Nem só hormônios e dúvidas compõem o cardápio da adolescência. Pessoas nessa fase da vida podem passar por mudanças profundas na estrutura cerebral, a ponto de alterar a sua classificação na tabela que mede o QI (sigla para quociente de inteligência).
Segundo um estudo divulgado hoje na revista Nature, 21% dos garotos e garotas tiveram o desempenho melhorado ou piorado durante o período, e esse fenômeno teve relação direta com alterações físicas no cérebro. Os cientistas ainda não sabem se as transformações permanecem na vida adulta, mas apontam que elas podem indicar perda ou ganho de habilidades — e não simplesmente um erro de medição de QI.
O quociente de inteligência é uma referência criada há muitos anos e altamente difundida durante o século passado. “Ele procurou estabelecer medidas de normalidade ao que se convencionou chamar de inteligência: a capacidade que cada um tem de lidar com informações, envolvendo uma série de funções cognitivas”, explica a neurologista Sônia Brucki, da Sociedade Brasileira de Neurologia. O teste define o QI global do indivíduo, calculado a partir da soma do desempenho verbal (que envolve tarefas relacionadas à linguagem) e de performance (relacionado a atividades construtivas e de desenho, por exemplo).
Para verificar se havia variação do QI durante a adolescência, a equipe de pesquisadores britânicos recrutou 33 jovens neurologicamente normais, com idades entre 12 e 16 anos. O grupo respondeu a uma avaliação correspondente para a faixa etária e passou por uma máquina de ressonância magnética — que mapeia a atividade do cérebro. Cerca de quatro anos mais tarde, quando tinham entre 15 e 20 anos, os mesmos adolescentes foram convocados pelos cientistas para repetir os testes. Durante o intervalo, os garotos e garotas não foram informados que passariam, novamente, pelo procedimento. Ao cruzar os resultados das duas etapas, os cientistas perceberam que sete voluntários sofreram alterações consideráveis em suas mentes — medidas não só pelo QI, mas também por diferenças na espessura da massa cinzenta.
“Se tivéssemos apenas as mudanças observadas na pontuação do QI, isso poderia ser explicado por uma variação aleatória no desempenho, talvez devido à falta de concentração da pessoa no dia da avaliação”, diz a pesquisadora Cathy Price, da University College London, uma das autoras da pesquisa. “Mas o fato de essas alterações estarem relacionadas a áreas do cérebro ligadas às habilidades indica que a mudança do desempenho foi genuína”, esclarece, em entrevista ao Correio. A variação na espessura ocorreu em regiões relacionadas às capacidades que são medidas durante o teste de QI. Uma delas é o lado esquerdo do córtex motor, responsável pela fala, e a outra é o cerebelo, onde estão os neurônios que ativam performances não verbais do indivíduo.
Embora a amostra de participantes que tiveram grandes alterações seja pequena — apenas 21% dos 33 voluntários —, as mudanças merecem atenção. Nesses casos, explica a professora Cathy, a diferença do resultado entre um teste de QI e outro chegou a 23 pontos, quantidade bastante para fazer com que o indivíduo migrasse de categoria na tabela do quociente. “Um quinto dos nossos voluntários passaram por transformações substanciais”, reforça a pesquisadora. As variações ocorreram para cima e para baixo: alguns participantes que tinham o QI normal passaram a ser considerados acima da média. Em outras situações, o fenômeno foi inverso. “O mais importante é que eles conseguiram demonstrar a relação entre a espessura cortical e o desempenho em testes de QI”, afirma a neurologista Sônia Brucki.
Efeitos
Cathy e sua equipe não determinaram se tais mudanças foram mantidas durante a fase adulta. Em outros estudos, no entanto, ficou demonstrado que a prática de habilidades verbais e não verbais tem uma influência sobre a estrutura do cérebro “maduro”. Assim, para a cientista britânica, é provável que homens e mulheres também sofram alterações consideráveis em suas mentes. Outro ponto que ainda não está claro diz respeito às causas da variação do QI entre os jovens. “No Reino Unido, onde os adolescentes podem optar por estudos na área de ciência, arte ou matemática, por exemplo, esse fenômeno pode ser consequência da ‘educação limitada’”, aponta Cathy.
Até então, explica a pesquisadora, alterações desse tipo eram vistas pelos cientistas como um erro de medição do QI. “O que é único na nossa abordagem é que fomos capazes de testar se as flutuações eram causadas por problemas na medição ou se diziam respeito a mudanças na habilidade”, ressalta.
“Também conseguimos demonstrar que as modificações na estrutura cerebral ocorreram em áreas ligadas a atividades verbais e não verbais, avaliadas no teste de QI”, completa. Agora, Cathy e outros cientistas ao redor do mundo precisam estender o experimento para grupos maiores e outras populações que não apenas jovens do Reino Unido. “Nosso grupo está se concentrando na compreensão de como a estrutura cerebral de vítimas de derrame se transforma à medida que elas se recuperam”, conta.
