Estudo aponta que médicos estão desistindo rápido demais da ressuscitação cardiopulmonar (RCP) Foto: T.C. Worley / NYTNS |
Quando um paciente hospitalizado sofre uma parada cardíaca, uma das questões
mais difíceis com as quais a equipe médica se confronta é por quanto tempo
continuar a ressuscitação cardiopulmonar (RCP). Agora, uma nova pesquisa
envolvendo centenas de hospitais sugere que muitos médicos podem estar
desistindo rápido demais.
A pesquisa descobriu que os pacientes têm uma chance melhor de sobreviver em
hospitais que insistem na RCP por pelo menos nove minutos a mais, em média, do
que em hospitais onde as tentativas são interrompidas mais cedo.
Não existem diretrizes claras, baseadas em evidências, que indiquem por
quanto tempo se deve continuar tentando a RCP.
Os resultados desafiam o pensamento médico convencional, para o qual
prolongar a RCP em pacientes hospitalizados geralmente é inútil, alegando que
quando os pacientes sobrevivem, geralmente sofrem danos neurológicos
permanentes. Contrastando com essa visão, os pesquisadores descobriram que os
pacientes que sobreviveram à RCP prolongada deixaram o hospital tão bem quanto
aqueles que foram ressuscitados rapidamente.
A pesquisa, publicada recentemente na revista The Lancet, na Internet, é uma
das maiores do gênero e uma das primeiras a relacionar a duração das tentativas
de RCP às taxas de sobrevivência. Ela deve fazer com que os hospitais analisem
suas práticas e considerem mudanças se estiverem insistindo pouco na
ressuscitação, disseram vários especialistas.
A cada mil pacientes hospitalizados, de um a cinco sofrem uma parada
cardíaca. Geralmente, eles são mais idosos e estão mais doentes do que os
pacientes que sofrem parada cardíaca fora do hospital, e geralmente seu desfecho
não é tão feliz: menos de 20 por cento sobrevivem até ter alta do hospital.
— Um dos desafios que enfrentamos quando um paciente hospitalizado tem uma
parada cardíaca é identificar por quanto tempo devemos continuar a RCP se o
paciente não estiver reagindo. Não existem regras nessa área — diz Zachary D.
Goldberger, principal autor da nova pesquisa, que foi financiada pela Associação
Americana de Hospitais, a Fundação Robert Wood Johnson e os Institutos Nacionais
de Saúde.
Goldberger e sua equipe reuniram dados do maior cadastro de pacientes que
sofreram parada cardíaca em hospitais do mundo, mantido pela Associação
Cardiológica Americana, identificando 64.339 pacientes que tiveram parada
cardíaca em 435 hospitais nos Estados Unidos entre 2000 e 2008.
Tentativas mais longas
Os pesquisadores examinaram os pacientes adultos em leitos hospitalares
comuns ou unidades de tratamento intensivos, excluindo pacientes que estavam em
prontos-socorros ou que sofreram parada durante os procedimentos. Eles
calcularam a duração média das tentativas de RCP dos não sobreviventes, e não
dos sobreviventes, a fim de medir a tendência que um hospital tem de insistir em
tentativas de RCP por mais tempo.
Uma das primeiras surpresas foi a variação significativa na duração da RCP
entre os hospitais, que vai de uma média de 16 minutos em hospitais que investem
menos tempo na tentativa de reanimar pacientes até uma média de 25 minutos nos
que investem mais — uma diferença de mais de 50%.
Inicialmente, os pesquisadores pensavam que iriam descobrir que alguns
pacientes estavam sendo submetidos a tentativas mais longas de RCP em vão, diz
Brahmajee Nallamothu, pesquisador sênior que trabalhou no estudo, professor
associado da Universidade de Michigan e cardiologista da Centro Médico de
Veteranos de Guerra de Ann Arbor.
Contudo, como se viu, os minutos extras representaram uma diferença evidente.
Os pacientes de hospitais que dedicaram mais tempo às tentativas de RCP tiveram
uma probabilidade 12% maior de sobreviver e voltar para casa do hospital do que
aqueles internados em hospitais que dedicaram menos tempo às tentativas de RCP.
Nallamothu e sua equipe descobriram que a função neurológica dos pacientes
não se alterou, independentemente da duração da RCP.
Resultados podem mudar prática
Os pacientes que mais se beneficiaram com o prolongamento da RCP foram
aqueles que não reagiram à desfibrilação ou que foram submetidos a choques. Os
minutos extras gastos na RCP prolongada podem possibilitar que os médicos tenham
tempo para analisar a situação e experimentar diferentes intervenções.
— Às vezes, usando a RCP, é possível fazer com que o sangue e o oxigênio
continuem circulando por mais de 30 minutos, e ainda conseguir que os pacientes
sobrevivam e, o que é mais importante, que tenham uma boa sobrevivência
neurológica — diz Jerry P. Nolan, consultor em anestesia e medicina intensiva do
Hospital Real Unido do Sistema Nacional de Saúde, em Bath, Inglaterra, que
escreveu um comentário que acompanha o artigo.
Stephen J. Green, diretor associado de cardiologia do Sistema Judaico de
Saúde de North Shore-Long Island, que não esteve envolvido na pesquisa, disse
que os hospitais podem ter de modificar suas práticas à luz da nova pesquisa.
— Ninguém quer ficar na parte de baixo desse gráfico. Os hospitais cujas
estatísticas são insatisfatórias devem reavaliar o que estão fazendo e pensar em
prolongar a duração de suas tentativas de RCP— diz Green.
Ainda assim, ele e outros especialistas temem que as novas descobertas possam
motivar o prolongamento de tentativas de reanimar pacientes para os quais o
procedimento não é apropriado, considerando que eles estão no final de vida, ou
ainda por outras razões.
— Não teremos um número mágico. Se o procedimento estiver sendo realizado com
duração de 10 a 15 minutos, é preciso intensificar a RCP, mas ao intensificarmos
cada vez mais, talvez cheguemos a um ponto em que a ressuscitação será muito
pouco provável.
Os autores da pesquisa reconhecem que o trabalho não indica que prolongar os
procedimentos de RCP é a melhor opção para todos os pacientes.
— A última coisa que queremos é que a moral da história seja de que todas as
pessoas devem ser submetidas a uma RCP mais longa. Nós não temos como
identificar uma duração ideal do procedimento para todos os pacientes
hospitalizados — diz Goldberger.
Fonte The New York Times
Por Zero Hora
Nenhum comentário:
Postar um comentário