Pode sim, e a resposta está na liberação de hormônios presentes também no uso de drogas e no sexo
O trio de substâncias adrenalina, serotonina e dopamina é o principal responsável por acelerar o coração na hora da vitória olímpica. Também são eles que trazem a efêmera sensação de potência logo após o uso de drogas e o prazer intenso obtido com o orgasmo.
Em doses exageradas e frequentes, a euforia e o bem-estar resultantes desta descarga química – ela faz parte do chamado de mecanismo cerebral de recompensa – podem literalmente viciar.
Não importa se o objeto da fissura é o sexo, alguma droga ou mesmo um pódio olímpico. A vontade de voltar a experimentar a mesma sensação pode fazer com que muitos atletas desafiem os limites do corpo e até mesmo as regras e a lei em busca de uma medalha de ouro.
“A resposta prazerosa do cérebro, acionado ao fazer sexo, usar drogas ou praticar esportes, é a mesma”, explica a psiquiatra Fátima Vasconcellos, coordenadora do Departamento de Psicoterapia da Associação Brasileira de Psiquiatria.
Do ponto de vista cerebral, não exagerou, portanto, o treinador Fabrice Pellerin ao comparar o ouro da sua pupila, a nadadora Camile Muffat, nos 400 m livre, a um “orgasmo tântrico” . A metáfora do orgasmo parece, mas não é exagerada. Atletas de ponta relatam ter experimentado sensações de euforia e prazer intensos no momento em que se perceberam campeões.
Apesar de a explicação neuroquímica ser a mesma, obviamente, os prejuízos sociais acarretados pelo uso crônico de drogas são muito devastadores, algo distinto do desencadeados pela prática exagerada – ou mesmo aditiva – de esportes.
“Tanto que uma das estratégias terapêuticas usadas no tratamento de dependentes químicos é indicar atividades físicas. Esporte é muito bom”, completa Fátima.
Segundo a coordenadora da ABP, o que as informações sobre os efeitos no cérebro provocados pelos exercícios reforçam é que esporte não é só corpo.
“Existem aspectos psicológicos muito importantes neste processo que precisam ser levados em conta.”
Meta cumprida
Para o presidente da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte, Josmar Souza, a preparação completa de um atleta passa impreterivelmente pela cabeça.
“O atleta profissional, diferentemente do amador, tem a dedicação e a atenção muito centradas no desempenho e no resultado. Por este motivo, ele quase nunca desfruta dos hormônios do bem-estar na hora da prática esportiva rotineira, já que a situação de estresse se sobrepõe”, diz Souza.
“Esta felicidade extrema fica mesmo mais restrita ou à vitória ou à superação de uma meta pessoal”, complementa o presidente.
Dono de quatro medalhas olímpicas, o nadador Gustavo Borges, não esquece o que sentiu ao vencer. Para ele, a experiência se dividiu em dua etapas distintas:
“No fim da prova a sensação é de prazer intenso, de força, é algo muito intenso. No pódio, é diferente, você começa a sentir outras coisas. Você se alegra, se emociona, pensa no trabalho árduo que se materializou, você conclui que tudo valeu a pena”, contou Borges ao iG .
Quando a meta estipulada não é alcançada, no entanto, podem surgir quadros depressivos e prolongamento da sensação de fracasso. Segundo a neurologista da Academia Brasileira de Neurologia (ABN), Sonia Brucki, essas situações são nocivas ao corpo e estão associadas até mesmo à ocorrência de infarto e a acidente vascular cerebral (AVC) .
São sensações resultantes de um mecanismo cerebral inverso ao do prazer, também presente em situações em que o atleta se lesiona ou é cortado da equipe. O ginasta Diego Hypólito, expressou muito bem esse sentimento ao ser desclassificado na Ginástica Olímpica: “Não sei o que aconteceu comigo. Tantas pessoas me deram apoio e me incentivaram. Cheguei aqui e caí, caí de cara. Estou decepcionado e bravo comigo.”
Para Simone Sanches, psicóloga do Clube de Atletismo BM&FBovespa e presidente da Associação Brasileira de Psicologia do Esporte (ABRAPESP), a “sede de vitória” deve ser trabalhada como um fator motivacional, que o atleta deverá ter a seu favor.
“É preciso cuidado para que isso não se converta em algo que irá se transformar em alta cobrança, associada à necessidade de sempre ter de se manter no alto do pódio” explica.
Fonte iG
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