Padrão questionado
Apesar de o teste de QI ser amplamente usado em todo o mundo, surgiram, recentemente, algumas dúvidas sobre a sua eficácia. Isso porque muitas instituições passaram a levar em conta a chamada inteligência emocional, que não pode ser medida em uma avaliação como a do QI. “Além disso, para ter validade, é preciso adaptar o QI às populações. Um analfabeto, por exemplo, não pode fazer um exame igual ao aplicado em uma pessoa que sabe ler”, observa a neurologista Sônia Brucki.
O quociente de inteligência é uma referência criada há muitos anos e altamente difundida durante o século passado. “Ele procurou estabelecer medidas de normalidade ao que se convencionou chamar de inteligência: a capacidade que cada um tem de lidar com informações, envolvendo uma série de funções cognitivas”, explica a neurologista Sônia Brucki, da Sociedade Brasileira de Neurologia. O teste define o QI global do indivíduo, calculado a partir da soma do desempenho verbal (que envolve tarefas relacionadas à linguagem) e de performance (relacionado a atividades construtivas e de desenho, por exemplo).
Para verificar se havia variação do QI durante a adolescência, a equipe de pesquisadores britânicos recrutou 33 jovens neurologicamente normais, com idades entre 12 e 16 anos. O grupo respondeu a uma avaliação correspondente para a faixa etária e passou por uma máquina de ressonância magnética — que mapeia a atividade do cérebro. Cerca de quatro anos mais tarde, quando tinham entre 15 e 20 anos, os mesmos adolescentes foram convocados pelos cientistas para repetir os testes. Durante o intervalo, os garotos e garotas não foram informados que passariam, novamente, pelo procedimento. Ao cruzar os resultados das duas etapas, os cientistas perceberam que sete voluntários sofreram alterações consideráveis em suas mentes — medidas não só pelo QI, mas também por diferenças na espessura da massa cinzenta.
“Se tivéssemos apenas as mudanças observadas na pontuação do QI, isso poderia ser explicado por uma variação aleatória no desempenho, talvez devido à falta de concentração da pessoa no dia da avaliação”, diz a pesquisadora Cathy Price, da University College London, uma das autoras da pesquisa. “Mas o fato de essas alterações estarem relacionadas a áreas do cérebro ligadas às habilidades indica que a mudança do desempenho foi genuína”, esclarece, em entrevista ao Correio. A variação na espessura ocorreu em regiões relacionadas às capacidades que são medidas durante o teste de QI. Uma delas é o lado esquerdo do córtex motor, responsável pela fala, e a outra é o cerebelo, onde estão os neurônios que ativam performances não verbais do indivíduo.
Embora a amostra de participantes que tiveram grandes alterações seja pequena — apenas 21% dos 33 voluntários —, as mudanças merecem atenção. Nesses casos, explica a professora Cathy, a diferença do resultado entre um teste de QI e outro chegou a 23 pontos, quantidade bastante para fazer com que o indivíduo migrasse de categoria na tabela do quociente. “Um quinto dos nossos voluntários passaram por transformações substanciais”, reforça a pesquisadora. As variações ocorreram para cima e para baixo: alguns participantes que tinham o QI normal passaram a ser considerados acima da média. Em outras situações, o fenômeno foi inverso. “O mais importante é que eles conseguiram demonstrar a relação entre a espessura cortical e o desempenho em testes de QI”, afirma a neurologista Sônia Brucki.
Efeitos
Cathy e sua equipe não determinaram se tais mudanças foram mantidas durante a fase adulta. Em outros estudos, no entanto, ficou demonstrado que a prática de habilidades verbais e não verbais tem uma influência sobre a estrutura do cérebro “maduro”. Assim, para a cientista britânica, é provável que homens e mulheres também sofram alterações consideráveis em suas mentes. Outro ponto que ainda não está claro diz respeito às causas da variação do QI entre os jovens. “No Reino Unido, onde os adolescentes podem optar por estudos na área de ciência, arte ou matemática, por exemplo, esse fenômeno pode ser consequência da ‘educação limitada’”, aponta Cathy.
Até então, explica a pesquisadora, alterações desse tipo eram vistas pelos cientistas como um erro de medição do QI. “O que é único na nossa abordagem é que fomos capazes de testar se as flutuações eram causadas por problemas na medição ou se diziam respeito a mudanças na habilidade”, ressalta.
“Também conseguimos demonstrar que as modificações na estrutura cerebral ocorreram em áreas ligadas a atividades verbais e não verbais, avaliadas no teste de QI”, completa. Agora, Cathy e outros cientistas ao redor do mundo precisam estender o experimento para grupos maiores e outras populações que não apenas jovens do Reino Unido. “Nosso grupo está se concentrando na compreensão de como a estrutura cerebral de vítimas de derrame se transforma à medida que elas se recuperam”, conta.
Padrão questionado
Apesar de o teste de QI ser amplamente usado em todo o mundo, surgiram, recentemente, algumas dúvidas sobre a sua eficácia. Isso porque muitas instituições passaram a levar em conta a chamada inteligência emocional, que não pode ser medida em uma avaliação como a do QI. “Além disso, para ter validade, é preciso adaptar o QI às populações. Um analfabeto, por exemplo, não pode fazer um exame igual ao aplicado em uma pessoa que sabe ler”, observa a neurologista Sônia Brucki.
Fonte Gazeta Braziliense
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