I. Introdução
Alguns profissionais da área médica e farmacêutica, por desconhecimento ou mesmo por acharem desnecessário, são indiferentes sobre a importância da proteção das formulações que desenvolvem em sua principal atividade profissional (farmacêuticos) ou suplementar (médicos de diversas áreas, inclusive psiquiátricas, veterinários e dermatologistas em razão, também, da estética e cosmiatria). Ocorre que estas formulações podem ser absorvidas por terceiros, os quais obtém ganhos ou mesmo reclamam a titularidade por meio da concessão de patentes farmacêuticas ou cosméticas; desta forma, importante que os reais titulares busquem a tutela de seus direitos.
A Lei da Propriedade Industrial regula os direitos sobre as patentes, cabendo ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial – INPI a concessão dos direitos que são inerentes sobre a formulação. Isto ocorre, é claro, quando os critérios de patenteabilidade são preenchidos pelo interessado. Presentes esses o requerente obtém do INPI a declaração de titularidade exclusiva pelo lapso temporal de vinte anos.
Com a concessão, os profissionais enumerados tornam-se titulares sobre a formulação, de modo exclusivo; ou seja, apenas eles poderão utilizar-se da mesma, impedindo que outros profissionais se aproveitem de sua criatividade para também lucrar frente aos seus pacientes ou clientes. A utilização por terceiro pode ocorrer se o titular autorizar o uso (mantendo-se com a titularidade), ceder a titularidade de um modo definitivo ou mesmo comercializar a formulação.
A proteção que a lei oferece, além da vantagem aos profissionais/inventores proporciona o incentivo à atividade criativa dos médicos e farmacêuticos, bem como o desenvolvimento sustentável do setor médico e fármaco, e, também, a solução ou alternativa a problemas de saúde, inclusive com vantagens econômicas.
II. Critérios para a concessão de patentes
São critérios de patenteabilidade: a novidade, a criação humana e a utilidade industrial. A novidade é demonstrada com a inexistência do objeto na natureza, ou seja, em estado natural (diferencia-se da descoberta, que é a revelação de algo existente; enquanto que invenção é a criação de algo inexistente); a criação humana é a demonstração de que a interferência do homem promoveu modificações relevantes ou substanciais sobre o estado natural; e a aplicação industrial é a demonstração da expectativa de uso mercadológico.
Importante neste momento diferenciar todos estes critérios do que esteja em domínio público. Entenda-se sobre domínio público a colocação da invenção para conhecimento do público, ainda que seja um público indeterminado, bastando a sua disponibilidade. Por exemplo: artigo em periódico (revista, jornal, informativos, internet), listas ou fóruns da internet, monografias, dissertações e teses depositadas, resumos, receituário, palestras ou qualquer outra forma de disponibilidade. Estas situações impedem à concessão de patentes. Por isto, necessário buscar a concessão antes de sua mínima disponibilidade.
A reflexão de que é melhor divulgar para que se insira no conceito de domínio público, uma vez que desta forma todos terão acesso, não é de todo um raciocínio adequado, eis que alguém (ainda que também não possa buscar a titularidade) pode usar do conhecimento aplicado na invenção em domínio público para desenvolver outras formulações, sobre as quais será o único titular, bastando para isto que afaste vestígios sobre a origem de sua invenção.
Outra situação relevante é a compressão de que os direitos inerentes as patentes podem ser usados de modo abusivo e ou ilegal ou mesmo impedir e dificultar o acesso a medicamentos. Para dirimir esta situação a Lei da Propriedade Industrial estabelece exceções aos três critérios de patenteabilidade, tendo por objetivo eliminar a dificuldade de acesso aos medicamentos, em decorrência da concessão da titularidade exclusiva e ao critério temporal de vinte anos.
