A falta de profissionais especializados e a baixa remuneração dos procedimentos fazem da gestão dos hospitais infantis um desafio cheio de peculiaridades
Custos, processos, acreditações, negociação com operadoras de saúde, gestão do corpo clínico e segurança do paciente. Estes são temas comuns com os quais qualquer gestor de uma instituição de saúde tem de lidar cotidianamente. No entanto, além do comum, cada hospital possui suas peculiaridades, e quando se trata de um hospital infantil, esses detalhes são maiores ainda.
Um estudo realizado pela farmacêutica Pfizer apontou que 88% das mães consideram o pediatra a principal referência quando se trata da saúde dos filhos. Este levantamento mostra a responsabilidade que o profissional e o hospital infantil possuem no tratamento do paciente. “Quando falamos em atendimento, o hospital infantil trata do maior valor que uma pessoa pode ter, que são os filhos. Por esse motivo ele deve ter, além da questão técnica, uma atenção e carinho muito grandes com o paciente, pois os pais notam todos estes detalhes e questionam as equipes assistenciais caso descordem de algo”, aponta o diretor geral do Hospital Infantil Sabará, Celso Ruggiero, que considera essa uma das maiores peculiaridades em um hospital pediátrico.
Outra diferença encontrada nos hospitais infantis e que não são comuns aos hospitais gerais, ou que atendem outras especialidades, é a ambientação e projeto arquitetônico destinado aos “pequenos” pacientes. Um grande exemplo que pode ser dado é o do Florida Hospital for Children, nos Estados Unidos, que conta com o Walt Disney Pavilion. “Nós oferecemos uma experiência única ao paciente com nossos ambientes temáticos e acomodações para suas famílias. Por exemplo, nossos andares são decorados com ambientes de natureza, selva, savana, ou oceano”, explica o administrador assistente do hospital, Tim Burrill, ao falar sobre os ambientes que levam os temas de histórias da Disney como Rei Leão, Pequena Sereia e Mogli.
O Walt Disney Pavilion é um hospital sem fins lucrativos e o primeiro a carregar a marca da empresa no mundo. A instituição conta com cerca de 200 leitos, uma equipe composta por mais de 80 pediatras treinados em cerca de 30 sub-especialidades pediátricas e toda a infraestrutura de imagens diagnóstica e serviços de TI. “Nossa equipe também é treinada e comprometida com os modelos e princípios de atendimento ao cliente e muitos destes comportamentos e padrões aprendemos com a Walt Disney Company”, acrescenta Burril.
No entanto, o ambiente lúdico e o foco em uma especialidade não eximem o hospital infantil de desafios como falta de profissionais e a má remuneração vinda da saúde suplementar e do setor público. Um estudo realizado, em 2010, pela Sociedade Brasileira de Pediatria, constatou que o número de médicos recém-formados que se candidatavam ao título de pediatra caiu 50% nos últimos dez anos. Segundo o levantamento, em 1999, 1583 profissionais se candidataram à pediatria, em 2009 foram apenas 794. “Tanto pediatras quanto área de enfermagem especializada em atendimento infantil são muito difíceis de encontrar, pois durante muito tempo essa categoria foi muito mal remunerada e os profissionais acabaram migrando de especialidade”, completa Ruggiero.
Outro ponto levantado pelo executivo do Sabará foi a utilização de novas tecnologias. “As novas gerações de médicos gostam de ferramentas tecnológicas para auxiliar seu trabalho, e a pediatria ainda adota pouca tecnologia. Hoje, cerca de 5% dos procedimentos cirúrgicos pediátricos são de alta complexidade e necessitam de equipamentos sofisticados, o restante dos atendimentos são clínicos ou cirurgias de pequeno porte”.
Comum aos hospitais privados e filantrópicos, a baixa remuneração pelos procedimentos realizados são considerados pelos gestores, de longe, o maior desafio enfrentado pela especialidade hoje. De acordo com Ruggiero, 98% dos atendimentos do Sabará vêm da saúde suplementar e, por não ter muitos procedimentos complexos, os convênios não remuneram diferenciadamente o tratamento infantil.
“Um hospital pediá-trico que atende praticamente a saúde suplementar acaba competindo com hospitais gerais que também possuem pediatria, mas que não vivem dela. Os valores gerados por esta especialidade são menos representativos que outros da parte adulta que são mais complexos e rentáveis, tanto que os leitos destinados à pediatria pouco crescem e os hospitais gerais têm dado cada vez menos atenção a esta especialidade”.
Para sanar o déficit gerado pelo subfinanciamento gerado pelo SUS e garantir sua sustentabilidade financeira, o GRAAC foi buscar nos Estados Unidos um modelo de captação de recursos adotado pelo St. Jude Children’s Research Hospital, em Menphis, Estados Unidos, onde há uma entidade, a American Lebanese Syrian Associated Charities (ALSAC), que é responsável por toda a captação de recursos para suprir o déficit do hospital.
De acordo com o superintendente financeiro do GRAAC, José Hélio Contador, a receita do SUS cobre apenas 40% dos custos do hospital. Outros 10% vêm da saúde suplementar. Os 50% restantes são provenientes do sistema de captação de recursos que funciona por meio de um serviço de telemarketing e sócios, tanto pessoa física quanto jurídica, que contribuem por meio de boletos bancários, parcerias com governo, emendas parlamentares para compra de medicamentos e equipamentos e eventos.
Por ser uma instituição filantrópica, o Florida Children Hospital também conta com um sistema de captação de recursos junto à comunidade local e a iniciativa privada. Segundo Burril, os hospitais infantis nos EUA são altamente dependentes de doações e também sofrem com a baixa remuneração por parte das fontes pagadoras em relação aos procedimentos pediátricos.
Para o diretor clínico do Hospital Infantil Pequeno Príncipe, Donizetti Giamberardino, o fato de se dedicar a atividade clínica pediátrica já é um desafio. Segundo ele, o hospital, que possui mais de 60% de seu atendimento destinado ao SUS, tem suas atividades mais voltadas para cirurgia infantil do que internação clínica, e das duas mil internações que faz em média, 2/3 são de procedimentos cirúrgicos e apenas 1/3 clínicas. “Esta é uma característica de viabilidade, uma vez que o Pequeno Príncipe está isolado no mercado, não pela intenção do monopólio, mas porque os pequenos hospitais pediátricos foram fechando ou mudando suas atividades ao longo dos últimos 30 anos, deixando os hospitais que ainda atuam nesse segmento sobrecarregados”.
Fonte SaudeWeb
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