Casais brasileiros estão viajando ao exterior para fazer fertilização com óvulos comprados de mulheres mais jovens. Em 2011, ao menos 35 foram à Espanha e aos EUA com esse intuito. O Brasil proíbe o comércio de gametas.
O cenário revela uma realidade que aflige o mundo da reprodução: a escassez de óvulos em um momento no qual cada vez mais brasileiras tentam engravidar depois dos 35 anos, quando crescem as chances de infertilidade.
Elas representam hoje 50% do movimento das clínicas de reprodução no país. Dessas, 20% têm mais de 40 anos, faixa etária em que as chances de gravidez com óvulos próprios são inferiores a 5%.
Como solução, um grupo de médicos está tentando fazer com que a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) afrouxe as regras para importação de gametas (óvulos e espermatozoides). Hoje, só é permitida a importação individual e em casos comprovados de inexistência de doadores brasileiros.
Ao mesmo tempo, o Cremesp (Conselho Regional de Medicina) discute uma norma para permitir que casais que necessitem de uma ovodoação paguem pelo tratamento de outros casais em troca de parte dos óvulos (doação compartilhada).
Algumas clínicas já adotam essa prática, mas sem amparo legal. Juízes e advogados entendem que isso configura comércio. No Brasil, a doação de gametas também deve ser anônima.
Técnica invasiva
Até produzir óvulos suficientes para uma fertilização in vitro a mulher precisa usar hormônios e passar por um procedimento invasivo de retirada dos óvulos dos ovários.
Ou seja, uma doação por altruísmo é bem complicada, diferentemente do caso dos homens, que só precisam se masturbar para doar sêmen.
"Pouquíssimas mulheres se submeteriam ao tratamento hormonal, à punção [dos óvulos] e depois doariam os óvulos para outra paciente usar", diz Artur Dzik, presidente da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana.
Nas clínicas, a fila de espera por óvulos doados chega a um ano. "Não temos óvulos disponíveis. São quase cem pacientes à espera. Algumas desistem", conta o médico Ricardo Baruffi, do centro de reprodução Franco Júnior.
Na clínica do urologista Edson Borges, pelo menos 50 pacientes estão à espera de óvulos doados. A demora é de seis a oito meses.
Quando os casais têm pressa e dinheiro, uma alternativa é encaminhá-los a centros de reprodução no exterior. "Tenho mandado para a Espanha. Preparo o útero aqui [hormônios que fazem crescer o endométrio] e elas passam lá uma semana. Mas é um absurdo ter que ir para a Espanha para um tratamento tão simples", afirma Dzik.
A taxa de gravidez com óvulo doado, segundo ele, chega a 60%. Na Espanha, o tratamento fica em torno de € 10 mil (R$ 25 mil). Nos EUA, o procedimento custa o equivalente a R$ 28 mil.
Nesses países, a venda de óvulos é permitida. A maioria das doadoras na Espanha é de mulheres do Leste Europeu, que ganham mil euros por ciclo de tratamento. Nos EUA, muitas estudantes vendem óvulos a preços que vão de US$ 2.500 a US$ 4.000.
Discussão
A "legalização" da doação compartilhada de óvulos vem sendo discutida em uma câmara técnica de reprodução assistida no Cremesp.
"Precisamos de amparo jurídico para criar regras muito específicas. A ideia é ajudar mulheres que têm óvulos, mas sem condições financeiras para o tratamento e outras que têm condições, mas não possuem óvulos", explica o urologista Edson Borges, que integra a câmara técnica.
Já a importação de gametas é vista com ressalvas pelos médicos. "Acho desproporcional. O ideal é termos um banco de óvulos brasileiro", diz Eduardo Mota, professor da Unifesp.
Fonte Folhaonline
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