Dados inéditos mostram que entre elas índice do vício é de 54%, contra 42% neles. Especialistas explicam que hormônio feminino reforça ação prazerosa da droga e acelera a dependência
Dados inéditos da pesquisa nacional que mapeou o consumo de crack e cocaína no Brasil mostram que as mulheres acabam mais dependentes do pó e das pitadas no cachimbo do que os homens.
O levantamento feito pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) indicou que o País soma 2,6 milhões de usuários destas substâncias, consumidas de forma aspirada ou fumada .
Apesar dos homens serem líderes na taxa de uso de crack e cocaína, entre as mulheres usuárias o índice de dependência foi de 54%. Já no sexo masculino, os pesquisadores detectaram que 46% são viciados, diferença de oito pontos porcentuais entre os gêneros.
Os especialistas afirmam que o organismo delas é mais vulnerável à ação dos entorpecentes. Isso explica por que elas são mais numerosas nos índices de dependência. A mesma razão também está por trás de outras estatísticas encontradas no estudo da Unifesp: 40% das usuárias relataram usar as drogas mais de duas vezes por semana contra 24% dos homens. Além disso, duas em cada dez mulheres já injetaram cocaína (20%), mais do que o dobro de usuários do sexo masculino que recorrem a esta forma de uso (8%).
Para identificar quantos usuários se enquadram nos quesitos de dependência, que envolvem sintomas psicológicos (como compulsão e depressão ) e sinais físicos (tremedeira, dores de cabeça e no corpo), os pesquisadores aplicaram questionários com 42 perguntas em 4 mil moradores de todas as regiões do País, de todas as classes sociais e escolaridades. Por serem representativos do Brasil, os achados podem ser estendidos a toda população brasileira.
A psicóloga Clarice Madruga, uma das autoras do mapa do uso do crack e cocaína no Brasil, diz que “é sabido que a progressão da dependência é mais rápida entre mulheres.”
Segundo ela, estudos anteriores já mostram quem os hormônios femininos (principalmente o estrogênio) podem estar envolvidos nesta maior vulnerabilidade.
“Este hormônio potencializa os efeitos da droga, pois a torna mais prazerosa e, portanto, aumenta o poder de dependência”, define Clarice.
A estrutura hormonal feminina já apareceu como uma das razões para as jovens entre 24 e 35 anos serem líderes em consumo exagerado de álcool, conforme detectou estudo da Organização Mundial de Saúde (OMS) feito com mulheres brasileiras e divulgado há quatro meses. Por causa dos hormônios, a conexão das drogas com o cérebro é mais rápida. Elas “precisam de menos quantidade e menos tempo de uso de tóxico para ficarem viciadas”, explicou Camila Silveira, pesquiatra do Centro de Informações Sobre Álcool e Drogas (Cisa) e autora do estudo da OMS feito no Brasil.
Associadas aos fatores fisiológicos estão as questões comportamentais que favoreceram o uso de crack, cocaína e outras drogas pelas mulheres. Até 30 anos atrás, pontuam os estudiosos, não era socialmente aceito que a população feminina consumisse qualquer tipo de droga.
Na época, a razão registrada pelos centros de atendimento era de 5 homens usuários para cada mulher. Hoje, no grupo etário menor de 30 anos, a proporção já é de 1 caso masculino para 1 feminino, indicou levantamento feito pelo Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP).
Outros números que atestam o crescimento feminino na utilização de drogas são os do DataSUS, banco virtual do Ministério da Saúde, abastecido pelos hospitais públicos e privados do País. Entre 2008 e 2001, as internações de mulheres devido o uso de substâncias psicoativas (entram na lista álcool, maconha, crack, cocaína, ansiolíticos e remédios para emagrecer, por exemplo) cresceram 21,1%, passando de 13.876 casos para 16.804, segundo levantamento feito pelo iG Saúde.
Se elas já estão mais numerosas, ainda enfrentam barreiras para procurar ajuda especializada. Nos grupos de estudo da USP e da Unifesp, as mulheres chegam com até 10 anos mais de uso crônico de drogas do que os homens. Entre as justificativas apontadas estão: vergonha, preconceito e também limitações como, por exemplo, impossibilidade de deixar os filhos em casa para ser submetida a uma internação de 3 meses.
Na primeira clínica pública de São Paulo destinada ao tratamento de drogas, inaugurada pelo governo de São Paulo em São Bernardo do Campo, até o início do ano passado, 46% dos leitos exclusivos para mulheres estavam vazios devido à baixa procura .
“Sabemos que demanda existe, mas espontaneamente elas ainda não chegam até nós”, comentou na época a psiquiatra, então responsável pelo serviço, Alessandra Diehl, atualmente membro da Associação Brasileira de Estudo sobre Álcool e Drogas (Abead).
Em resposta, algumas políticas públicas para as mulheres dependentes já começaram a ser lançadas. No Rio Grande do Sul, as agentes sociais tentam fazer o trabalho de recuperação com a paciente – quase sempre a chefe da família – e das crianças.
Em São Paulo, o Hospital Leonor Mendes de Barros, referência de maternidade para a área central, onde está a cracolândia, foi criada uma enfermaria específica para grávidas usuárias de crack.
Fonte iG
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