Nos últimos dois anos, pelo menos 11 casos de falhas em hospitais atribuídos a profissionais de enfermagem tiveram repercussão nacional |
Em apenas um ano, 124.342 novos técnicos de enfermagem entraram no mercado de
trabalho no Brasil. De 2010 a 2011, o número desses profissionais aumentou
19,8%, quase 17 vezes mais que a taxa média de crescimento anual da população,
que é de 1,17%. O rápido crescimento e a falta de fiscalização de cursos
técnicos, aliado a condições de trabalho inadequadas desses profissionais em
hospitais públicos e particulares, preocupam os representantes da categoria.
Hoje, a profissão é dividida entre enfermeiros, que têm graduação; técnicos
de enfermagem, cuja formação exige ensino médio e curso técnico de dois anos; e
auxiliares, que completam apenas o primeiro ano do curso técnico.
Para membros dos conselhos estaduais e federal de enfermagem, a escalada de
técnicos, que somam mais de 750 mil de pessoas no País, ocorre de forma
desenfreada. Eles apontam a falta de critérios mais rígidos para a criação de
novos cursos técnicos como um dos problemas. Além disso, a fiscalização dessas
instituições, cuja responsabilidade é pulverizada entre as Diretorias Regionais
de Ensino, também é considerada falha - o que não ocorre no curso superior, cuja
abertura e fiscalização cabem ao Ministério da Educação (MEC).
Em 2010, o Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (Coren-SP) recebeu
250 denúncias contra profissionais (entre técnicos, auxiliares e enfermeiros). O
número subiu para 800 no ano passado, segundo o presidente da entidade, Mauro
Antônio Pires Dias da Silva - alta de 220%. Como para cada enfermeiro há dois
técnicos no País, estes acabam concentrando o maior número de erros de
procedimento.
Nos últimos dois anos, pelo menos 11 casos de falhas em hospitais atribuídos
a profissionais de enfermagem tiveram repercussão nacional. Silva, que é
professor do Departamento de Enfermagem da Faculdade de Ciências Médicas da
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), diz temer pelo futuro, caso esses
problemas não sejam solucionados: "Com remuneração baixa, má preparação e
condições de trabalho não adequadas, não errar, para mim, seria um milagre".
Formação
Para a conselheira Fátima Sampaio, do Conselho Federal de
Enfermagem (Cofen), o principal problema da formação técnica é o fato de que a
autorização para a abertura dos cursos cabe aos conselhos estaduais de educação,
que não contam com enfermeiros em seu quadro. "São profissionais com experiência
pedagógica, mas não na área de enfermagem", afirma.
Fátima relata que os cursos, muitas vezes, não têm laboratório nem
professores com experiência profissional - há até docentes que ainda não
terminaram o curso de graduação em Enfermagem. "Nos últimos tempos, cursos têm
sido autorizados sem que o perfil da região seja considerado. Cursos técnicos, e
até de graduação, são abertos em municípios onde não há hospital, apenas
unidades básicas de saúde (UBS). Ou seja: não têm campo para estágio."
No caso de São Paulo, somente em 2011 os enfermeiros passaram a constituir a
equipe que autoriza a abertura de cursos técnicos. "Os cursos superiores têm um
esquema de avaliação por curso, por especialidades. Os cursos técnicos não são
avaliados por ninguém", diz a conselheira Neide Cruz, do Conselho Estadual da
Educação (CEE).
Ela conta que, diante dessa situação, os cursos de Enfermagem eram os que
geravam preocupação do CEE pelas denúncias que passaram a vir à tona envolvendo
estagiários e técnicos. Por esse motivo, com a Deliberação 105, de 2011,
instituições como o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac) e Serviço
Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) passaram a se responsabilizar por
esses pareceres em SP.
Inexato
Dados sobre quantos cursos técnicos existem não são fornecidos pelas
secretarias estaduais de Educação. Levantamento informal feito pelo Coren-RJ
aponta a existência de 254 cursos técnicos no Estado do Rio. O Cofen estima que
há 2.812 cursos técnicos no Brasil - 743 só no Estado de São Paulo.
O resultado do crescimento de cursos, que formam profissionais de qualidade
duvidosa, reflete no aumento de casos de erros atribuídos aos profissionais. Mas
o número exato de ocorrências é desconhecido. "Não temos a dimensão de quanto se
erra porque, muitas vezes, a falha não chega ao conhecimento de ninguém", diz
Fátima.
Fonte Estadão
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