Problema neurológico conhecido como neuralgia do trigêmeo provoca crises de dor lancinante. Saiba como tratá-lo
Alduíza Pereira Gomes não conseguia comer direito, nem gostava mais de conversar. Fugia dos beijos da filha e da mão carinhosa do marido, tinha medo de pentear os cabelos, de se maquiar, de escovar os dentes e pânico de sair à rua.
O que transformou a figura constante e alegre das festas de família, na mulher que já não saia de casa nem para buscar os dois filhos na escola foi a dor.
“O rosto repuxava e eu sentia uma dor muito forte, lancinante. Não conseguia nem raciocinar. As crises foram ficando cada vez mais constantes. Pensei em me matar várias vezes e só não fiz isso por causa dos meus filhos”, relata Alduíza, diagnosticada há 4 anos com neuralgia do trigêmeo, condição descrita pela medicina como uma das dores mais graves e insuportáveis.
As crises desse distúrbio nervoso são caracterizadas por dores intensas, semelhantes a um choque, com curta duração e apenas em um lado do rosto.
“A pessoa pode ter o sintoma uma vez ao dia ou 20 vezes seguidas, o que dá a sensação de continuidade. A dor é rápida, sem aviso prévio e pode ser acionada com um simples toque nas zonas de gatilho”, explica o neurocirurgião Claudio Fernandes Corrêa, do hospital Nove de Julho, em São Paulo. Regiões do rosto como as bochechas, lábios ou língua são as mais comuns.
Não é raro que a nevralgia do trigêmeo, como também é chamada, seja confundida com dor de dente, o que leva a grande maioria dos pacientes primeiramente à cadeira do dentista. Alduíza, por exemplo, teve cinco dentes arrancados antes de finalmente procurar um médico.
“Como as pessoas apresentam dor na parte alta da face, é comum procurarem dentistas. Esse profissional precisa conhecer a doença e saber diferenciá-la, o que nem sempre acontece”, avalia Jayme Maciel, professor de neurologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Na maioria dos casos, não há causa conhecida e os exames neurológicos têm resultados normais, diz Corrêa. O quadro é mais comum em mulheres, na proporção de 2 para 1, e em portadores de esclerose múltipla.
“Apenas em 5% dos pacientes são encontrados tumores ou má formação de vasos”, avalia.
Alívio
O tratamento inicial é medicamentoso, geralmente são prescritos anticonvulsivantes como a cardiomazepina e a oxicarbazepina, que controlam a dor e podem ser mantidos por tempo indeterminado. No entanto, na maioria dos casos, a doença evolui e o número de crises aumenta.
“Com o passar do tempo o paciente passa a ter dores mais vezes por dia e vai aumentando a dose diária de medicação. Às vezes os efeitos colaterais do remédio tornam o uso inviável”, afirma Claudio Corrêa.
O medicamento traz alívio, mas apenas durante seu tempo de ação. “Eu passei a tomar de quatro em quatro horas para evitar sentir dor constantemente. Tomava à meia-noite para poder dormir e acordava às 4h chorando. De manhã, tomava de novo. Estava usando 8 comprimidos por dia”, conta Alduíza.
De tanto usar remédios, eles pararam de fazer efeito. Com isso, controlar a sensação ficou mais difícil. Ainda mais reclusa, e sem saber como se livrar da dor, a ideia de tirar a própria vida passou a atormentá-la. Para o neurologista Jayme Maciel, o desespero deve ser um alerta para os médicos.
“Os pacientes precisam ser bem tratados e bem conduzidos, já que a doença afeta significativamente a qualidade de vida, aumentando o índice de suicídio”, opina.
Em casos mais graves, são indicadas medidas cirúrgicas. Existem cinco tipos clássicos de operação e o médico deve avaliar qual se encaixa melhor para cada caso. Para Corrêa, a técnica mais eficiente hoje é a cirurgia de compressão com balão do gânglio de Gasser. A intervenção é realizada ambulatorialmente: é feita uma punção nos rosto do paciente, uma agulha com o balão é introduzida na região e esse balão é inflado durante 50 segundos, pressionando e neutralizando a área de gatilho mais comum. O procedimento leva no máximo 10 minutos.
“Nessa técnica 98% dos pacientes já sentem o alívio logo após a cirurgia. Em 70% deles, o efeito dura para toda a vida. Para os demais, a técnica pode ser repetida quantas vezes for necessário”, afirma.
A dona de casa Alduíza Gomes passou por esse procedimento há um mês e se sente renovada. “Nunca pensei que alguém pudesse sofrer tanto como eu sofri. Assim que acordei da cirurgia, passei a mão no rosto, o que há tempos não fazia. Depois, quis sentir o carinho dos meus filhos. Foi como nascer de novo”, relata.
Fonte IG
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