Jim Wilson/The New York Times
Smartphone: aplicativos que monitoram padrões de
movimentação são usados agora em prol da saúde
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Para muitos pacientes com condições crônicas como depressão, dores ou diabetes, o padrão é previsível: quanto mais sofrem, mais eles se voltam para dentro. Os médicos podem não vê-los até que estejam em crise e apareçam num pronto-socorro.
Agora está surgindo uma solução da era digital. Quando os pacientes se fecham, seus celulares podem estender a mão a eles.
Os telefones usam um aplicativo que rastreia com que frequência eles enviam mensagens de texto, fazem chamadas e se locomovem, além de para onde eles vão. Se os hábitos e padrões se desviarem de forma a sugerir que eles se isolaram, o aplicativo alerta o médico ou outro responsável.
Diversos hospitais e centros médicos começaram recentemente a testar e usar a tecnologia, com apoio financeiro vindo de redes médicas, do exército dos EUA e de companhias de seguros. A abordagem inovadora usa uma tecnologia cada vez mais comum em smartphones: sistemas de GPS e acelerômetros que conseguem rastrear localização e movimento.
“Trata-se de um sistema de alerta antecipado humano, a ‘luz de óleo’ do corpo”, disse Michael Seid, professor de pediatria do Children's Hospital Medical Center de Cincinnati.
Desde o ano passado, 15 pacientes com problemas gastrointestinais crônicos levaram os telefones para testar a eficácia do software. Até agora, os resultados indicam que alguns alteram claramente seus padrões de comunicação e deslocamento nos dias anteriores ao surgimento de fortes sintomas.
“Quando a dor aumenta, você fica menos suscetível a ir ao parque ou ao shopping. Isso poderia ser um indicador antecipado de um surto ou agravamento da doença”, afirmou Seid. A tecnologia, ele acrescentou, “mede o comportamento social numa escala e profundidade que você simplesmente não tinha antes”.
O software ainda está sendo testado e estudado por sua eficácia. Mas especialistas e pesquisadores de saúde mental dizem que ele traz uma grande promessa – não só para identificar pioras de condição, mas também para detectar mudanças de comportamento indicando que alguém parou de tomar seus remédios ou precisa de uma nova dosagem.
“Isso pode proporcionar uma importante nova ferramenta num setor bastante necessitado”, declarou Adam I. Kaplin, professor de psicologia e neurologia da Johns Hopkins.
“Eu tenho preocupações, mas posso dizer – enfaticamente – que eles colocaram o dedo sobre a necessidade de identificar essas pessoas antes que elas entrem no buraco do coelho.”
As preocupações de Kaplin incluem se tais sistemas poderiam enviar alertas sobre pessoas saudáveis, como alguém que não está deprimido mas resolve passar algum tempo inativo, ou alguém com uma simples gripe que passa o dia em casa. Se isso acontecer, isso somaria custos, em vez de amenizá-los? E, segundo ele, os pacientes podem achar que estão sendo excessivamente monitorados.
“Em que momento os grandes dados se tornam o Grande Irmão?”, questionou ele.
Os pesquisadores e empresas por trás da tecnologia dizem estar cientes da preocupação com privacidade. Mas eles apontam que o paciente precisa consentir, e que as informações são enviadas apenas a profissionais da saúde ou a membros designados da família. Eles também dizem ser cedo demais para mensurar qual será o efeito disso sobre os médicos, e como eles trabalharão com os pacientes.
A tecnologia faz parte de um campo muitas vezes chamado de “grandes dados” (do inglês “big data”), que captura e filtra enormes quantidades de dados para melhor entender e prever comportamentos – como padrões de compra, movimentos do mercado de ações e condições que podem levar a conflitos militares.
No campo da saúde, pesquisadores em laboratórios de todo o país estão buscando um provedor de tecnologias de grandes dados, incluindo maneiras de avaliar melhor os comportamentos de pacientes e medir a eficiência de medicamentos.
Um dos principais centros de pesquisa nesse campo é o MIT Media Lab, onde Alex Pentland, professor de dinâmicas humanas, supervisiona o programa de empreendedorismo. Segundo ele, a ideia de coletar comunicações e deslocamentos de pacientes pode dar aos médicos evidências mais precisas de comportamento do que depender da memória do paciente, ou de seus esforços para descrever os problemas.
“O ser humano não é apenas ruim nisso, ele é péssimo, além de ser tendencioso sob muitos aspectos”, afirmou ele sobre a autoavaliação dos pacientes.
“Os dados dos celulares representam uma verdadeira visão de Deus sobre o que estamos fazendo.”
Mas Pentland acrescentou que os dados também precisam ser refinados e compreendidos para que, quando parecer que alguém está se fechando em si mesmo, as informações não sejam enganosas.
“Talvez o cara esteja prestes a se suicidar, ou talvez ele esteja pronto para escrever o romance da década”, disse ele.
Uma das empresas com raízes no Media Lab é a Ginger.io, que está provendo a tecnologia no Cincinnati Children's Hospital, além de implantações maiores programadas para este mês em hospitais da Carolina do Norte que pertencem à Novant Health, uma das maiores empresas de assistência médica do país.
Matthew Gymer, diretor de inovação da Novant, pretende analisar como a tecnologia se sai alertando médicos sobre potenciais mudanças de comportamento em milhares de pacientes com diferentes problemas – incluindo diabetes, dores crônicas e doenças cardíacas.
“A realidade é que, conforme marchamos pela vida, existe um padrão bastante previsível para onde vamos e o que fazemos”, disse ele. “Se esse padrão é quebrado de maneira inesperada, algo pode estar errado.”
A Cogito, empresa relacionada ao Media Lab, iniciou um amplo ensaio clínico da tecnologia com a VA Boston Health Care System, parte do Departamento de Assuntos dos Veteranos, financiado pelo Departamento de Defesa e pela Raytheon, prestadora de serviços ao exército. O teste procura mensurar se um soldado pode estar desenvolvendo o distúrbio de stress pós-traumático, identificando períodos de isolamento ou mania, explicou Joshua Feast, fundador da Cogito. Segundo Feast, um grande foco da pesquisa é identificar quais medidas são mais eficientes em identificar e prever doenças como depressão.
Deborah Estrin, professora de ciência da computação na UCLA, está trabalhando num pequeno ensaio clínico com pacientes de dores crônicas na Universidade da Califórnia, em Davis. O objetivo é descobrir se dados retirados dos celulares de pacientes podem mostrar se eles se tornaram subitamente sedentários – um possível sinal de aumento de dor, ou até mesmo de que alguém não está tomando seus remédios.
Segundo Estrin, as promissoras pesquisas iniciais sugerem possibilidades como tratamentos cada vez mais personalizados, baseados em avaliações de padrões individuais de comportamento. Os médicos poderiam entender melhor como tratamentos, medicações ou dosagens específicas afetam um paciente.
“Estou animada, mas há muito trabalho a ser feito”, disse ela, acrescentando: “Se a saúde fosse algo fácil, não teríamos tantas doenças”.
Fonte iG
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