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segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Como aproveitar as férias sem neurose

Há quem não consiga abdicar do senso de compromisso nem
quando o descanso é um direito adquirido
Por causa das muitas festividades dessa época do ano, a sensação de culpa geralmente vêm à tona com maior frequência
 
Período de férias representa, para a maioria das pessoas, um momento de relaxamento e tranquilidade. Mas há quem não consiga abdicar do senso de compromisso nem quando o descanso é um direito adquirido. O motivo? Invariavelmente, a culpa.
 
Conhecido culturalmente desde que, segundo a Bíblia, Adão e Eva morderam a maçã proibida e padeceram no paraíso, o sentimento é socialmente associado a erro, dolo e pecado. Na verdade, tirar férias é comer a maçã desejada.
 
Por causa das muitas festividades dessa época do ano, como Natal, Ano-Novo e férias, a sensação de culpa geralmente vêm à tona com maior frequência. De acordo com a psicóloga Zeila Bedin, isso ocorre porque o acúmulo de eventos sociais aumenta também as demandas emocionais:
 
— Conciliar todas as solicitações desse período torna muito complicado ficar de bem com todo mundo e consigo mesmo. Quando se põe na balança, as culpas surgem.
 
Muito difundida pelo catolicismo, a culpa cristã é vista pelo padre Érico Hammes, professor da Faculdade de Teologia da PUCRS, como a relação entre o ato e o seu efeito negativo:
 
—É um sentimento paralisante e não faz bem para ninguém— diz ele, acrescentando que o sentimento tem a ver com a responsabilidade e liberdade.
 
Mas assumir uma culpa quando se é responsável por algo, complementa Hammes, é normal e faz parte da mudança de vida.
 
Boa parte das culpas sentidas pelas pessoas está associada às expectativas em relação aos vários papéis a serem cumpridos na sociedade atual. É o caso de pais ou mães que passam a sentir culpa e frustração por não conseguirem acompanhar todas as etapas do crescimento de seus filhos. Jogue a primeira pedra quem nunca se sentiu péssimo por faltar a apresentação de final de ano do filho na escola.
 
De acordo com os psicanalistas Paulo Sérgio Rosa Guedes e Julio Cesar Walz, tanto as expectativas sobre os papéis a serem cumpridos quanto o acompanhar todas as etapas do desenvolvimento dos filhos são ideais delirantes e impossíveis de serem cumpridos.
 
Quando o problema vem do trabalho
Em relação ao trabalho, sentir culpa depende de como se planeja a carreira. A psicóloga Zeila Bedin explica que, se a rotina profissional contempla um plano de vida, a ausência na família tem recompensa, pois a pessoa se permite descansar e ter momentos com os filhos. Já quando a dedicação profissional não inclui o espaço para a vida pessoal, possivelmente haverá conflito. É o caso do workaholic, aquele sujeito que não tem vida longe do trabalho e, mesmo em férias ou nos finais de semana, fica preso aos compromissos profissionais, porque assim o deseja.
 
Essa característica, explica Zeila, não é tão comum aos jovens da geração Y. Segundo ela, é a juventude atual está sabendo viver melhor, pois se permite mais pensar em qualidade de vida do que seus pais:
 
— Os jovens vivem mais o presente, sem culpas.
 
Quando a mudança traz alívio
Mesmo formada em Psicologia, a jovem Quênia Mello optou por trabalhar nas empresas de sua família quando terminou a faculdade. Há cerca de quatro anos, ela exercia funções administrativas nos ramos alimentícios e de combustíveis, mas não era exatamente feliz com essa escolha. A falta de identificação com a filosofia implantada nos negócios familiares trouxe um incômodo que, por não ser resolvido, acabou se transformando em culpa.
 
— Havia muito conflito entre os valores dos meus pais e os meus. Me sentia mal porque não conseguia fazer as coisas do meu jeito — afirma.
 
Há um ano, decidida a dar um basta no desconforto pessoal, pediu demissão e resolveu investir no próprio negócio. Buscou qualificação, estudou o ramo e fez o planejamento estratégico para abrir uma estética no bairro Niterói, em Canoas. O mercado da beleza, revela, era uma paixão antiga que Quênia trazia desde a infância.
 
Além da sala de atendimento kids, temática e com recreacionista para os filhos das clientes, o diferencial do negócio que Quênia montou é a atenção que busca dar aos funcionários. Para ela, tão importante quanto o desempenho no trabalho, é que eles se sintam bem com o que fazem.
 
— Quando a gente toma as rédeas da própria vida, dissolve a culpa. É uma opção consciente e fica mais fácil administrar as nossas expectativas — afirma a nova empresária.
 
Quando a responsabilidade é maquiada
No livro O Sentimento de Culpa (2007), os psicanalistas Paulo Sérgio Rosa Guedes e Julio Cesar Walz apresentam uma visão particular sobre o tema, fazendo a diferenciação do sentimento com o conceito de culpa. Julio Walz explica que, enquanto o primeiro estaria relacionado à ilusão de onipotência, mania de grandeza e uma convicção absoluta de poder, a culpa propriamente dita é referida a quem cometeu atos ilícitos. Mas é sobre o primeiro ponto — o sentimento — que a tese dos psicanalistas se debruça. Conviver com ele tornou-se uma constante na sociedade contemporânea, segundo constataram em seus consultórios. Daí terem concluído que as perturbações mentais têm como causa, sempre, o sentimento de culpa/megalomania.
 
— Diríamos que as pessoas que normalmente não têm uma boa autoimagem frequentemente sentem-se culpadas para tentar buscar alguma ideia melhor acerca de si mesmas— defendem os especialistas.
 
No entendimento dos autores, o sentimento de culpa nunca é consequência de algo, e sim causa. Esclarecem, ainda, que culpa e responsabilidade, do ponto de vista emocional, são estados afetivos totalmente opostos e longe de serem sinônimos.
 
— As pessoas têm uma dificuldade extraordinária de aceitar a responsabilidade. Preferem se sentir culpadas — afirma Guedes.
 
Fonte Zero Hora

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