, podem ser um agente de mudança importante na medida em que, na busca pela redução do absenteísmo, adquirem consciência sobre a gestão da saúde populacional. “São essas pessoas que vão promover as mudanças”, apontou o CEO, referindo-se aos profissionais de recursos humanos.
Conheça os estágios do método de James Prochaska:
1. Pré-contemplação, ou não pronto:
Pessoas que não pretendem tomar uma atitude em um futuro próximo, e não acreditam que seu comportamento atual possa ser um problema;
Pessoas que não pretendem tomar uma atitude em um futuro próximo, e não acreditam que seu comportamento atual possa ser um problema;
2. Contemplação, ou ficando pronto:
Nesse estágio o indivíduo reconhece que tem um comportamento problemático, e começa a pensar sobre prós e contras de suas ações;
Nesse estágio o indivíduo reconhece que tem um comportamento problemático, e começa a pensar sobre prós e contras de suas ações;
3. Preparação, ou pronto:
Quando a pessoa pretende tomar uma atitude em um futuro imediato, e já está caminhando rumo a uma mudança concreta;
Quando a pessoa pretende tomar uma atitude em um futuro imediato, e já está caminhando rumo a uma mudança concreta;
4. Ação:
Neste estágio o indivíduo já tomou uma atitude drástica e modificou substancialmente seus hábitos, de modo a adquirir um comportamento mais saudável;
Neste estágio o indivíduo já tomou uma atitude drástica e modificou substancialmente seus hábitos, de modo a adquirir um comportamento mais saudável;
5. Manutenção:
Após a mudança, as pessoas adquirem a capacidade de manter os novos hábitos e trabalham para não ter recaídas;
Após a mudança, as pessoas adquirem a capacidade de manter os novos hábitos e trabalham para não ter recaídas;
6. Terminação:
A tentação do indivíduo em retornar aos velhos hábitos chega a zero diante da certeza dos resultados do novo comportamento.
A tentação do indivíduo em retornar aos velhos hábitos chega a zero diante da certeza dos resultados do novo comportamento.
* Organizado pela AxisMed e pela Associação Brasileira de Recursos Humanos de São Paulo, com apoio da Aliança para a Saúde Populacional (ASAP), a palestra ocorreu na capital paulista no último dia 13 de setembro
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