Assim, no Brasil, mesmo que presentes os critérios de patenteabilidade, em razão da necessidade do acesso, proíbe-se a patenteabilidade sobre:
I - descobertas, teorias científicas e métodos matemáticos;II - concepções puramente abstratas;III - esquemas, planos, princípios ou métodos comerciais, contábeis, financeiros, educativos, publicitários, de sorteio e de fiscalização;
IV - as obras literárias, arquitetônicas, artísticas e científicas ou qualquer criação estética;V - programas de computador em si;VI - apresentação de informações;VII - regras de jogo;VIII - técnicas e métodos operatórios ou cirúrgicos, bem como métodos terapêuticos ou de diagnóstico, para aplicação no corpo humano ou animal; eIX - o todo ou parte de seres vivos naturais e materiais biológicos encontrados na natureza, ou ainda que dela isolados, inclusive o genoma ou germoplasma de qualquer ser vivo natural e os processos biológicos naturais.
Necessário, como estratégia de atuação profissional, que os interessados em patentear distanciem-se dos conceitos acima enumerados.
III. Formulação magistral e derivativa
Como mencionado é proibido o patenteamento sobre o estado natural. Dentro deste conceito inseri-se o de formulação magistral. Em matéria de formulação utilizada por médicos e farmacêuticos necessário relacionar as fórmulas magistrais com descoberta e as fórmulas derivativas com invenção. Para melhor compreensão apresentam-se alguns conceitos:
Fórmula: conjunto de letras, algarismos e outros sinais, que representa a molécula de um corpo composto, ou seja, a composição. Classifica-se em básica e derivada. A básica constitui o ponto inicial para a obtenção das formas farmacêuticas derivadas. As derivadas são preparações oriundas da forma farmacêutica básica ou a própria droga. Representando desconcentrações obtidas através de diluições seguidas de sucussões e ou triturações sucessivas.
Formulação: Ação ou efeito de formular. Ato de determinar as quantias relativas dos diversos elementos que entram em uma mistura.
Invenção: Inovação. Para a área de fármacos a existência de uma nova aplicação para a composição. Nestes termos é proibido, por Lei, a patente de meras substâncias – as chamadas fórmulas magistrais. A Lei justifica esta exceção porque as fórmulas magistrais correspondem à base de uma linha de inovação e, então, devem permanecer à disposição de todos que tentem apenas reuni-las, sem os elementos da industrialização.
Medicamento/Cosmético: Substância que se aplica interna ou externamente para a manutenção ou para o restabelecimento da saúde e da estética. Analogicamente também denominado de fármaco ou remédio e cosmético.
Fórmula referencial: Equivale ao medicamento devidamente patenteável e sobre o qual existe o privilégio concedido pelo INPI. Justifica-se o termo referencial porque após a expiração do prazo de exclusividade do privilégio ele pode ser utilizado por terceiros para a fabricação do medicamento similar e ou do genérico.
Fórmula homeopática: Sistema de tratamento de doenças através de doses infinitesimais. Pode ou não ser patenteável, depende da fórmula ser industrial ou magistral. Em sendo industrial passível de patenteamento; sendo magistral impossível o patenteamento.
Fórmula industrial: Independente de ser homeopático, como atende aos requisitos da Lei de Propriedade Industrial – inovação, nova aplicação e aplicação mercadológica -, é passível de ser patenteável.
Fórmula magistral – Independentemente de ser homeopático, por determinação legal, não é passível de patenteamento. A presente proibição ocorre porque a fórmula magistral deve ficar à disposição daqueles que efetivamente inovem a partir dos elementos químicos básicos.
Anderson de Oliveira Ferreira, em Guia Prática da Farmácia Homeopática, leciona que a fórmula magistral "é a formulação personalizada para atender as necessidades específicas de um paciente. O prescritor pode adequar a formulação a cada paciente. Permite a prescrição de formas farmacêuticas diferenciadas das disponíveis comercialmente, bem como, o emprego de dosagem específica para um determinado paciente.”
A Farmacopéia Homeopática Brasileira, Parte I, dos Métodos Gerais, publicada pela Portaria 1.180/1997 (clique aqui), pelo Ministério da Saúde, determina que no item XI – Métodos de preparação das formas farmacêuticas derivadas – que o ponto de partida da fórmula magistral é a "forma farmacêutica básica".
