Quase a metade das ações judiciais com pedidos de medicamentos ou atendimento médico é feita por gaúchos
Os tribunais são cada vez mais o lugar escolhido pelos brasileiros para conseguir o nem sempre fácil acesso à assistência em saúde. Mais de 240 mil processos judiciais envolvendo pedidos de atendimento, cirurgias, medicamentos ou próteses tramitam nas justiças estaduais e Federal em todo o Brasil.
O que chama a atenção é que quase a metade dessas ações — 113 mil, o equivalente a 43% — se concentra em um único Estado, o Rio Grande do Sul. É como se todos os habitantes de uma cidade do tamanho de Bento Gonçalves tivessem apelado à Justiça para tentar conquistar benefícios em saúde.
Os dados são do Conselho Nacional de Justiça. O universo de 240 mil ações até não é expressivo, se pinçado dentre os 80 milhões de processos que tramitam hoje no Judiciário. A questão é que a maioria dessas ações envolve urgência, seja para delicados tratamentos, para compra de medicamentos custosos ou para cirurgias que, de outra forma, demorariam anos. Os dados, que são de 2011 (ainda não foi feito balanço em 2012), não incluem informações de três Estados: Paraíba, Pernambuco e Amazonas. Em segundo lugar está São Paulo, com 44.690 processos do gênero.
Não se tem uma ideia de quanto é gasto para atender a essas demandas, em todo o país. A União já informou sua parte: em 2010 foram gastos R$ 144 milhões do orçamento federal para o cumprimento das decisões. Isso representa 64 vezes mais do que o gasto em 2005: R$ 2,24 milhões. A estimativa é de que em 2011 tenha ocorrido um gasto ainda maior, de R$ 260 milhões.
O juiz Martin Schulze, representante do Estado no Fórum Nacional de Saúde do CNJ (que congrega juízes que atuam com muitas ações desse tipo) diz que só em Porto Alegre tramitam mais de 5 mil pedidos judiciais referentes a atendimentos na área de saúde. Metade dessas demandas é composta por reivindicações que o Estado teria obrigação de atender. É o caso de remédios especiais ou controlados, que deveriam ser fornecidos, mas estão faltando nas farmácias estatais.
O restante desses pedidos que o Estado deveria cumprir e não cumpre se referem à espera por internações hospitalares, próteses ou cirurgias, calcula o magistrado.
A outra metade das demandas é composta de pedidos que o Estado não é obrigado a atender, estima Schulze. São medicamentos raros e caros, de última geração, ou então próteses importadas, das quais existem similares nacionais.
Estado já gastou R$ 118 milhões
O governo estadual gastou R$ 118,5 milhões este ano, até agora, em atendimento a ordens judiciais na área de saúde - metade disso com medicamentos especiais (da tabela do SUS) ou excepcionais (via de regra, importados). O valor gasto com demanda judicial representa 7,73% do orçamento da Secretaria Estadual da Saúde (SES), que é de R$ 1,5 bilhão.
Quando não existe no Estado o medicamento solicitado pelo paciente, o governo estadual tem duas opções. Uma delas é abrir licitação internacional, pois, em alguns casos, o medicamento é raro. A entrega da medicação ao doente é feita por meio das centrais de dispensação do próprio Estado.
Quando o medicamento não tem registro na Anvisa, mas mesmo assim a Justiça ordena que seja adquirido, a importação é vetada e resta à SES depositar o dinheiro equivalente ao tratamento — deixando para o paciente a missão de adquirir o remédio.
Menino espera por consulta desde janeiro
No interior de Serafina Corrêa, a 210 quilômetros de Porto Alegre, um casal de agricultores trava uma batalha há oito meses com a Justiça. Jucélia Bidese, 40 anos, e o marido, Valnei De Marco, 39 anos, lutam para que o filho Igor, de um ano e oito meses, seja atendido por um médico geneticista na Capital.
Cansados de esperar pela consulta pelas vias comuns, por meio da Secretaria de Saúde do município, o casal entrou com um ação judicial em julho contra o Estado. Só depois de vencido o prazo, no último dia 15, a Secretaria Estadual da Saúde agendou para o dia 10 de setembro a consulta no Hospital de Clínicas.
— Eu até chorei de felicidade. Nenhuma mãe merece esperar tanto tempo para levar o filho doente a uma consulta — desabafou Jucélia.
Segundo a secretaria, a demora no agendamento ocorreu devido às poucas vagas oferecidas para a genética médica pediátrica. São sete consultas nos dois hospitais cadastrados para atendimento do Interior — Santa Casa e Presidente Vargas. Para agilizar o atendimento de Igor, ele foi remanejado para a genética médica geral do Hospital de Clínicas, onde há 23 consultas mensais. De acordo com a secretaria, há 361 pessoas do Interior na fila para esta especialidade.
À espera desde de janeiro, Igor é assistido por um pediatra e uma fisioterapeuta em Serafina Corrêa desde outubro do ano passado, quando a mãe começou a notar que o menino, então com nove meses, não tinha firmeza e nem segurava objetos.
A pedido de um neurologista, Igor fez exames que apontaram um distúrbio denominado erro inato de metabolismo, o que envolve patologias raras e precisa de um diagnóstico especializado.
Fonte Zero Hora
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