Certa vez, durante um congresso, o físico Adriano Alencar dividiu o quarto com um colega que sofria de apneia do sono. Após uma noite em claro devido aos roncos, ele se perguntou por que não havia conseguido dormir. "Percebi que o problema não era o barulho do ronco, mas a irregularidade dos ruídos."
O "insight" foi o estopim de um experimento que ele, o médico Geraldo Lorenzi-Filho, do Laboratório do Sono do Incor, e colegas da USP realizaram, rendendo um artigo que será publicado em breve no periódico "Physica A".
Nele, os pesquisadores apresentam uma maneira alternativa de diagnosticar a apneia obstrutiva do sono, baseada na análise das irregularidades do ronco. A doença, estima-se, atinge 32% da população da Grande São Paulo e pode aumentar o risco de problemas como doenças do coração e diabetes.
O diagnóstico padrão é feito por meio da polissonografia, um exame que avalia uma série de dados durante o sono, como ondas cerebrais, respiração e oxigenação sanguínea. Mas, para fazê-lo, o paciente precisa passar a noite toda no consultório.
O ronco é um fenômeno comum e, muitas vezes, não está ligado a nenhuma doença. Por outro lado, o ronco irregular é um dos principais indicadores de apneia do sono.
Segundo Alencar, que é professor do Instituto de Física da USP, "outros pesquisadores procuraram entender a relação entre ronco e apneia pela intensidade do barulho ou pela frequência.
Nós simplificamos o modelo e nos baseamos apenas nos intervalos irregulares entre um ronco e outro".
No experimento, 17 pacientes do laboratório do sono do Incor foram submetidos a uma polissonografia e, ao mesmo tempo, seu ronco era gravado. Os sinais acústicos foram analisados por um software desenvolvido pelos próprios pesquisadores.
Eles partiram da hipótese de que, em pacientes com apneia do sono, os intervalos entre um ronco e outro ocorreriam entre 10 s e 100 s, e propuseram um índice baseado no número desses intervalos dividido pelo tempo.
A comparação desse índice com a medida padrão, o número de eventos de apneia registrados numa noite dividido pelo tempo, apresentou uma correlação expressiva.
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O próximo passo, já em andamento, é repetir o experimento com 200 pacientes. Desta vez, os pesquisadores vão submetê-los primeiro ao diagnóstico pelo ronco e conferir se os resultados batem com os da polissonografia.
Para Simone Fagondes, do Departamento do Sono da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, "os resultados da pesquisa são promissores, e o estudo representa um importante avanço para estabelecer parâmetros e recomendações para a avaliação e a classificação do ronco, além de ter confirmado a relação entre o ronco e a apneia do sono."
Alencar afirma que a ideia não é substituir o diagnóstico padrão pela análise do ronco. "Nossa proposta é de um complemento, um pente fino, que indicará ou descartará o uso do exame mais detalhado nos pacientes".
Fonte Folhaonline
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