Subtipo da doença resiste mais aos antirretrovirais e deteriora sistema imune
Nos últimos cinco anos, a região Sul do Brasil teve o maior número de casos e de mortes por Aids de todo o país. Entre as dez cidades com o maior número de casos por 100 mil habitantes em 2010, todas são da região, na maioria no Rio Grande do Sul.
A região é a que tem o maior coeficiente de mortos pela doença, nove por 100 mil habitantes. No Brasil, esse índice é de 6,3 por 100 mil/hab. Os dados são do Boletim Epidemiológico Aids e DST 2011, divulgado em novembro pelo Ministério da Saúde.
As causas desses fenômenos são variadas, mas um subtipo da doença, o vírus C (uma das variações do vírus HIV-1), encontrado somente na região Sul, pode influenciar esses números. Existem ao menos dez subtipos de HIV dentre os dois vírus existentes, o HIV-1 e HIV-2.
Segundo Ricardo Charão, coordenador da seção de DST/Aids, o subtipo do HIV encontrado majoritariamente no Rio Grande do Sul, seguido de Santa Catarina e Paraná, é bem mais agressivo do que o subtipo B – o mais comum no país.
- Ele deteriora o sistema imunológico rapidamente e é mais resistente à medicação antirretroviral. Por isso é uma das causas pelas quais temos uma mortalidade alta no Rio Grande do Sul, que é o dobro da nacional.
Vírus e tuberculose matam
Porto Alegre lidera o “top 10” de incidência da doença, com 99,8 casos por 100 mil habitantes em 2010. Outras cidades de sua região metropolitana também contam com valores altos: Alvorada (81,8), Sapucaia do Sul (66,4) e Canoas (57,4). Além dessas, está a fronteiriça Uruguaiana (67). Balneário Camboriú (77,7), Criciúma (61,9), Biguaçu (60,1), Pinhais (58,1) e Florianópolis (57,9) completam a lista, dominada pelos Estados sulistas.
Entretanto, não há consenso de como o vírus chegou à região, nem do porquê de sua falta de capacidade de ultrapassar as barreiras regionais. De acordo com Charão, acredita-se que o vírus proveniente da África tenha entrado no país pelo porto de Rio Grande, incubado em algum marinheiro ou passageiro infectado.
Uma das possíveis causas para o vírus permanecer na região seria pelo que a ciência conhece como “efeito fundador”. Isto é, quando um subtipo de um vírus se instala e se dissemina em uma região, tende a ocupar o espaço que poderia ser de outro subtipo do mesmo vírus, explica o infectologista Celso Granato, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
- Quando esse pessoal começou a entrar em contato com o vírus B, esse vírus não conseguiu mais se estabelecer porque já estava com o espaço ecológico ocupado por outro tipo de vírus. Então o C não consegue se sobrepor ao B e o B não consegue se sobrepor ao C, onde ele chegou primeiro.
Charão aponta outros fatores para a disseminação.
- Outra causa da mortalidade de Aids no Rio Grande do Sul é a correlação entre tuberculose e HIV, principalmente em Porto Alegre que tem uma incidência alta da doença, e onde a tuberculose se apresenta com a maior causa de morte entre as pessoas com HIV.
Para diminuir as mortes, ações conjuntas da Secretaria Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul e do Ministério da Saúde estão oferecendo tratamento da tuberculose em centros de atendimento de portadores de HIV, como forma de facilitar a adesão aos medicamentos corretos.
Droga na veia também é vilã
Para o diretor do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, Dirceu Greco, um dos motivos para a epidemia de Aids no Rio Grande do Sul ser maior que em outros Estados é a quantidade de municípios localizados em faixa litorânea e em região de fronteira, locais considerados porta de entrada de drogas e zonas de prostituição.
- A região sul tem duas fronteiras: a fronteira interna, que talvez explique parcialmente, e uma parte de litoral, que está com alta incidência e onde tem essa história de acesso à droga, que é uma possibilidade.
Hipótese que se confirma em números. De acordo com Charão, 5% dos casos de Aids no Rio Grande do Sul têm relação com o uso de drogas na veia.
- No Rio Grande do Sul e em Santa Catarina temos um alto índice de uso de droga injetável, principalmente cocaína, através do compartilhamento de seringas.
O argumento foi lembrado pelo ministro da Saúde, Alexandre Padilha, no dia do lançamento do boletim.
- O que pode explicar um pouco a situação do Rio Grande do Sul é que há dez anos atrás a presença da transmissão por uso de drogas endovenosas era maior no Rio Grande do Sul do que em outras regiões do país, e isso pode contribuir para a explicação. as o que temos que fazer agora é reforçar as campanhas e o diagnóstico precoce no Rio Grande do Sul e nos outros Estados do Sul do país.
De acordo com o último Levantamento Domiciliar sobre o uso de drogas psicotrópicas no Brasil, do Obid (Observatório Brasileiro de Informações sobre Drogas), datado de 2005, enquanto a cocaína é a quinta droga mais consumida pelos brasileiros, no Sul é a quarta. E, enquanto a heroína, droga também de uso endovenoso, é a 15ª droga mais usada no país, de um ranking de 16, no Sul é a 14ª.
Problema para todos: falta de diagnóstico
Mas é ainda a falta de diagnóstico precoce a maior pedra no sapato no combate da doença, de acordo com o coordenador de DST do Rio Grande do Sul. Segundo ele, há uma dificuldade real de acesso ao diagnóstico no Estado, onde “as pessoas chegam tarde para fazer o teste e já doentes de Aids, ou o fazem, mas não vão buscar”.
Dado confirmado pelo ministro, que afirmou que as campanhas de conscientização nos pequenos municípios podem ser decisivas no combate à Aids.
- O crescimento [dos casos de Aids] dos menores municípios foi muito maior do que em outras regiões do país. Por isso as campanhas com mídias que chegam aos pequenos municípios e o reforço da capacitação dos profissionais que atuam neles pode ser decisivo para que a gente reduza a transmissão. Para isso estamos usando o teste rápido que pode ser feito no centro de saúde na área rural.
Fonte R7
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