Caso as formulações magistrais pudessem ser patenteados nenhum outro profissional – médico, fármaco – poderia manipular, ou seja, não teríamos mais a indústria da manipulação. E mesmo não teríamos mais o acesso a alternativas mais econômicas e mais rápidas de medicamentos e ou cosméticos. Ora, em sendo a base da fórmula magistral a fórmula básica, por isto mesmo depende da prescrição médica para ser manipulada e, por isto mesmo, o Ministério da Saúde, através da legislação própria proíbe o patenteamento, eis que eliminaria a prática médica e a prática dos farmacêuticos.
O Decreto-lei 95/2004 estabelece no artigo 1º, item a) o que seja medicamento manipulado, demonstrando a liberdade de função ao profissional, bem como a relação do receituário médico com a fórmula magistral ou com a homeopatia:
"qualquer fórmula magistral ou preparado oficinal preparado e dispensado sob a responsabilidade de um farmacêutico."
Nesta esteira, determina, recentemente o RDC 67/07 (clique aqui) que fórmula magistral é aquela preparada na farmácia, a partir de uma prescrição de profissional habilitado, destinada a um paciente individualizado, e que estabeleça em detalhes sua composição, forma farmacêutica, posologia e modo de usar. Assim, não pode ser objeto de patente porque depende de receituário médico, desta forma, apenas pode ser manipulado de modo pessoal ou individual. Ao contrário de se falar em patente, fala-se na capacidade do profissional habilitado, o farmacêutico, em manipular nos termos que o profissional médico estabelece no receituário, absolutamente voltado as necessidades do paciente.
Nesta esteira, determina, recentemente o RDC 67/07 (clique aqui) que fórmula magistral é aquela preparada na farmácia, a partir de uma prescrição de profissional habilitado, destinada a um paciente individualizado, e que estabeleça em detalhes sua composição, forma farmacêutica, posologia e modo de usar. Assim, não pode ser objeto de patente porque depende de receituário médico, desta forma, apenas pode ser manipulado de modo pessoal ou individual. Ao contrário de se falar em patente, fala-se na capacidade do profissional habilitado, o farmacêutico, em manipular nos termos que o profissional médico estabelece no receituário, absolutamente voltado as necessidades do paciente.
O mesmo ato legal determina que:
"5.17.2. A prescrição do medicamento a ser manipulado deverá ser realizada e receituário próprio a ser proposto em regulamentação específica, contemplando a composição, forma farmacêutica, posologia e modo de usar".
Para garantir que não existam abusos sobre a comercialização das fórmulas magistrais a RDC, no item 5.17.4, determina que:
"Em respeito à legislação e códigos de ética vigentes, os profissionais prescritores são impedidos de prescrever fórmulas magistrais contendo código, símbolo, nome da fórmula ou nome de fantasia, cobrar ou receber qualquer vantagem pecuniária ou em produtos que o obrigue a fazer indicação de estabelecimento farmacêutico, motivo pelo qual o receituário usado não pode conter qualquer identificação ou propaganda de estabelecimento farmacêutico."
O artigo 13 da Lei 5.991, de 17 de dezembro de 1973 (clique aqui), estabelece:
O artigo 13 da Lei 5.991, de 17 de dezembro de 1973 (clique aqui), estabelece:
"Dependerá da receita médica a dispensação de medicamentos homeopáticos, cuja concentração de substância ativa corresponda às doses máximas farmacologicamente estabelecidas."
Os profissionais da área médica, humana ou animal, receitam aos pacientes, considerando elementos pessoais, a tipificação necessária para o medicamento a ser manipulado (fórmula magistral).
Feitos estes esclarecimentos conceituais, tem-se, uma vez mais, a importância do entendimento dos profissionais médicos e farmacêuticos em conhecer e buscar, quando possível, a tutela do INPI para a concessão de patentes. Primeiro para valorização do trabalho desenvolvido; segundo para fins econômicos, eis que pode ser comercializado; e terceiro porque salvaguarda o acesso da população do país em caso de comercialização pelo próprio titular.
*Assessora jurídica da agência USP de inovação
Fonte migalhas.com.br
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