Definitivamente vivemos a era da informação. Trata-se de uma realidade que se manifesta em todos os campos da atividade humana e, cada vez mais, nos surpreendemos com a capacidade da internet e das redes sociais de potencializar a influência dos cidadãos em estados democráticos ou, em casos emblemáticos, mobilizar politicamente povos que vivem sob ditaduras longevas.
Claro que nem tudo o que cai na rede é informação confiável. Há muita tolice e opinião desprovida de credibilidade navegando neste mar digital. Cabe ao usuário distinguir o que há de veracidade da mera especulação descartável. De qualquer forma, é indiscutível que, hoje, as informações circulam com uma velocidade inimaginável, em comparação com dez anos atrás.
Também na medicina o fenômeno começa a produzir impactos. Positivos, na maioria das vezes. Antes da popularização da internet, o paciente ia ao consultório e, após os necessários exames, tinha um diagnóstico e o procedimento indicado para sanar seu problema. Em alguns casos, buscava uma segunda opinião de outro profissional.
Atualmente, não é raro recebermos pacientes que, pesquisando na internet, já chegam com uma terceira opinião, que eu chamaria de opinião digital. Trata-se, na verdade, de um novo desafio para o médico que tem de se atualizar com uma rapidez impensável há alguns anos.
Na Europa e nos Estados Unidos, onde o uso da internet está largamente disseminado, e as inovações tecnológicas e a pesquisa médica avançam rapidamente, não é difícil o médico receber em consultório pacientes mais informados do que ele próprio. Evidentemente, essa terceira opinião é confrontada com critérios rigorosos que, independentemente da rede digital, não só ainda são válidos como indispensáveis para separar o que já possui validação consensual nas sociedades médicas de evidências científicas comprovadas.
Este filtro é mais do que necessário. Por exemplo, recentemente uma prestigiosa publicação médica americana revelou um estudo, que logo foi parar na rede, no qual pesquisadores concluíram que a restrição do sal na alimentação – até então, um consenso na comunidade médica, sobretudo para indivíduos considerados de risco – aumentava as chances de infarto e derrames cerebrais.
Assim, de uma hora para outra o sal deixou seu papel de vilão para se transformar em substância de prevenção a moléstia graves. O que fazer com evidências científicas, acumuladas em décadas, comprovando que há um alto percentual de indivíduos, cuja capacidade de eliminação do sal pelos rins é precária, o que lhes ocasiona a importante doença conhecida como pressão alta?
A resposta engloba dois ângulos simultâneos: o aprofundamento da pesquisa e o princípio de que cada indivíduo é único, cabendo ao seu médico conhecer suas características peculiares. Isto significa que o médico, além de ter o desafio de se atualizar a cada dia, deve se aprofundar no conhecimento de seu paciente para indicar-lhe o melhor tratamento.
Significa também maior democratização da medicina. O diálogo entre o médico e o paciente que já formulou uma opinião digital pesquisando na internet ficará mais facilitado e fluído. Como resultado, todos ganham.
Apesar da possibilidade de se vislumbrarem avanços e conquistas, é preciso reconhecer que estamos longe disso no Brasil. Aqui, a maioria da população não tem acesso às informações sejam as que circulam nas redes sociais ou as mais elementares. Esta parcela é a que também dispõe das maiores limitações financeiras. Com isso, este segmento populacional fica restrito aos tratamentos oferecidos pelos órgãos de saúde pública.
Na cardiologia, por exemplo, a diferença entre os procedimentos para uma angioplastia, que é uma cirurgia para desobstruir artérias, é significativa. Na rede pública de saúde, os pacientes recebem stents (tubo que permite desobstruir a artéria) simples. Já para o paciente cuja condição permite-lhe arcar com um plano de saúde, o procedimento inclui stents mais avançados sob o ponto de vista tecnológico e que, portanto, asseguram maior eficácia.
Como se vê, a democratização da saúde no Brasil ainda esbarra em obstáculos consideráveis. No entanto, a disseminação das informações médicas via o sistema eletrônico constitui processo irreversível e mais um passo para que cada vez mais os cidadãos possam reivindicar o melhor tratamento às suas moléstias.
*Américo Tângari Junior é médico, especialista em cardiologia pela Sociedade Brasileira de Cardiologia e Associação Médica Brasileira. Integra a equipe de cardiologia cirúrgica do Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Fonte SaudeWeb
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