Medida, aprovada pela Câmara dos Deputados, contraria OMS e consulta pública da Anvisa; MP vai agora para o Senado
Fabricantes de cigarro, como a Souza Cruz e a Phillip Morris, podem voltar a patrocinar festivais de música e eventos esportivos, como a Fórmula 1, contrariando explicitamente a Convenção-Quadro sobre o Controle do Uso do Tabaco, da Organização Mundial da Saúde (OMS), ratificada pelo Brasil há cinco anos. A permissão para propaganda institucional foi incluída na medida provisória da política industrial, aprovada anteontem pela Câmara dos Deputados, que passa, agora, pelo crivo do Senado Federal.
O texto da MP elimina restrições à "divulgação institucional" dos fabricantes de cigarro, abrindo uma brecha para patrocínio de eventos específicos, segundo especialistas ouvidos pela reportagem do Estado.
"Lendo o que está aqui, ficou claro que os fabricantes podem usar a marca da empresa de maneira basicamente livre", avaliou Marcelo Mansur, sócio do escritório Mattos Filho Advogados. "Como os produtos, no caso de cigarros, são as marcas, entendo que está permitindo usar inclusive o nome do produto."
Segundo o advogado Luis Renato Vedovato, doutorando em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), o texto aprovado pelos deputados contraria a convenção. Na avaliação da OMS, afirmou, reduzir a propaganda institucional pode diminuir o consumo de cigarros, objetivo da convenção. "Entendo que viola a convenção", disse.
A versão da MP enviada ao Senado atropela, também, consulta pública da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que visa a proibição da propaganda institucional.
Risco. Um dos principais riscos jurídicos de se manter a autorização para divulgação institucional ao transformar a MP em lei seria jogar o tema do cigarro em uma discussão que só seria decidida pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Advogados divergem há anos sobre a hierarquia de leis, quando comparadas com tratados internacionais, como é o caso da convenção-quadro.
Para alguns, o tratado se sobrepõe à lei, então a permissão da MP não valeria na prática. Para outros, porém, a validade é a mesma. "É uma questão política, como foi uma decisão política do governo aderir, foi uma decisão política do Congresso mudar a lei", diz Mansur. "E quando duas leis possuem o mesmo nível hierárquico, vale a mais recente."
Para Vedovato, por outro lado, a violação do tratado internacional permitiria uma ação do MPF perante o STF. "Se o Ministério Público entender, como eu, que a lei viola o tratado poderá questionar no Supremo."
Fumódromos. A bancada da saúde na Câmara conseguiu vetar ontem outra proposta contida na MP, que permitiria a criação de estabelecimentos específicos para o consumo de cigarro, os chamados fumódromos.
Derrubada esta parte do texto, a MP acabou aperfeiçoando a legislação, proibindo de forma clara e objetiva o consumo de tabaco em ambientes fechados, públicos ou privados. Antes da mudança aprovada ontem, uma ressalva na lei em vigor, de 1996, permitia que Estados regulamentassem o assunto e permitissem estabelecimentos com locais para fumantes. Se o Senado mantiver essa alteração na lei quando votar a MP, os locais de fumo em áreas fechadas se torna ilegal.
Fonte Estadão
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