Babi Monteiro faz aula de dança do ventre, ama seu corpo e não tem indicação médica para emagrecer |
Durante anos, a fórmula que divide o peso pela altura ao quadrado, chamada de Índice de Massa Corporal (IMC), reinou absoluta na matemática da dieta.
Quando o resultado da conta superava o algarismo 25, o sinal claro era de que a saúde exigia o emagrecimento.
Recentemente, as gordinhas saudáveis entraram para equação. Trazidas pela onda plus size, elas provocaram reviravolta na medicina. A última sacudida no reinado do IMC foi provocada por ampla pesquisa, publicada este mês no Journal of the American Medical Association (Jama), uma das publicações científicas mais respeitadas no meio médico.
Os pesquisadores revisaram 97 estudos (envolvendo 2,9 milhões de pessoas) e constataram que os inseridos na categoria sobrepeso – com IMC entre 25 e 30 – apresentavam risco de morte 6% menor do que os catalogados como magros no IMC (entre 18,5 e 24).
A controvérsia sobre a fórmula do peso saudável é exemplificada por pessoas como Babi Monteiro, 38 anos. Os 83 quilos que ela mantém em1,65 metro de altura indicam que, sim, ela não é aprovada pela métrica do IMC (o dela é 30). Mas os check-ups anuais evidenciam que no corpo curvilíneo de Bebi não há colesterol alto, pressão desequilibrada, diabetes ou qualquer outra ameaça ao bom funcionamento do organismo.
Paradoxo
Pelos especialistas do mundo todo, esta condição de quilos a mais sem problemas que impõem risco à saúde vem sendo chamada de “paradoxo da obesidade”.
“Quando o médico hipervaloriza o sobrepeso, sem avaliar outras condições do paciente, como diabetes e colesterol (nominadas de comorbidades), ele pode indicar o emagrecimento de forma precipitada, sem justificativa de saúde”, avalia o endocrinologista Almino Ramos, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica Metabólica.
Há pelo menos 5 anos, Ramos e um colegiado de médicos do País divulgam as falhas nos indicativos de saúde creditados ao IMC. Estas controvérsias sobre o alcance da fórmula, inclusive, têm sido usadas nas discussões travadas entre a Sociedade, o Conselho Federal de Medicina (CFM) e o Ministério da Saúde.
Na pauta, a defesa dos cirurgiões bariátricos é de que a matemática peso/altura deixe de figurar como o único critério para legitimar cirurgia de redução de estômago.
“Embasados em pesquisas, nós defendemos que o diabetes, por exemplo, tenha peso semelhante ao IMC em favor da indicação cirúrgica”, avalia o presidente.
Já a diretora da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade (Abeso), Cintia Cercato, pondera que os novos dados não são suficientes “para jogar o IMC na lata do lixo”.
“Já sabemos que o índice não é o melhor método para medir risco à saúde. É uma ferramenta válida, mas não completa. O mais importante é ver a distribuição da gordura. Se estiver concentrada na região da cintura, há risco maior de problemas cardiovasculares, risco este que independe do IMC do paciente”, completa Cintia.
Epidemia de desculpas
Antes de comemorar as novas descobertas com banquetes açúcarados e gordurosos, os especialistas ressaltam que a obesidade não perdeu o status de um dos problemas de saúde mais graves da atualidade.
No Brasil, o progresso excessivo de obesos, enquadrados no índice de massa corporal superior a 30, deixou o governo federal alarmado. Em 2018, 11% da população estava nesta categoria, parcela ampliada para 16% em 2011.
O próprio estudo dos EUA – que absolveu o sobrepeso como marcador de risco de morte – apontou que quando o IMC chega na casa dos30 amortalidade é quase duas vezes maior comparada às taxas inferiores.
A Organização Mundial de Saúde endossa que há associação evidente entre obesidade e doenças crônicas, como câncer e problemas cardíacos. Crianças com esta circunferência abdominal tendem a ter corações típicos de idosos, evidenciou o documentário brasileiro “ Muito Além do Peso”, que catalogou relatos de meninos e meninas de todas as regiões do País.
O que está em discussão é o fato do nome “gordinho” ter virado sinônimo de “negligente com o autocuidado”.
“A gorda é vista como relaxada e preguiçosa. E isso não corresponde à realidade. Não dá para generalizar”, propaga Renata Poskus Vaz, organizadora do Fashion Week Plus Size, evento que reúne e exibe modelos que, assim como ela, usam tamanho GG, mas não são sedentárias e esbanjam saúde.
Saúde plus size
Neste contexto, há um movimento de mulheres e médicos que pedem o fim da ditadura do peso ideal, mantido no posto pela máxima de que ele, só ele, é capaz de proteger a saúde.
A musa do embate, a cantora Gaby Amarantos, já declarou ser muito mais saudável agora, vestindo calça 42, do que na época em que provocava vômito após comer (transtorno chamado de bulimia) para entrar no jeans 38.
Em nome do corpo magro, já detectou o Centro de Referência de Tratamento de Álcool, Tabaco e Outras Drogas (Cratod), as mulheres – especialmente – não abandonam o cigarro com receio de engordar.
Os casos de anorexia, distúrbio caracterizado pelo jejum quase absoluto, também estão em ascensão e uma pesquisa inglesa concluiu que, mesmo após os 70 anos, sete em cada dez idosas fazem dietas, muitas delas incluindo rotinas bulímicas e uso de purgantes.
Modelos
Para Babi Monteiro, da mesma forma que uma modelo anoréxica não pode servir de exemplo para ninguém, uma obesa mórbida, ameaçada pela gordura excessiva, não é um estilo de vida a ser incentivado.
“Não faço apologia da gordura, mas questiono o que é beleza e o que fazer em nome dela. Eu faço aula de dança do ventre diariamente, tenho disposição a mil, alimentação saudável, rica em ômega 3, mas também com espaço para o chocolate e os bolos”, diz Babi.
“Estou com a saúde em dia e vou me matar para emagrecer por qual motivo?”, questiona ela que é modelo plus size, formada em direito e consultora de moda. Babi é a prova de que por trás do manequim 44 também bate um coração... “um coração bem saudável, obrigada”, completa ela.
Fonte iG
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